Um instituto do Direito Processual Penal muito presente no dia a dia da Delegacia de Polícia é a fiança. Muita gente já ouviu falar que Fulano ou Beltrano foi preso, mas nem dormiu na cadeia porque chegou lá e pagou fiança. Ainda assim, não são muitas as pessoas que sabem como funciona essa questão. Na atividade de Delegado Plantonista me deparei com várias dúvidas de diferentes pessoas acerca da questão.
Sempre foi comum os indivíduos que eram conduzidos até a Delegacia na qual eu atuava ou mesmo a população em geral fazer perguntas sobre quem pode pagar fiança, como ela deve ser paga, para que serve, para onde vai o dinheiro e para que ele é utilizado. De antemão, posso dizer que esse dinheiro nunca fica na Delegacia de Polícia e nem é recolhido para ser utilizado pelas forças de segurança. Esta sempre foi a dúvida mais comum. Tentarei explicar como funciona a questão de acordo com nossa legislação.
[bs-quote quote=”Para determinar o valor da fiança, a autoridade observará a natureza da infração, as condições pessoais de fortuna e vida pregressa do acusado, as circunstâncias indicativas de sua periculosidade, bem como a importância provável das custas do processo até seu julgamento final” style=”default” align=”right” author_name=”MOZART M. MACEDO FELIX” author_job=”É presidente do Sindicato dos Delegados de Polícia do TO” author_avatar=”https://clebertoledo.com.br/wp-content/uploads/2018/03/Mozart60.jpg”][/bs-quote]
Nosso sistema penal prevê a possibilidade de haver na Delegacia de Polícia a concessão de liberdade mediante o pagamento de fiança para os autores de crimes que tenham pena máxima não superior a quatro anos.
Trata-se, ao mesmo tempo, de uma prerrogativa do Delegado de Polícia e de um direito fundamental do indivíduo, vez que está diretamente relacionada à liberdade do mesmo. Podemos dizer então que ela é um poder-dever do Delegado de Polícia, caso a autoridade policial entenda que o indivíduo não faz jus à concessão da fiança, deverá deixar de arbitrá-la de forma motivada, dando conhecimento dos fundamentos de sua decisão.
A fiança tem por finalidade assegurar a liberdade provisória do indiciado ou réu, durante a persecução penal, ou seja, durante o transcurso do procedimento adotado por nossa legislação até que alguém seja definitivamente condenado. A regra como já disse é que a fiança seja concedida, entretanto há situações em que não será possível que o Delegado a arbitre: 1) crimes com pena máxima superior a 04 (quatro) anos; 2) aos que, no mesmo processo, tenham quebrado fiança anteriormente concedida; 3)aos que infringirem, injustificadamente, qualquer das obrigações dos artigos 327 (comparecimento perante a autoridade, todas as vezes que for intimado para atos do inquérito e da instrução criminal e para o julgamento) e 328 (mudança de residência, sem prévia permissão da autoridade processante, ou ausentar-se por mais de 8 (oito) dias de sua residência, sem comunicação) do Código de Processo Penal; 4) Em caso de prisão civil ou militar; 5) quando presentes os motivos que autorizam a decretação da prisão preventiva.
O valor da fiança arbitrada pelo Delegado de Polícia e deve estar entre 1 e 100 salários mínimos, podendo ser dispensada caso o réu não possua nenhuma condição financeira. Pode também ser reduzida até o máximo de 2/3 ou ainda aumentada em até 1000 vezes levando em consideração o caso concreto. Para determinar o valor da fiança, a autoridade observará a natureza da infração, as condições pessoais de fortuna e vida pregressa do acusado, as circunstâncias indicativas de sua periculosidade, bem como a importância provável das custas do processo até seu julgamento final.
A fiança deverá ser justa e dentro dos parâmetros legais, evitando-se a fixação de valores irrisórios ou excessivos. Assim, as condições financeiras do indivíduo prevalecerão para estipulação de um valor suficiente para garantir o juízo, pois esta é a finalidade precípua da fiança. Ela deverá ser arbitrada de modo que assegure o comparecimento do indivíduo no curso do processo criminal, mas nunca de forma que inviabilize a sua prestação, uma vez que o conduzido somente será posto em liberdade se pagá-la; caso contrário, continuará preso.
Em relação à forma de pagamento, normalmente dá-se em espécie, mas a legislação prevê outras possibilidades como metais, pedras e objetos preciosos ou mesmo títulos da dívida pública, dentre outras. O dinheiro ou objetos dados como fiança servirão para o pagamento das custas, da indenização do dano, da prestação pecuniária e da multa, se o réu for condenado. Se a fiança for declarada sem efeito, se o réu for absolvido ou ainda se for declarada extinta a ação penal, o valor que a constituir, atualizado, será restituído sem desconto.
Assim, podemos dizer que a fiança é um valor pago pelo indivíduo que preencha os requisitos legais, estipulado levando em consideração que não pode ser um valor irrisório a ponto de a pessoa não se importar com comparecer a todos os atos durante o regular andamento do processo, mas também não pode ser um valor tão alto que inviabilize seu pagamento e não permita que o acusado possa se valer de seu direito à liberdade.
Esse valor ficará depositado e, em caso de condenação, será utilizado para pagamento das custas do processo, eventuais prejuízos causados pela prática criminosa e multas. Na hipótese de o acusado ser absolvido terá o valor restituído integralmente.
MOZART M. MACEDO FELIX
É delegado de Polícia Civil do Tocantins. Especialista em Direito Penal. Bacharel em Direito Pela Universidade Paulista. Presidente do Sindicato dos Delegados de Polícia do Estado do Tocantins. Diretor da Federação Nacional dos Delegados de Polícia Civil.
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