Relatório parcial da busca e apreensão feita durante a Operação Maximus, deflagrada pela Polícia Federal em agosto deste ano, nos endereços do advogado Daniel Almeida Vaz e sua esposa, Hanoara Martins de Souza Vaz, conclui não haver evidências de prática delituosa das desembargadoras Angela Maria Prudente (vice-presidente) e Etelvina Maria Sampaio (presidente do Tribunal de Justiça) em um dos 14 fatos investigados pela Polícia Federal.
A Operação Maximus investiga um esquema de pagamento de propina envolvendo desembargadores do Tribunal de Justiça do Tocantins (TJTO) após denúncia anônima e foi às ruas dia 23 de agosto, com a apreensão de dispositivos eletrônicos e a realização de buscas em endereços de investigados.
Assinado pelo delegado de Polícia Federal Daniel César do Vale, o relatório a que a Coluna do CT teve acesso traz os achados de pelo menos quatro informações de Polícia Judiciária, sobre os dois celulares e um notebook apreendidos com o advogado Daniel de Almeida Vaz e sobre as buscas feitas nos endereços de José Alexandre da Silva, empresário vinculado a empresa Ore Mineradora, entre outros.
O documento inclui ainda relatório parcial do inquérito 1668/DF em tramitação no Superior Tribunal de Justiça, com indiciamento de oito investigados.
Com o documento, o delegado afirma ter encerrado a primeira parte da investigação em relação ao caso Ore Mineradora, um dos 14 casos investigados pela operação.
No documento, o delegado considera ter encerrada a primeira parte dos trabalhos de Polícia Judiciária em relação ao caso da mineradora e o relatório ficava a cargo da Procuradoria da República para apreciação e providências pertinentes. Também colocava a PF à disposição para “eventuais outras diligências que sejam imprescindíveis ao oferecimento da denúncia”.
A lista dos indiciados não inclui os desembargadores João Rigo e Helvécio Maia “por expressa determinação judicial”. O delegado ressalta que “há elementos indiciários nos autos de autoria delitiva” em relação aos dois.
Os indiciados são:
Thales Andre Pereira Maia, filho do desembargador Helvécio
Paulane Brilhante de Macedo Maia
Daniel Almeida Vaz
José Alexandre Silva
Hanoara Martins de Souza Vaz
Isaac Fernandes de Castro
Thiago Sulino de Castro
Renato Jayme da Silva
Protocolado no Superior Tribunal de Justiça no dia 19 de dezembro, o relatório revela transferências bancárias suspeitas de um dos responsáveis pela mineradora para investigados, entre eles, empresas e pessoas ligadas ao advogado Daniel Almeida Vaz e sua esposa, Hanoara Martins de Souza Vaz, e empresa de fachada de Thales André Pereira Maia, filho do desembargador Helvécio de Brito Maia Neto, que se encontra afastado do cargo no Tribunal de Justiça desde o dia da operação, 23 de agosto.
Para a PF, Daniel e a esposa seriam operadores do esquema de venda de decisões judiciais investigado. Segundo o relatório, as transações suspeitas foram realizadas em 2022 e 2023, pouco antes de decisões judiciais favoráveis à empresa Ore Mineração.
Sem indícios de atos ilícitos das desembargadoras
Na deflagração da operação, a vice-presidente do TJTO, Ângela Prudente, foi apontada pela investigação como atuante na emissão de decisões judiciais em três apelações cíveis que levantaram suspeitas de parcialidade. Conforme decisão do STJ, as decisões concediam “provimentos favoráveis a partes que teriam negociado decisões com operadores do esquema criminoso”. Uma das decisões aplicou efeito suspensivo em decisão de primeiro grau que teria prolongado “indevidamente a extração de minério pela empresa beneficiada”.
Já a presidente do TJTO, desembargadora Etelvina Maria Sampaio Felipe, também é citada na decisão do STJ que autorizou a operação como autora de decisões que beneficiam partes ligadas ao esquema investigado. Além disso, tem sua atuação como corregedora-geral da Justiça mencionada, por ter designado o juiz investigado Océlio Nobre, para atuar em processos de interesse do grupo e como responsável pelo Núcleo de Prevenção e Regularização Fundiária (Nupref). O gabinete de Nobre no Fórum de Palmas foi alvo de busca e apreensão em agosto. Dias depois, ele foi removido para sua comarca de origem, em Guaraí, noroeste do Tocantins.
No relatório, o delegado cita, no item 286, não ter encontrado provas contra as duas. “As análises até a presente data não evidenciou (sic) prática delituosa que em tese pesavam sobre as Desembargadoras ANGELA MARIA RIBEIRO PRUDENTE e ETELVINA MARIA SAMPAIO FELIPE”.
O delegado ressalta que na representação policial ao STJ, constou o nome da presidente do TJTO porque o processo investigado está em segredo de justiça e o nome de Etelvina Sampaio aparece como responsável por ser a presidente, mas a investigação evidenciou “que, de fato, o magistrado que decidiu na qualidade de presidente foi João Rigo Guimarães”.
João Rigo é o atual presidente do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-TO) e também foi alvo de busca e apreensão policial em seu gabinete no TJTO e endereço residencial, em Araguaína. No cumprimento desse mandado de busca e apreensão foram encontrados R$ 206 mil, em espécie em sua residência.
Decisão comemorada seguida de transações financeiras suspeitas
No item 51 do relatório, o delegado cita que em 15/12/2022, por volta das 16h6, Daniel Vaz compartilha uma decisão de João Rigo pela qual comemora: “Para uma equipe dessa não tem como perder, não. Uma equipe dessa é a equipe vencedora.”
No mesmo dia da decisão de João Rigo, Daniel Vaz aciona a esposa para “provisionar saque de alguma conta deles de um crédito que ainda nem tinha caído”.
Segundo a PF, sete dias depois, em 22/12/2022, Daniel Vaz pede a um dos responsáveis pela mineradora José Alexandre Silva, que fracione o valor entre 2 contas bancárias. No dia seguinte, a conta de uma empresa de Alexandre silva transfere R$ 150 mil para a empresa de Daniel Vaz.
No mesmo dia, às 11h26, segundo o relatório, por aplicativo de mensagem Daniel envia para a esposa os detalhes da conta bancária da empresa de Thales Maia, filho do desembargador Helvécio Maia. Poucos minutos depois, Hanoara compartilha uma foto com o comprovante de Pix feito da conta da empresa do advogado para a empresa do filho do desembargador, no valor de R$ 45 mil.
Para a PF, o caminho do comprovante no computador da esposa do advogado “deixa
bem claro que eles sabiam que o destinatário do recursos era Thales”.
O relatório descreve diversas transferências bancárias suspeitas, entre as quais se destacam, no item 121 do relatório, um total de R$ 280 mil de Daniel Almeida Vaz e Hanoara Martins de Souza Vaz para a empresa de Thales André Pereira Maia e sua esposa divididos em 13 pagamentos, sendo duas TED e 9 pix “evidenciando verdadeira técnica de fracionamento (smurfing)”, afirma o relatório.
O documento lista ainda mais R$ 100 mil para Isaac Fernandes de Castro, irmão de Thiago Sulino de Castro, outro advogado investigado, em data próxima a uma decisão do desembargador Helvécio de Brito Maia Neto. A decisão, segundo o relatório, foi usada pelo advogado Daniel Vaz para suspender um procedimento administrativo do Naturatins que poderia determinar o cancelamento da licença prévia para extração e minério (ferro e manganês) da empresa de José Alexandre, que assumiu os direitos minerários da Ore Mineradora A
No item 132, o relatório da PF afirma que equipe de análise demonstrou que havia uma contabilidade do pagamento de propina contabilizando inclusive os R$ 100 mil pagos para o irmão de Thiago Sulino, advogado que acabou inscrito em um contrato advocatício da empresa de Alexandre.
Conforme o relatório, 4 horas depois da inclusão de Sulino no contrato advocatício, Daniel compartilha com Alexandre, despacho do presidente do Naturatins, Renato Jayme, restabelecendo os direitos operacionais da empresa de Alexandre.
“Os R$ 100.000,00 passados de DANIEL ALMEIDA VAZ, de forma fracionada, para THIAGO SULINO DE CASTRO por interposta pessoa, quem seja ISAAC FERNANDES DE CASTRO, […], irmão de THIAGO SULINO era para fazer frente ao pagamento de propina para proferir o Ato Administrativo de 20/01/2022, conforme “DESPACHO Nº …/2022”, nos autos do Processo Administrativo nº 2021/40311/010685 em trâmite na NATURATINS, para voltar a valer a Licença Prévia nº 04/2022, Licença de Instalação nº 03/2022 e Licença de Operação nº 07/2022 junto à NATURATINS, concedida em benefício do presidente RENATO JAYME, simulada por meio de Contrato Advocatício”.
A PF lista ainda transferências de R$ 150 mil de José Alexandre Silva para Daniel Almeida Vaz: R$ 150 mil e mais R$ 150 mil de José Alexandre Silva para Thiago Sulino de Castro. A PF concluiu que as transferências bancárias seriam propina para obter decisões judiciais favoráveis à empresa Ore Mineração.
O delegado da PF ressalta que mensagens trocadas entre as esposas dos envolvidos pediam para somar transferências e saques para dissimular transações com o fim de “não identificar a origem e movimentação do dinheiro utilizado para pagamento de propina até atingir o valor de R$ 500.000,00”. Conforme o relatório, este é o preço pago no esquema por uma decisão (tutela provisória de urgência) para conceder efeito suspensivo ao recurso especial da mineradora Ore.
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