Em entrevista ao CT, nesta sexta-feira, 15, a presidente do Sindicato dos Médicos do Tocantins (Simed-TO), Janice Painkow, se manifestou sobre a inspeção do Tribunal de Contas do Estado (TCE-TO), realizada nos 18 hospitais do Tocantins em 2017, que apontou descontrole na quantidade de pagamento de plantões extraordinários e de sobreaviso. A sindicalista argumentou que o relatório do órgão sobre a fiscalização não é definitivo e que o Simed entrou no processo como amicus curae para esclarecer a jornada do médico hospitalar, que geralmente não é cumprida em regime normal de trabalho, como de outros profissionais, mas em plantões.
Janice explicou que como alguns médicos e outros profissionais de saúde trabalham mais de seis horas ininterruptas, sem horário de almoço ou intervalo, em período noturno, finais de semana e feriados; a jornada de trabalho que seria de 40 horas passa por um processo chamado de conversão de carga horária, que é feito por meio da Mesa Estadual de Negociação Permanente do Trabalho no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) com os sindicatos.
“Uma coisa é eu ser concursada para quatro horas de manhã e quatro horas à tarde, de segunda a sexta-feira. Outra coisa é eu trabalhar de forma ininterrupta, sem horário de almoço, sem feriado, sem final de semana e em período noturno”, argumentou a médica, acrescentando que, conforme a legislação, a hora noturna é contabilizada a cada 50 minutos e não 60 minutos.
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Resposta ao TCE
Janice contou que recentemente esteve na Corte de Contas para tratar sobre a inspeção realizada nos hospitais. Segundo ela, o TCE fez um relatório preliminar e não definitivo. O processo continua tramitando na Corte e o Simed vai ingressar na condição de amicus curiae.
Em despacho, publicado no Boletim Oficial do TCE no dia 14 de maio deste ano, o conselheiro Severiano José Costandrade de Aguiar deferiu o pedido da entidade para receber informações a título de contribuição técnica. “Ele nos aceitou dentro desse processo para a gente explicar essa carga horária. Essa é até uma forma de ajudar a secretaria, uma vez que os superintendentes e diretores não souberam fazer isso”, afirmou a sindicalista.
Plantões médicos
Em relação ao plantão de sobreaviso, que de acordo com relatório do TCE estaria sendo cumprido de forma irregular e onerando os cofres públicos, a sindicalista alegou necessidade do próprio sistema. Segundo ela, a deficiência de alguns especialistas, como de cirurgião torácico, por exemplo, faz com que profissionais cumpram sua carga horária nessa modalidade.
“Como no Estado, e em nenhuma outra parte do Brasil, não se dispõe desses profissionais em quantidade suficiente não é possível fechar uma escala normal de trabalho e se faz necessário recorrer ao plantão de sobreaviso”. Janice pontuou, entretanto, que essa modalidade não pode ser utilizada por médicos de especialidades básicas.
Da mesma forma, a presidente do Simed ressaltou que o déficit de médicos, principalmente no interior, faz com que os profissionais cumpram plantões extraordinários. A entidade defende a realização de concurso público para suprir a demanda de profissionais.
Controle de frequência
No relatório, os auditores do TCE também citaram atrasos de médicos e ressaltaram que o controle de frequência é realizado de forma “precária”, pois apesar de existir folha de ponto, as mesmas não seriam assinadas diariamente. Para Janice, os servidores da Corte foram “coerentes” ao mencionar esse problema da gestão. Ela confirmou que realmente não existe um controle de entrada e saída dos profissionais.
“Nós sempre pedimos para Secretaria de Saúde baixar os atos para dizer como vai funcionar o serviço e como o profissional vai dizer que estava lá naquela hora. Agora, realmente nós temos um ponto que não funciona e uma catraca que não funciona”, confirmou.
Revogação de Portaria
A Portaria/Sesau Nº 937/2012 que também foi questionada pelo TCE, segundo Janice, atendia os anseios da categoria em relação a carga horária, pois os profissionais tinham que cumprir 12 plantões de 12 horas, por mês. “Ela respeitava todas as legislações. Não foi criada aleatoriamente, nem para benesse”, disse. Entretanto, o dispositivo foi revogado no início do ano pelo ex-secretário de Saúde Marcos Musafir.
O então gestor, na ocasião, publicou uma nova Portaria, a 247/2018, com uma carga horária maior para os profissionais da saúde. A sindicalista apontou que eles teriam que cumprir 15 plantões de 12 horas, ou 30 plantões de 6 horas, por mês, sem acréscimo na remuneração.
De acordo com o Simed, a Portaria 247 não passou pela mesa de negociação e foi publicada “de forma viciosa, no apagar das luzes, numa sexta-feira, às 20 horas”. “Essa portaria não faz a conversão da jornada de trabalho e coloca o profissional para trabalhar numa proporção maior do que aquela que nós fomos contratados para trabalhar”, reclamou Janice. “Nós não queremos benesses, nem horas a menos. Nós queremos o que é justo”, reivindicou.
Após contestação dos sindicatos, o dispositivo foi suspenso. A entidade e os sindicatos representantes dos demais profissionais de saúde agora querem se reunir com a Secretaria de Saúde para editar uma nova portaria na Mesa de Negociação SUS. Nesse processo de conversão, conforme a presidente do Simed, devem ser descontados feriados, finais de semana, horas noturnas, intervalo e horário de almoço trabalhados.
Entenda
Inspeção realizada na Secretaria Estadual de Saúde teve como objetivo verificar diversas situações gerenciais e práticas referentes aos profissionais médicos do Estado do Tocantins, com enfoque principalmente no que tange ao cumprimento da jornada de trabalho, composição e adequação do sistema remuneratório, licenças e cessões para outros órgãos.
Conforme relatório dos auditores foi constatada deficiência na gestão e controle de registro de frequência, no cumprimento efetivo das escalas, bem como em atos normativos, principalmente a Portaria n.º 937/2012. O TCE averiguou ainda descontrole na quantidade de pagamento de plantões extraordinários e de sobreaviso e inadequações na concessão de licenças e cessões.