Festas tradicionais e artesanato são importantes atrativos para o desenvolvimento do turismo nas comunidades indígenas tocantinenses, sendo a pesca esportiva mais um fator que agregador e altamente rendável, principalmente na Ilha do Bananal. O incentivo ao Etnoturismo, que tem potencial reconhecido no Tocantins e é uma demanda de várias comunidades, está na pauta de ações da Agência do Desenvolvimento do Turismo, Cultura e Economia Criativa (Adetuc), que recentemente iniciou diagnóstico nas aldeias Javaé e Krahô Kanela.
Durante o trabalho de inventariação turística do município de Lagoa da Confusão, a equipe da Superintendência de Turismo esteve em três aldeias e um acampamento de pesca, para levantar as demandas das lideranças indígenas e conhecer as potencialidades de cada agrupamento, tanto para o desenvolvimento da pesca esportiva quanto para a atração de visitantes para atividades culturais.
“A vida dos povos originários do Brasil é cercada de curiosidade e desconhecimento, há um grande público interessado, inclusive internacional, o que pode resultar em geração de renda e melhores condições de vida nas aldeias”, pontua Jairo Mariano, presidente da Adetuc, ressaltando que o governador Mauro Carlesse está atento ao fortalecimento do turismo como força econômica, inclusive nas comunidades indígenas.
De acordo com as gerentes de Produtos Turísticos, Kleiryanne Aguiar, e Projetos Estratégicos, Mayna Bezerra, que também é responsável técnica pela Região Turística da Ilha do Bananal, as aldeias visitadas possuem grande potencial a ser desenvolvido, sendo necessária a elaboração de projetos e parceria de outras pastas do Governo e entidades públicas e privadas.
Pesca esportiva
O povo Iny (pronuncia-se “Inã”) reúne a maior população indígena do Tocantins, e inclui os Javaé e Karajá, que vivem em grande parte na Ilha do Bananal, além dos Xambioá, sediados na região de Santa Fé do Tocantins. O pescado faz parte de sua alimentação tradicional, sendo a pesca profissional um meio de sobrevivência para várias comunidades. Mas o avanço da pesca esportiva na região tem aberto novas perspectivas, não apenas econômicas, como também ambientais, e a abundância de rios e lagos na região.
Uma das lideranças locais, o ex-cacique Walter Javaé, 56, conta que seu pai foi fundador da Boto Velho, maior aldeia da etnia, e seu filho é o atual cacique da aldeia Tixodè. Seu acampamento encontra-se em uma área privilegiada, onde o rio Verdinho, que tem uma extensão de 37 km, encontra-se com o Javaé. Ele, que já atuou na Fundação Nacional do Índio (Funai), explica que ainda é preciso identificar todos os lagos, visando a alternância dos pontos de pesca, para garantir a reprodução das espécies locais.
“Estamos aprendendo a entender o pesca e solta para trabalhar com turismo”, conta Walter, relevando que dentro da Ilha do Bananal, na chamada Mata do Mamão – fechada para qualquer forma de exploração, devido à possível presença de indígenas não contatados – há “piroscas com mais de 200 kg e enormes Anacondas” (sucuris gigantes).
Casado com uma Javaé, Miguel Waotia Karajá, 64, é cacique da aldeia Watnã, e mostrou com orgulho, à equipe da Adetuc, o rio Barreiro, que possui 1500 metros, sendo que a área de sua aldeia possui mais oito lagos, três já mapeados e cadastrados no Ministério da Pesca. “Tem lago sem pesca há 2 anos que está com muito pirarucu”, conta ele, que em setembro passará o comando da aldeia, formada por nove famílias, para dois de seus filhos. “Sempre procurei desenvolvimento para o meu povo”, diz.
“Antes da criação do parque indígena, essa terra já era nossa, hoje precisamos de desenvolvimento, geração de emprego e renda, por isso estamos buscando essa parceria com município e Estado”, revelou, ao defender a proteção da cultura Iny, com a construção de um centro de visitas e museu, no formato de uma casa tradicional, para receber os visitantes. Miguel, que defende a prática da pesca esportiva com fiscalização indígena, também mostrou outras riquezas de suas terras: um grande pé de jatobá e uma pedra negra que, segundo estudos de duas mineradoras, é manganês e possui cerca de 5 mil metros cúbicos, estando sua totalidade abaixo da terra.
Apesar do pai indígena, Paulo César Javaé, 48, nunca negou suas raízes, aprendendo com a mãe as tradições do povo Iny. “Falo minha língua muito bem, minhas raízes estão aqui”, conta ele que é cacique da aldeia Horotory Awá, com 15 famílias, formada há apenas 3 anos. Ele revela que a pesca profissional já foi a principal fonte de renda de seu povo, que depois passou a ser a criação de gado. “Antigamente, a gente não precisava de vaca ou cesta básica para fazer a festa do Hetoroky; o pai plantava mandioca pra comer com peixe, batata doce, banana, colhia mel silvestre. Tendo alimento suficiente chamava para a festa dos diré”, conta, sobre a festa tradicional que marca a passagem dos meninos para a vida adulta.
Segundo Paulo César, a área Javaé possui mais de 30 lagos, mas alguns secam no período sem chuvas e outros são verdadeiros pântanos no período chuvoso. Para ele, é fundamental revezar a exploração dos lagos para pesca esportiva, e controlar a entrada desordenada de não indígenas pela principal balsa que dá acesso à Ilha. “Ninguém vai entrar sem autorização, e ninguém vai sair com peixe”, defende, sempre com a preocupação de gerar estabilidade econômica para seu povo. “A questão da pesca depende de controle, fiscalização”, completa.
Oportunidade
Com uma trajetória de grandes perdas e quase dizimação, o povo Krahô Kanela conquistou a regularização das suas terras e o reconhecimento como etnia há menos de duas décadas e vem, aos poucos, retomando suas tradições e língua, a partir de projeto de revitalização que conta com apoio de instituições de ensino superior e do povo Krahô. Para eles, Etnoturismo não é visto apenas como uma possibilidade de geração de renda, mas também um estímulo à retomada das festas tradicionais, danças e cantos, ao uso de pinturas e produção do artesanato.
A Terra Indígena conta com 130 moradores, está localizada a 57 km de Lagoa da Confusão e possui 12 lagos entre os dois mais importantes rios da região, o Formoso e o Javaé. Para Wagner Katamy Ribeiro da Silva Krahô Kanela, presidente da Associação do Povo Indígena Krahô Kanela (Apoinkk), é viável trabalhar o turismo associado a preservação ambiental. Sua proposta, que conta com apoio de lideranças da aldeia, é trabalhar com pesca esportiva no Lago do Cacoal, a cerca de 2 km do rio Javaé, aliando outras atividades, como a observação de animais silvestres e apresentações culturais.
“É comum na região o aluguel de pastagens, a criação de gado e a pesca profissional, o turismo é uma nova oportunidade”, aponta Wagner, ressaltando que a ideia é preparar uma estrutura para a pesca esportiva e treinar os jovens da aldeia para atuarem como vigilantes e condutores. (Da assessoria de imprensa)