Em momentos de tanta dor e decepção somos convidados a meditar sobre a paciência. No antigo testamento o profeta Ezequiel nos diz que o próprio Deus tirará um galho da copa do cedro, um broto e o plantará sobre um monte alto e elevado (Ez 17,22-24). Interessante observar que essa comparação pode ser feito com a raça humana. Apesar da torre de babel, do dilúvio, do período de trevas da idade média, duas grandes guerras mundiais e atualmente a pandemia do Covid-19, somos comparados a um cedro, madeira nobre, e não a qualquer bambu. Apesar de todas as tribulações vividas, a raça humana sempre conseguiu superar os obstáculos. Interessante a majestade do cedro: apresenta altura de 20-35 m, com o tronco de 60-90 cm de diâmetro. Suas folhas compostas de 60-100 cm de comprimento, com folíolos de 8-14 cm de comprimento. É uma árvore nobre!
Já o apóstolo Paulo (2Cor 5,6-10) nos lembra que somos peregrinos longe do Senhor. A fé é que nos move e por isso devemos ter uma vida agradável perante Deus. Mas o que é ser peregrino?
Ser peregrino é “perder-se na direção certa”, viver o caminho que é o próprio Cristo. A grande dificuldade não é o cansaço, as decepções, as incertezas. Não é o caminhar que nos atrapalha, mas o egoísmo que nos faz preocuparmos apenas com nós mesmos. E neste caminho não podemos levar tudo. Para o caminhar ser mais leve temos que nos despojar do egoísmo, das tristezas, das coisas que nos separam do próximo. Temos que deixar de mão coisas pesadas. Peregrinar é caminhar com os outros, pois juntos podemos satisfazer as necessidades que o caminho nos impõe. Peregrinar é por-se a caminho do Reino de Deus!
Mas o que é o Reino de Deus? Devido à dificuldade de entendimento, Cristo faz algumas comparações (Mc 4,26-29), sendo que Ele diz que o Reino de Deus é como quando alguém espalha a semente na terra. Quem semeia vai dormir e acorda, e isto acontece dia e noite. Sem essa pessoa saber, a semente vai germinando e crescendo. Ao final, o mistério acontece e aparecem os frutos.
Qual é o nosso papel na construção de Reino de Deus? Simplesmente semear! Para que isso ocorra é necessário termos sementes de paz, amor e união. Se sairmos para semear e não levarmos essas sementes, nosso plantio estará fadado ao fracasso.
Não devemos preocupar se a semente vai brotar, se vai se transformar em planta. Quem semeou não sabe como isso acontece.
Interessante observar que o Reino de Deus está no meio de nós, mais precisamente em nosso coração. É por isso que somos comparados ao cedro, árvore de grande majestade. O Reino de Deus não é uma utopia. Eduardo Galeano, em uma de suas mais conhecidas frases diz: “A utopia está lá no horizonte. Me aproximo dois passos, ela se afasta dois passos. Caminho dez passos, e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar.” Se eu, vivendo na utopia, mesmo caminhando não consigo alcançar o horizonte, o que nos acalenta é saber que o Reino de Deus está em nosso coração! Com Sua paixão, morte e ressurreição Cristo nos deu uma nova vida e nos afastou do jugo de satanás.
Na nossa peregrinação rumo ao céu somos direcionados pela fé. Às vezes uma fé tão frágil, pequena e insegura. Aí entra outra comparação sobre o Reino de Deus. Cristo nos diz que “O Reino de Deus é como um grão de mostarda que, ao ser semeado na terra, é a menor de todas as sementes da terra. Quando é semeado, cresce e se torna maior do que todas as hortaliças, e estende ramos tão grandes, que os pássaros do céu podem abrigar-se à sua sombra” (Mc 4,29-34). Pequeno grão que se transforma na maior de todas as hortaliças!
A nossa fé precisa ser condizente com a vontade de Deus e deve vir acompanhada da paciência. Não adianta querer semear hoje e amanhã já fazer a colheita. “A paciência é amarga, mas seus frutos são doces”, já dizia o filósofo.
Temos que esperar que a semente germine, que ocorra a polinização. Essa polinização, diferentemente daquela que ocorre através do vento, da água ou dos animais, principalmente pelos insetos, só pode ser realizada de forma intencional pelos homens.
Ora, às vezes o mundo parece sombrio. Neste caminhar rumo à felicidade eterna vivemos num vale de lágrimas. Vemos o ser humano e a natureza gemer de dor! Neste período de pandemia a nossa fé é testada. O Estado que deveria nos proporcionar a segurança, acaba sendo o fomentador da violência. O nosso sistema de saúde, além de não conseguir fazer frente à pandemia, ainda é assaltado de forma vexaminosa. Às vezes sentimos que os céus estão fechados para nós!
O que dizer de tantas balas perdidas que parecem ter endereços certos? O que dizer de uma represa que arrebenta e inunda várias cidades com sua lama, levando morte em seu caminho de destruição?
A fé não nasce do nada! Se a nossa fé não criar frutos de paz e justiça ela não será muito diferente da fé dos doutores da lei e dos fariseus da época de Jesus. E olha que Cristo nos fala que “se a vossa justiça não exceder a dos escribas e fariseus, de modo nenhum entrareis no reino dos céus”.
Temos que ter uma fé sólida: acreditar, insistir e lutar. Não há lugar para uma fé que nada constrói e nem agrega.
O que faz o mundo sombrio é a nossa falta de fé. A nossa fé está diminuindo porque em muitas ocasiões depositamos mais confiança em nós mesmos que em Deus. Muitos acham que a independência intelectual, a prosperidade, a aquisição de cargos políticos, cargos na igreja e na sociedade já basta. Tudo isso pode levar a pessoa a confiar em si mesmo, em vez de confiar no Senhor. Esquecem que “somos servos inúteis; fizemos o que devíamos fazer” (Lc 17, 10).
O próprio Cristo já acenava para uma diminuição da fé. Em Mateus (24.12) Cristo nos fala que o amor diminuiria nos fins dos tempos. Muitos, inclusive, falam que esse parece ser um dos sinais da iminente volta de Jesus: a falta de fé e a falta de amor. Na segunda Carta a Timóteo, Paulo nos fala que nos últimos dias os homens seriam amantes de si.
Portanto, a pergunta de Jesus continua viva, mas não devemos nos desesperar. Nunca devemos abandonar nossa fé. Não devemos perder a esperança.
Devemos lembrar das palavras de Cristo: “Tudo é possível ao que crê”. Noutra parte, “aquele que crê em mim também fará as obras que eu faço, e as fará maiores do que estas.”
Infelizmente, à medida que se aproxima da volta de Cristo, o mal se torna cada vez pior, de modo que muitos que vivem nas Igrejas se distanciarão da fé em Cristo. O que devemos sempre perguntar é: será que estou perseverando na fé? Será que estou firme na oração? Estou fazendo com que o Reino de Deus seja semeado em todos os corações? A Justiça está prevalecendo sobre tudo? Lembrem-se da viúva do Evangelho: só queria justiça!
Será que nossa fé vai inundar a terra de paz e amor? Se realmente vivermos a Eucaristia a resposta será um retumbante: Sim, a fé prevalecerá! Isto porque a Igreja, enquanto depositária dos mistérios salvíficos de Cristo, tem a grande missão de fazer com que todos os homens e mulheres possam participar do corpo místico de Cristo.
Só que, para participar desse Corpo Místico de Cristo, precisamos da fé a cada instante, a cada momento. Devemos ter em mente a fé é graça de Deus, é dom de Deus. Gratia facit fidem, diz Santo Tomás de Aquino. A graça cria e recria a fé em cada momento.
Mas não nos esqueçamos das palavras do Mestre: “No mundo, tereis tribulações. Mas, tende coragem! Eu venci o mundo!”
LUIZ FRANCISCO DE OLIVEIRA
É promotor de Justiça de Porto Nacional, doutorando em Direito Público pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS, mestre em Prestação Jurisdicional e Direitos Humanos pela Universidade Federal do Tocantins – UFT, aluno do Curso de Doutorado em Direito Constitucional pela Universidade de Buenos Aires – UBA e professor da Universidade Estadual do Tocantins – UNITINS
luizfrancisco.oliveira2019@gmail.com
Instagram: @luiz_fcoto