Depois de meses de provocação, o governador Wanderlei Barbosa (Republicanos) veio a público comentar, nominalmente, as intensas saraivadas contra a sua gestão disparadas pelo senador Irajá (PSD) desde a derrota do parlamentar nas eleições do ano passado, quando amargou um mísero quarto lugar na corrida para o Palácio, com apenas 7,61% dos votos, ou, em número absolutos, com a confiança de irrisórios 63.048 eleitores, num universo de mais de 1 milhão. Para se ter ideia, Irajá obteve menos votos que o deputado federal Antônio Andrade (Republicanos), que conquistou 63.813.
O fracasso eleitoral faz parte da trajetória de qualquer político. Passadas as eleições, o derrotado faz suas reflexões, corrige a rota e retoma a caminhada para ampliar as fatias de seu eleitorado nas disputas seguintes. Isso significa refluir num primeiro momento, recolher-se ao silêncio por meses e às vezes até um ano, para que o vitorioso tenha tempo para mostrar a que veio. Além de que, ao se recusar a descer do palanque, o candidato rejeitado pelo eleitor se revela um mau perdedor.
Irajá não se preocupou nem com uma, nem com outra coisa. Não quis dar tempo para Wanderlei mostrar o que seria seu segundo mandato, até porque o primeiro foi tampão, em meio a um processo de impeachment na Assembleia contra o antecessor, Mauro Carlesse (Agir), já seguido pelas eleições estaduais. O senador também deixa a impressão, a cada ação contra o Palácio, que ainda não conseguiu superar o fato de ter sido cabalmente derrotado nas urnas (diga-se: não por Wanderlei, mas pelo eleitor, que não o quis).
Essa total rejeição popular é evidente pelo fato de ter amargado um resultado que não reflete a grandeza do cargo ocupa na maior Casa Legislativa do país e a sua posição política privilegiada no Tocantins, como também pela votação absurdamente pífia nos principais colégios eleitorais – como a coluna afirmou na avaliação pós-eleição, o candidato a governador do PSD foi simplesmente desconhecido pelos votantes das maiores cidades do Estado.
Enquanto se ocupa diariamente de atacar frontalmente o Palácio, o senador parece ter esquecido de sua base. Ele obteve esplêndido resultado eleitoral em 2020, quando elegeu o terceiro maior número de prefeitos do Estado pelo PSD – com 22, contra 23 do tradicional MDB e 26 do DEM –, mas o que chega agora à coluna é uma constante reclamação de que os “seus” municípios estão deixados à margem. Os prefeitos do PSD, em sua maioria, têm demonstrado uma imensa insatisfação com o partido. Vereadores chiam por nunca terem recebido sequer um “bom dia” do presidente de sua legenda.
Além disso, os prefeitos avaliam que essa gana do parlamentar de se vingar de Wanderlei por ter sido derrotado pelos eleitores os colocam numa saia justa. Afinal, temem que a proximidade com Irajá resulte em problemas de relacionamento com o Palácio. Assim, preveem uma debandada da legenda.
Interessante é que, em sua carreira, desde que chegou à Câmara dos Deputados, em 2011, Irajá nunca foi político dado à oposição ferrenha. Alguns pequenos episódios leves e isolados até o ano passado. Sempre optou pelo pragmatismo e pela discrição no trânsito entre governos estadual e municipais. No último governo Siqueira Campos, quando a mãe, a então senadora Kátia Abreu (PP), rompeu com o Palácio, ele foi exonerado da Secretaria do Desenvolvimento Agrário e Regularização Fundiária e deixou a pasta sem grandes estardalhaços.
Antes de colocar sua pré-candidatura a governador, Irajá chegou a elogiar Wanderlei numa entrevista à Coluna do CT. Na conversa comigo, o parlamentar ressaltou que a relação dos dois vinha de muito tempo, sempre “muito positiva”, “amistosa” e “respeitosa”, que nunca tiveram “nenhuma divergência de ordem política ou pessoal”, e até fizeram faculdade juntos no Ceulp/Ulbra. Então, o senador afirmou textualmente o seguinte:
“Eu procurei ele [Wanderlei, assim que o governador assumiu com o afastamento do antecessor], manifestando apoio ao governo que ele assumiria naquela ocasião, me prontificando a ajudar o Estado. […] Ele [Wanderlei] veio nesses meses trabalhando. A gente precisa também dar a César o que é de César, reconhecendo o seu empenho, a sua dedicação em rodar o Tocantins, em entender os problemas que afligem os tocantinenses e tentando dar respostas as mais rápidas possíveis”.
Assista esse trecho no vídeo, a partir de 6min37s:
Bem, aí, de uma semana para a outra, a gestão do governador passou de “elogiosa” para “nada presta”. Wanderlei deixou de rodar o Estado? Não. Deixou de tentar resolver os problemas o mais rápido possível? O caso da crise da saúde com Palmas mostrou que não. Os casos da onda de violência nas escolas e na Capital também evidenciam que não. Há ação rápida e empenho em resolver, ainda que muitas críticas possam e devam ser feitas. Então, o que mudou?
O senador entra nos últimos quatro anos de seu mandato e terá um desafio hercúleo à frente, que será conseguir a reeleição. Wanderlei continua mantendo um bom índice de popularidade, o que é raríssimo num segundo ano de gestão no Tocantins. Em todos os últimos mandatos, desde o segundo governo Marcelo Miranda (2007-2009), a esta altura do campeonato o principal inquilino do Palácio já enfrentava grave desgaste, que foi se aprofundando e acabou inviabilizando seu protagonismo nas eleições municipais.
A boa aceitação popular de Wanderlei é resultado do bom desempenho da gestão e do fato de o governador ser articulado e conciliador, como mostrou na crise da saúde com a prefeita de Palmas, Cinthia Ribeiro (PSDB), e agora, ao chamar seu maior crítico, Irajá, para uma composição em prol do Estado.
Se não houver surpresas no caminho, Wanderlei tem todas as condições de eleger seu candidato a prefeito de Palmas em 2024 e, assim, quebrar um tabu de 20 anos do Palácio Araguaia; ser protagonista nas disputas municipais e ainda consolidar seu nome para Senado em 2026, com o atual vice Laurez Moreira (PDT) no comando do Estado e, provavelmente, com o senador Eduardo Gomes (PL) ao seu lado.
Com seus ataques meramente rancorosos, que o impedem de olhar para a frente, somada à derrota acachapante de 2022, que não o credencia a liderar a oposição no Estado, Irajá poderá ter que buscar vaga na Assembleia ou na Câmara, caso não queira pôr fim à sua curta carreira política com uma derrota mais que certa ao Senado. Mas ainda há tempo de mudar essa rota já claramente traçada, e a base dessa alteração de curso é deixar o ódio de lado, aceitar o convite do governador e contribuir com a retomada do desenvolvimento do Tocantins que está se iniciando.
Do contrário, o senador ficará cada vez mais isolado. E esse é o caminho mais curto para ser expurgado do cenário político, o que seria uma pena para um jovem, inteligente e promissor representante popular.
CT, Palmas, 14 de junho de 2023.
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