Foi na década de 1950, mais precisamente no ano de 1953, que Dianópolis, minha terra natal, situada no então Nordeste de Goiás, na época conhecido como o corredor da miséria, em vista do abandono por parte dos políticos, hoje situada no Sudeste do Estado do Tocantins e polo de desenvolvimento de uma próspera região, que por intervenção do Dr. João Rodrigues Leal e o Deputado João D’Abreu, recebia as freiras integrantes da Congregação Escravas do Divino Coração de Jesus, que, oriundas diretamente da Espanha, iniciavam uma trajetória de pregação do Evangelho de Jesus, combinado com a formação intelectual e moral em continuidade com o que aprendíamos em nossos lares.
Se estabeleceram na ainda precária construção do que viria a ser o Ginásio João D’Abreu.
Diante desse preâmbulo e pelo momento que Dianópolis vive em relação àquelas freiras tão especiais, retornei no tempo e pude passear pelas minhas ilusões e sonhos naquela época acalentados. Revi os meus desejos e paixões por tudo que ali eu pude sentir. Relembrei-me dos trabalhos em peças teatrais, quando por muitas vezes figurei como ator principal, tudo capitaneado pela saudosa Madre Stela. Deixei meu coração navegar, viver e morrer, a exemplo dos papéis que exerci nas peças teatrais, quando, literalmente as incorporava como se verdadeiras fossem.
Recordei-me da Madre Aranzazu, para os alunos mais antigos, pois para os mais recentes, Irmã Amparo, com sua disciplina rígida cobrando de nós adolescentes, atitudes de adultos. Ela cumpria sua missão de nos formar para a vida.
Revivi as provas de português aplicadas pelo nosso intelectual professor e amigo Padre Magalhães, que além do seu vasto conhecimento sobre a matéria, nos ensinou apreciar e gostar de músicas clássicas, pois enquanto tentávamos resolver as questões, quase sempre, ou melhor, muito difíceis sempre, ouvíamos músicas através de um toca-discos portátil colocado sobre a mesa do mestre. Esse mesmo mestre que após transcrever as questões no quadro negro, retirava-se da sala e só retornava no final do horário concedido para a resolução das questões. E, pasmem, ninguém ousava sequer consultar o colega ao lado ou o mais próximo.
Como esquecer-me do Professor Osvaldo Póvoa, que depois da conclusão do curso superior no Rio de Janeiro, ainda jovem retornou e dedicou toda sua vida à nossa terra e nos ensinou a todos, desbravar e desvendar o mundo da matemática e do inglês.
Revivi os momentos de ensaios para apresentação na semana da pátria. Época em que tínhamos o respeito na devida dimensão sobre os símbolos e armas do Brasil. Ouvíamos o hino nacional com a convicção de que estávamos sendo chamados a amar cada vez mais o nosso País e nossa terra. Voltei às brincadeiras do recreio na área coberta.
Revivi os flertes e namoros passageiros com as alunas de várias cidades que ali estudavam em regime de internato. Revi meus amigos de infância em especial Toni Póvoa e de adolescência, Alencar e Bonfim, quando juntos, ao criarmos o conjunto musical denominado the ember boys, e por muitos denominados de trio ABC (Alencar, Bonfim e Cândido – Trio ABC), desafiávamos os preconceitos e costumes dos anos 60, implementando atos e fatos novos, corroborados com a chegada das músicas dos Beatles e da Jovem Guarda e que mudaram para sempre a história da juventude da nossa terra, a exemplo do que ocorreu no Brasil afora. Que estivemos na linha de frente dessa mudança radical de costumes, juntamente com outros jovens da nossa terra, isso é fato.
O grande pátio, as filas formadas, diariamente, por ordem da série que cursávamos, quando e onde um dia assisti estarrecido, pela primeira e única vez na história da cidade e daquela unidade de ensino, a expulsão de um colega, injustiçado pela incompreensão de alguns adultos.
Revi os muitos colegas que se tornavam a cada dia membros da nossa própria família, pois além da convivência nas salas de aulas, a própria cidade pela sua pequena dimensão geográfica, encarregava-se de fazer com que nos encontrássemos em todos os momentos e em cada esquina.
Mas com a consciência plena de que tudo e todas as atividades nesta humana vida, existe um princípio e fim, lamentavelmente fico sabendo que tudo isso e o Ginásio João D’Abreu, com a transferência de todas as freiras para outra cidade, depois de quase 70 anos de trabalhos de um verdadeiro sacerdócio e passam a fazer, mais do que nunca, parte da história da nossa querida Dianópolis e muito mais de tantas gerações que por ali passaram e se abasteceram na fonte do saber que dali brotava e que nos ajudou a todos a vencer as vicissitudes da vida, sem contar que foi lá, também, que aprendemos que o lema daquela congregação de que servir é reinar foi cumprido diante do nosso povo e dos olhos do Criador. Aprendemos, ou melhor, reafirmamos em nossas vidas que o amor tudo pode, tudo suporta e tudo perdoa.
Que transformemos a tristeza do momento em alegria perpétua por termos participado de uma história tão bela que agora de fecha com sucesso pleno.
Louvado seja o “SAGRADO CORAÇÃO DE JESUS!”
“Quem tem ouvidos que ouça, quem tem olhos que veja!”
JOSÉ CÂNDIDO PÓVOA
É poeta, escritor e advogado. Membro fundador e titular da cadeira nº 12 da Academia de Letras de Dianópolis (GO/TO), sua terra natal.
jc.povoa@uol.com.br