A Defensoria Pública Estadual (DPE-TO) constatou uma irregularidade na saúde do Tocantins que pode ser a fonte geradora dos muitos problemas dos hospitais. Em entrevista exclusiva ao CT, o defensor público Arthur Luiz de Pádua Marques informou que a centralização dos recursos da área na Secretaria Estadual da Fazenda (Sefaz) é “inconstitucional” e uma “estratégia de governo” para utiliza-los nas áreas menos prioritárias para pagamento de supostos contratos superfaturados.
“Se você for pegar existe, por exemplo, contrato de locação acima de preço, contratos de gastos supérfluos, fornecedor de publicidade e de aluguel de prédio que recebe tudo em dia. Nesses casos o Estado não atrasa um pagamento, mas para o SUS atrasa”, denunciou o defensor, ao acrescentar que já está apurando essas supostas irregularidades do Executivo. “Quero acabar com essa sangria também. Agora saúde é prioridade”, asseverou.
Segundo Marques, a Lei nº 8080 da Constituição Federal preconiza que a gestão dos recursos da saúde é “única”, ou seja, a fonte de administração no âmbito estadual deve ser a Secretaria de Saúde. “Se o Estado arrecadou esse mês x milhões ele deveria já mandar pra secretaria o que foi planejado no orçamento. Ela que deve pagar suas contas. Porque ela administra, compra, mas não tem o dinheiro para pagar. Tem que ficar pedindo na porta da Sefaz”, explicou.
O membro da Defensoria aponta que o fato dessa gestão do orçamento da saúde ser realizada pela Sefaz contribui bastante para cortes, como o que ocorreu no ano passado e neste ano, de mais de R$ 109 milhões. “Como a Sefaz é uma fonte geral, tem tanto compromisso que às vezes pode chegar a não ter o da saúde. Por isso, que o da saúde é carimbado, por isso que a constituição foi perfeita e inteligente em criar um bloqueio pra esse fundo, porque são situações sérias, importantes. O problema é que quem executa a lei não quer cumprir. Isso termina dando prejuízo direto para o cidadão”, observou.
Para Marques, a irregularidade não passa de uma “estratégia de governo”. Segundo ele, com o dinheiro do Plansaúde o Executivo fazia a mesma coisa. “Tem ação minha para proibir, agora corrigiu essa iniquidade e eles estão repassando para o fundo. Mas antes eles descontavam o dinheiro do servidor e mandavam para Secretaria da Fazenda, para pagar qualquer despesa e não pagava a despesa do plano”, afirmou o advogado, ao acrescentar que o mesmo ocorre com o fundo do Instituto de Gestão Previdenciária do Tocantins (Igeprev).
Questionamento na Justiça
A saúde é uma das áreas que mais sofre judicialização no Tocantins. Diante desse cenário, também são várias as condenações. Apesar de alguns descumprimentos, de acordo com o defensor público, as decisões judiciais vêm sendo executadas pelo Estado. “As ações têm gerado muito resultado e avanço”, avaliou. “Agora, a saúde é muito cíclica. É muita gente, muito contrato, muito item, muito servidor. Então, o que a Defensoria e o Ministério Público tem que fazer é sempre monitorar esses serviços de saúde para que não haja prejuízo para o cidadão”.
Para questionar a ilegalidade da gestão dos recursos da saúde é necessário, entretanto, que o Ministério Público Estadual ingresse na Justiça com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade. “No caso, o doutor Clenan Renaut, que é o procurador-geral, é quem tem a legitimidade para entrar com essa ação”, informou Marques. “Quando a gente tiver essa irregularidade sanada é que a gente vai ver realmente o tanto que o recurso na Sesau faz diferença”, finalizou.
Cortes de R$ 109 milhões
Os decretos Nº 5.612, de 30 de março de 2017; Nº 5.644, de 30 de maio de 2017; Nº 5.683, de 31 de julho de 2017; e Nº 5.743, de 30 de novembro de 2017 contingenciaram, ou seja, reduziram, o valor de cerca de R$ 103 milhões da saúde pública do Tocantins no ano passado. Já o Decreto Nº 5.794, de 28 de março de 2018, subtraiu da área da saúde a soma de R$ 5,9 milhões.
Em atuação conjunta, a Defensoria Pública e Ministério Público Estadual ingressaram com uma Ação Civil Pública na 3ª Vara da Fazenda e Registros Públicos de Palmas no dia 3 deste mês para obrigar o Executivo a devolver recursos contingenciados que totalizam R$ 109.175.157,00. A Lei de Responsabilidade Fiscal (art. 9, §2) veda a redução de verbas constitucionalmente previstas no orçamento, seja da Educação ou da Saúde, que são áreas essenciais.
Na ação, DPE e MPE solicitaram a suspensão dos decretos que contingenciaram os recursos e a antecipação dos efeitos da tutela pretendida, para determinar ao Estado do Tocantins, na pessoa do governador e secretário da Fazenda, a devolução, no prazo de 30 dias, ao orçamento do SUS, o valor de R$ 5.953.998,00 milhões contingenciados no ano de 2018.
Também foi pleiteado que seja determinado às autoridades elencadas que apresentem em juízo, no prazo de 60 dias, um planejamento orçamentário e financeiro de devolução ao orçamento da Saúde Pública, o valor de R$103.221.159,00 milhões contingenciados em 2017.
Os órgãos solicitaram ainda que o Executivo estadual seja proibido de publicar decretos de contingenciamento do orçamento destinado à saúde pública, sem justificar as necessidades de cada política pública e sem observar o art. 9, §2 da LRF.
Em despacho, a juíza Silvana Maria Parfieniuk deu 72 horas para o Estado se manifestar no processo, antes de decidir sobre o pedido liminar.