“Com o suor do teu rosto comerás o teu pão, até que voltes ao solo, pois da terra foste formado; porque tu és pó e ao pó da terra retornarás!” Nos ensina Gênesis 3.19.
Depois que nosso espírito passa desta para o outro lado da vida, nosso corpo perde suas defesas e utilidades e começa a ser atacado por todos os lados: bactérias, animais e até substâncias produzidas por nós mesmos dão início ao nosso fim. O cadáver vai ficando escuro e inchado, a pele e os órgãos se desfazem e o cérebro vira um caldo. Depois de algum tempo, não sobra quase nada. A decomposição acontece em duas frentes. A primeira é a mais esquisita: o próprio corpo se decompõe. A oxigenação para de acontecer e o organismo se desequilibra. Minerais importantes para o metabolismo, deixam de ser produzidos. Com isso, as células se desestabilizam e passam a digerir o próprio corpo. Ao mesmo tempo, bactérias famintas também entram no banquete.
[bs-quote quote=”Maturidade espiritual é quando aceitamos que erramos, aprendemos a nos desculpar e a não jogarmos no colo do outro o que é nosso” style=”default” align=”right” author_name=”JOSÉ CÂNDIDO PÓVOA” author_job=”É poeta, escritor e advogado” author_avatar=”https://clebertoledo.com.br/wp-content/uploads/2018/03/JoseCandido-PovoaNova60.png”][/bs-quote]
As primeiras a avançarem na carne são as da flora intestinal e da mucosa respiratória, que já vivem no organismo. Para continuarem vivas, essas bactérias invadem os tecidos e os devoram. Depois disso, as bactérias do ambiente deixam o cadáver irreconhecível. O resto fica para insetos e até cães, gatos e urubus. Em geral, um corpo sepultado leva de um a dois anos para se decompor totalmente, mas esse tempo pode variar dependendo das condições do ambiente e do cadáver. No fim sobram apenas ossos e dentes que duram milhares de anos a mais que os outros órgãos.
Pode parecer chocante esse preâmbulo, mas a régua da matéria dos iguala a todos dessa forma.
Quando crianças vivemos na expectativa de atingirmos a adolescência, muitas vezes deixando de lado os acontecimentos mais puros da nossa existência, quando somos imagens e semelhanças de anjos; Na adolescência, fase de descobertas e explosões de hormônios e vaidades tredas, vivemos aflitos para atingirmos os 18 anos de idade, que nos ofereceria a pretensa liberdade e autonomia tão sonhada pela juventude.
Hoje, já cumpridas quase todas as tarefas que me foram confiadas nesta missão aqui na Terra, quando posso catalogar tantas buscas e conquistas, vitórias e decepções, coisas inerentes a todos nós humanos, conclamo o prezado leitor para refletirmos sobre a verdadeira liberdade e maturidade: A espiritual. É o que nos resta levar após a dizimação da matéria consumida pela própria matéria e nos ensina Gênesis acima citado.
Maturidade espiritual é quando aceitamos que erramos, aprendemos a nos desculpar e a não jogarmos no colo do outro o que é nosso. É quando percebemos que já não precisamos de tanta coisa assim para suprir nossas necessidades, que estarmos em paz conosco mesmo é melhor do que provocar instigar ou cutucar o outro a troco de nada, é parar de mexer em feridas por vezes já cicatrizadas. É quando passamos a ser mais seletivos internamente, é quando sabemos que podemos contar com poucos, mas que são essenciais e que mantém uma boa relação de amizade e empatia sem exigir nada em troca.
É quando olhamos mais à volta e nos colocamos no lugar das pessoas e não mensuramos a sua dor, assim como não queremos que mensurem as nossas. É quando não interferimos nas escolhas de ninguém e vamos aprendendo a digerir os embates da vida com mais nitidez e resiliência. É quando percebemos que não precisamos ter a casa cheia, não precisamos de tanto barulho, que estarmos a sós é como irmos nos retratando diante do que estamos sentindo, do que que já sentimos ou do que não queremos mais sentir. É não precisar ir de um lado para o outro tentando encontrar sossego interior. É quando aprimoramos e abstraímos o que não precisamos e pedimos com fé e acreditamos mais no que é transcendental e espiritual e não em falsas promessas ou pessoas que não têm serventia por serem apenas instrumentos prontos a desestabilizar nosso coração, prontas a se apossarem do que não lhes pertence a troco de fazer-nos sofrer.
Maturidade espiritual é quando oramos pedindo pelos que precisam, pelos que adoecem a alma e pedimos para que todos recebam luz por mais que não se queira aproximação.
É quando esvaziamos a bagagem da vaidade, do orgulho, da prepotência, do apego aos bens materiais e percebemos que tudo não passa de um simples episódio terreno numa missão espiritual eterna.
Enfim, maturidade espiritual é quando aprendemos a calar, a nos afastar, a não nos agredirmos a nós mesmos e não agredirmos ninguém
Quem tem ouvidos que ouça, quem tem olhos que veja!
JOSÉ CÂNDIDO PÓVOA
É Poeta, escritor e advogado. Membro fundador e titular da cadeira nº 12 da Academia de Letras de Dianópolis(Go/To), sua terra natal.
jc.povoa@uol.com.br