A Justiça condenou o Estado do Tocantins a indenizar, em R$ 100 mil, a mãe de uma recém-nascida que morreu devido a falta de cirurgia de urgência no coração. A decisão é da juíza Ana Paula Araújo Aires Toribio, da 1ª Escrivania Cível de Palmeirópolis.
Ao julgar o caso, a magistrada considerou que, “ainda que não haja evidência incontroversa de que determinada omissão seja a causa direta e exclusiva do resultado lesivo, é possível dizer que ela contribuiu substancialmente para a redução da possibilidade de se evitar o dano, o que é suficiente para acionar os mecanismos jurídicos indenizatórios, especialmente na seara do dano moral”.
Para a juíza, a conduta “omissiva” do Estado caracteriza “grave desrespeito” à dignidade da pessoa humana, enquanto princípio fundamental assegurado pela Constituição Federal (artigo 1º, inciso III). Ela conclui ressaltando que a autora faz jus à indenização por dano moral.
A mãe do bebê será indenizada em R$ 100 mil, sendo que o valor da condenação deverá ser acrescido de correção monetária, a partir da publicação da sentença, e juros moratórios a partir do dia do falecimento da recém-nascida.
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Entenda
Em julho de 2017, a recém-nascida nasceu no Hospital de referência de Gurupi com Síndrome do Coração Esquerdo Hipoplásico (quando as estruturas do lado esquerdo do coração são pequenas e pouco desenvolvidas para fornecer o fluxo de sangue suficiente para as necessidades do corpo) e precisava urgentemente passar por um procedimento cirúrgico que não é realizado no Estado, além de cuidados específicos em uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI).
Na época, a família conseguiu na Justiça a determinação para o Estado realizar a cirurgia cardíaca e transferir o bebê para a UTI Neonatal do Hospital Dona Regina, em Palmas, já que em Gurupi não havia vagas. Apesar da ordem judicial, o Estado só cumpriu parte da decisão e não providenciou o procedimento cirúrgico. Com isso, a criança morreu no dia 6 de agosto.
Outros casos
Somente neste ano, quatro bebês com cardiopatia, assistidos da Defensoria Pública do Estado do Tocantins (DPE/TO), morreram à espera da cirurgia. Conforme informações da Central de Atendimento em Saúde (CAS) do órgão, nos quatro casos também havia decisão judicial para que o Estado providenciasse o atendimento promovendo a transferência dos pacientes para outra unidade da Federação e assumindo os custos com os procedimentos cirúrgicos.
Em audiência no Juizado Especial da Infância e Juventude de Palmas, no dia 8 de maio, o Estado propôs que a Secretaria Estadual da Saúde (Sesau) fosse autorizada a pagar antecipadamente os procedimentos cardíacos de urgência para evitar outras mortes de bebês. Segundo o Executivo, o pagamento à vista é imposto por alguns hospitais privados para fazerem as cirurgias.
Dez dias após a audiência, no dia 18 de maio, a Justiça atendeu pedido da DPE-TO e do MPE e determinou que o governo do Estado, em um prazo de 12 meses, organize o serviço de assistência às crianças com quadro de cardiopatia congênita, e passe a prestá-lo diretamente, devendo adquirir os materiais necessários e treinar equipes para a realização das cirurgias cardíacas pediátricas. O Poder Judiciário também estabeleceu um prazo de 90 dias para que o Executivo estadual apresente um projeto de reorganização do serviço.
No final do mês passado a Defensoria teve que recorrer novamente à Justiça para que uma recém-nascida fosse transferida de Palmas para Goiânia e realizasse a cirurgia do coração. O Tratamento Fora de Domicílio (TFD) foi possível depois de determinação para que o Estado providenciasse, com urgência, uma vaga em Unidade de Terapia Intensiva (UTI) neonatal.
A decisão foi proferida no dia 29 e considerava o prazo de 24 horas para atendimento. No dia 2 de junho, considerando que o Estado ainda não havia cumprido a decisão pela transferência da bebê, bem como a realização da cirurgia em outra unidade da federação, a Justiça determinou o bloqueio de valores nas contas do Estado para garantir o recurso necessário ao cumprimento da liminar. Com isso, no dia 4, a recém-nascida foi transferida.