Em um desses determinados feriados prolongados, quando projetamos belos descansos e relacionamentos familiares, que, lamentavelmente, ultimamente andam tão raros e quando as companhias são agradáveis os feriados sempre passam mais depressa do que esperamos e, assim, resolvemos visitar nossos sobrinhos em Brasília, que residem numa aprazível mansão à margem Sul do Lago Paranoá, cercada por um imenso, belo e bem cuidado gramado e muitas árvores frutíferas, além de uma área verde incomparável.
Naqueles dias, ao entardecer, estávamos ao lado da piscina, sempre num ponto estratégico, degustando alguma bebida e apreciando o multicor crepúsculo da Capital Federal, por sinal um dos mais belos que conheço, muito parecido com os finais de tarde da minha terra natal, embora naquele sempre pude contar com a beleza da Serra Geral e as ilusões que envolviam minha infância e adolescência, sem contar que foi o céu que assistiu meu nascimento.
Como em todos os dias o céu era cruzado por aviões que chegavam e partiam, num tal de levar e trazer pessoas carregando ilusões e desilusões, avarezas e poderes; observávamos, também, a grandeza e pureza da natureza que nos bandos de bem-te-vis, pássaros pretos, periquitos, quero-queros, sabiás e tantas outras espécies do cerrado despediam-se do dia e procuravam o aconchego dos seus ninhos nas belas mangueiras, pequizeiros, sucupiras e palmeiras imperiais que nos cercavam.
No emaranhado de beleza e cor, chama minha atenção uma coruja pousada sobre um pequeno poste. Impassível, compenetrada e circunspecta, fazendo transparecer seus dons de paciência, tolerância e observação. Um pequeno pássaro, lépido, de voo insinuante, provocando a coruja, consultava sua bússola orientadora, calculava altitude, longitude e tomava uma considerável distância, marcando com precisão o seu alvo, a coruja, colocando-a na linha de ataque. Partia executando voos rasantes sobre a impassível ave estrigiforme. Afastava-se, preparava-se para novo ataque. Por diversas vezes assim fez. Determinado momento, já depois de muitas provocações, o pequeno pássaro tomou uma distância bem mais considerável, preparando-se para mais um voo rasante perturbador sobre aquela coruja que demonstrava uma paz de mestra. Naquele lapso de tempo, sorrateiramente a coruja desloca-se para um arbusto, um jasmineiro recém-plantado, com meio metro de altura e agasalhou-se sob sua folhagem larga e espatulada. O atacante indesejável, meio desorientado e desapontado, procurou por toda parte e não encontrando o seu alvo voou para bem distante, talvez à procura de outros a serem incomodados.
A lição da coruja para nós humanos: compreendendo as limitações e provocações do agressor, ou quem sabe entendendo as suas fraquezas, limitou-se a afastar-se e procurar um recanto seguro para sua introspecção e aprofundamento da paciência e tolerância.
Enquanto isso a noite calma se abateu sobre a bela Brasília abrindo as cortinas dos jardins do infinito que mostravam a beleza das margaridas universais em forma de estrelas…
Em tempo: o casal de joão-de-barro era e continua, impreterivelmente, sendo o despertador às 6:00h da manhã e anuncia o entardecer às18:00hs naquele belo recanto…
JOSÉ CÂNDIDO PÓVOA
É poeta, escritor e advogado; membro-fundador da Academia de Letras de Dianópolis.
candido.povoa23@gmail.com