A recente greve geral dos caminhoneiros nos leva a refletir um anseio já antigo de todos nós brasileiros. Trata-se de um movimento autêntico que obteve apoio maciço da população, que não se restringiu a pautas econômicas e concessões paliativas momentâneas. Os caminhoneiros, como todos nós brasileiros, estão fartos da falta de transparência geral da política e suas respectivas relações escusas e corruptas até à medula com a elite financeira do país. Estão cansados da matança geral, da ordem de mais de 60 mil brasileiros assassinados por ano.
Se caminhoneiros e brasileiros querem viver, o que dizer dos policiais? Ora, uma proposta de política que os massacre, que coloque em segundo plano a polícia e que a torne instrumento do cacife político da vez, já não elege ninguém há tempos, disso sabemos. Por outro lado, temos os policiais, que são os primeiros a sentir o caos de desmandos políticos e educacionais que reverberam no crescimento do crime. Eles são, igualmente, vítimas do sistema criminal falido mantido pela corja bandida que citamos lá atrás. Vide o caso do número recorde de policiais mortos no Rio de Janeiro. Para proteger, também temos nós, os policiais, estarmos vivos!
[bs-quote quote=”Estamos todos despertando nossa consciência crítica de país, de nação soberana, e, aos poucos, o gigante realmente está acordando, pois até mesmo políticos de esquerda famosos em defender bandidos já colocam na pauta o fortalecimento da polícia, leis mais severas para bandidos, um oxigenação do Sistema Criminal em podridão que solta bandidos todos os dias” style=”default” align=”right” author_name=”ROBERTO ASSIS ” author_job=”É delegado de Polícia Civil no Tocantins e escritor” author_avatar=”https://clebertoledo.com.br/wp-content/uploads/2018/07/RobertoAssis60.jpg”][/bs-quote]
Que fazer então? Antes de lindas e já entediantes propostas de investimentos em educação, é preciso, pois, ficar vivo! Vivo para educar, para ser educado, para pagarmos os impostos, vivos para mudar! E a elite política, cientes de que estão desgastadas em todas as esferas, já apostam, em suas propostas eleitorais, no fortalecimento das polícias. E nisso há uma palavrinha mágica chamada Meios de Ação. Ela, claro, não é citada por nenhum desses políticos. Nem sequer nas propostas. Um sistema criminal, de persecução penal, grosso modo e resumidamente, se compõe de: 1) uma boa polícia investigativa e científica, que apura os crimes cometidos, colhe provas, persegue o criminoso, efetua sua prisão e o apresenta à disposição da Justiça; 2) um bom promotor que, apanhando toda essa teia complexa de provas e fatos criminosos apresentados pela polícia, promova a acusação de maneira técnica e fundamentada; 3) a presença de um bom juiz, que julgará de forma severa, imparcial e técnico-científica todas as provas para condenar o fulano de tal nas penas que a lei confere. Mas dentro desse sistema quem vem primeiro? Sem uma boa polícia, que apure as provas de forma criteriosa, investigue o fato criminoso, encontre o bandido, o prenda, e o remeta à Justiça, tanto o promotor quanto o juiz ficarão ociosos. Não há serviço dentro do sistema criminal se não temos o criminoso. Se não há bandido – infrator da lei, dirão alguns mais “esclarecidos” –, não há acusação e tampouco julgamento. É mister, pois, conferir às polícias meios de ação que possibilitem uma boa investigação, com recursos materiais e pessoais que permitam à polícia cumprir o seu papel: trazer o criminoso frente à Justiça, para que responda por seus atos. Para que a lei seja aplicada. Para que o pai e a mãe que choram a perda de familiares todos os dias, possam ir à TV aos prantos dizer: perdi meu filho, mas ao menos fez-se Justiça. Eis que surge a palavrinha mágica. E aqui meios de ação não se restringe a equipamentos policiais sofisticados para investigar crimes e efetivo policial amplo.
Inclui também o que justamente os caminhoneiros reivindicam em seus bloqueios, e que nós brasileiros, em uníssono, almejamos, suplicamos, e agora, despertos como nação soberana, exigimos: leis mais duras com quem estupra, mata, rouba, trafica drogas, pois meios de ação para a polícia deduz aparatos jurídicos que permitam que o policial trabalhe com dignidade. Trabalhe com motivação, com garra e sede de trabalhar para a sociedade. Para que, no final, afinal!, a polícia vença o crime e o bandido. Se o policial investiga, encontra o bandido, prende o bandido, recolhe as provas do crime e na hora de colocá-lo encarcerado a lei quase pede desculpa por existir e ter que puni-lo – e sem hesitar, o juiz o solta, para a cumprir – isso cria na sociedade um ambiente tenso de instabilidade social. Isso gera caos. Tensão. Ressentimento coletivo de injustiça. Isso torna verídico o adágio lamentável de que o crime compensa. Pelo menos no Brasil compensa.
É claro que o estamento burocrático – termo cunhado pelo cientista político Raimundo Faoro –, mesclado de forma sistêmica em todas as esferas do Poder, possui um medo profundo ao fortalecer as polícias. Ora, investir em qualificação e efetivo para apurar crimes de lavagem de dinheiro, de evasão de divisas, de sonegação fiscal, de desvio de dinheiro público, é o tiro contra o próprio pé que político nenhum quer assumir. “Eu quero justamente uma polícia que ponha na cadeia meus adversários políticos!” E olhe lá, talvez nem eles! Mas isso está para mudar! A lição que os caminhoneiros querem nos legar é diferente. O poder, diz a Constituição Federal, a lei máxima de nosso país, deriva e pertence ao povo. Os caminhoneiros estão conscientes disso, e sua provocação crítica está alastrando país afora, via círculos concêntricos que atingem classes cada vez mais humildes. Estamos todos despertando nossa consciência crítica de país, de nação soberana, e, aos poucos, o gigante realmente está acordando, pois até mesmo políticos de esquerda famosos em defender bandidos já colocam na pauta o fortalecimento da polícia, leis mais severas para bandidos, uma oxigenação do Sistema Criminal em podridão que solta bandidos todos os dias. Que apoie a polícia. Isso perpassa, necessariamente, pela deposição não só dos políticos sujos que surrupiam nosso patrimônio, mas também de uma casta intelectual que perpetua ideias nefastas, criando uma elite de estudiosos que arejem as ideias que irão pautar os discursos políticos e jornalísticos do futuro. Afinal, tudo começa nas ideias!
Os policiais também sofrem com esta instabilidade social. E eles são a próxima força motriz a mobilizar o país em novas pautas de ordem e renovação política e social (quem sabe tema dê outra conversa). Todos nós sentimos na pele o crescimento das drogas, do crime e, pior, da respectiva defesa nefasta que muitos fazem dos criminosos e por derivação do crime mesmo. Por esse motivo a polícia apoiou os caminhoneiros, e sonham, como todos os brasileiros, com dias melhores: onde o caos dará lugar à ordem, a roubalheira à honestidade, ideias nefastas camufladas sejam destruídas – e onde termos antigos e fora de moda como ordem, valores, bem e verdade, voltem a serem pautas como vigas mestras da nação brasileira.
ROBERTO ASSIS
É delegado de Polícia Civil no Tocantins e escritor
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