A concessão das atividades lotéricas pelo governo estadual está sendo questionada pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB), que apresentou uma denúncia à Procuradoria-Geral da República (PGR); e também pela Educação e Cidadania de Afrodescendentes e Carentes (Educafro), organização sem fins lucrativos responsável por ação civil pública (ACP) junto à Justiça Federal. Ambas as iniciativas são desta segunda-feira, 2, e assinadas pelos advogados Márlon Reis, Rafael Martins Estorilio e Paulo Santos Mello.
ENTENDA
A autorização das operações da Loteria do Tocantins (Lototins) ocorreu em fevereiro. O projeto trabalha com projeção, instalação, operação e manutenção de unidades lotéricas em todos os 139 municípios e visa ao aumento de receitas financeiras, além de promover a geração de novos empregos e a promoção de projetos sociais, em especial na área esportiva. A Lototins terá uma receita bruta prevista de mais de R$ 600 milhões, com a expectativa da geração de 1,5 mil empregos diretos e indiretos para os cinco primeiros anos, conforme dados do governo estadual.
VIOLAÇÃO EXPRESSA E DIRETA DA LEGISLAÇÃO FEDERAL
As peças atacam pontos similares, com a ação civil pública abordando com mais detalhes os possíveis impactos sociais. Na origem, o questionamento é de que a concessão contraria de maneira “direta e inequívoca” a Lei Federal 14.790 de 2023. O texto institui um regime concorrencial para o setor, com prazo de duração de cinco anos, e ainda impõe uma “vedação expressa, categórica e intransponível” quanto à utilização de máquinas eletrônicas, terminais ou quaisquer dispositivos físicos. Conforme a denúncia e a ação, o governo estadual descumpre todos estes pontos.
MONOPÓLIO PRIVADO DE DUAS DÉCADAS
O Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a competência estadual para operar loterias, mas os advogados destacam que a concessão deve cumprir os limites traçados pela legislação federal. “O Estado instituiu um regime de exclusividade, por meio de concessão com vigência de 20 anos, o que contraria frontalmente os dispositivos. Ao criar um monopólio privado de duas décadas, o Tocantins violou o marco legal regulatório, infringindo princípios constitucionais como o da legalidade, da impessoalidade e da moralidade administrativa”, escrevem na denúncia ao MPF.
APESAR DE VEDADO POR LEGISLAÇÃO, TOTENS ESTÃO DISPOSTOS EM ÁREAS PÚBLICAS DE ALTA CIRCULAÇÃO
Outro ponto destacado nas peças é a utilização de totens – expressamente proibidos pela legislação federal -, que estariam disponibilizados em em áreas públicas de alta circulação, próximos até de escolas. Além disso, a facilidade de utilização da máquina também é apontada como algo temerário. “Qualquer pessoa, independentemente da idade, pode iniciar apostas instantaneamente, bastando transferir valores via Pix. Não há qualquer mecanismo de autenticação, controle de identidade ou bloqueio de acesso para menores de idade. O mesmo padrão de permissividade se repete no ambiente virtual”, acrescenta ainda.
AMBIENTE VULNERÁVEL
A denúncia e a ação também sugerem a possibilidade de favorecimento à lavagem de capitais, isto por dificultar ou impedir a identificação correta do apostador. “A inexistência de qualquer mecanismo de identificação de quem insere recursos nos terminais físicos ou realiza transferências para fins de apostas pode configurar um ambiente altamente vulnerável à ocultação e dissimulação da origem ilícita de valores”, diz o documento ao MPF.
PEDIDOS
Ao Ministério Público Federal, o diretório estadual do PSB cobra a instalação de procedimento investigatório próprio, com vistas à apuração detalhada da possível prática de infrações penais por parte de agentes públicos e privados envolvidos na operação da Lototins. Na ação civil, a Educafro busca a suspensão imediata de todas as atividades relacionadas a apostas online até o cumprimento integral dos requisitos técnicos e normativos previstos na legislação federal, a remoção e vedação definitiva da instalação de quaisquer máquinas físicas de jogos; o bloqueio automático de qualquer aposta realizada por pessoa beneficiária de programas sociais, entre outros pedidos.