Enfim, com mais de 200 mil eleitores, Palmas poderá ter segundo turno nas eleições municipais do ano que vem, se o primeiro colocado não obtiver 50% votos válidos mais 1. Isso muda totalmente a forma de olhar o processo, do ponto de vista da estratégia. Se até 2020, lançar o máximo de candidatos possível favoreceu quem dominava a máquina, em 2024, não vai resolver, porque os players tendem a se aglutinar no segundo turno, o que vai dificultar em muito a vida do Poder.
A estratégia da pulverização garantiu a reeleição da prefeita Cinthia Ribeiro (PSDB), que enfrentou nada menos do que absurdos 11 concorrentes em 2020. Lembro que no dia da votação um dos candidatos oposicionistas mais bem colocados me ligou dizendo-se certo de que sairia alguma surpresa das urnas. Respondi que não sairia nada diferente da reeleição de Cinthia. Diante da decepção que minha franqueza produziu, expliquei: esse resultado não era fruto da política, mas da matemática.
É isso. Sem segundo turno, o que pesa é a matemática, não a política. Não é o debate de ideias e os perfis que levam o eleitorado de um lado a outro ao longo da campanha para produzir o resultado final. Parte-se do princípio de que quem domina a máquina, apenas por esse fato, conta com cerca de 25% dos votos. Se o candidato governista conseguir fracionar os outros 75%, dificilmente perderá. Além disso, com uma campanha convincente, o “dono”da máquina pode gerar confusão na cabeça do eleitorado, em meio à profusão de concorrentes, e até atrair mais votos, para além dos 25% médios.
Em 2020 foi exatamente isso que ocorreu. Cinthia terminou o processo eleitoral com 36,24%. Pelo fracionamento excessivo da oposição, seus concorrentes mais fortes naufragaram entre 10% e 15% – Júnior Geo (Pros), com 14,52%; Eli Borges (na época do SD), com 13%; e Tiago “Amastha” Andrino (PSB), com 12,31%. Os outros sete candidatos serviram para tirar votos dos mais fortes e facilitar a reeleição de Cinthia – quisessem eles ou não.
Com o segundo turno, essa estratégia não garantiria outro mandato para a prefeita. Se tivéssemos mais de 200 mil eleitores na época, Cinthia teria que enfrentar Júnior Geo numa outra eleição. No caso, a tendência – a depender da habilidade do oposicionista – seria levar os principais nomes da disputa para o palanque do deputado estadual. Em tese, o fato de a prefeita ter ficado com 36,24% dos votos válidos significa que 63,76% dos eleitores que compareceram às urnas não a queriam à frente do governo da Capital. Dá para entender só por esses dois números o tamanho do problema de quem tem a máquina, baixa aprovação e um segundo turno para enfrentar.
Se o governante tem boa aprovação e conta com maciço apoio de líderes, mesmo a pulverização de candidaturas, diante da pouca competitividade da oposição, pode não ser o suficiente para provocar um segundo turno. Isso ocorreu nas duas últimas eleições ordinárias para governador do Tocantins: em 2018, com Mauro Carlesse (na época pelo PHS); e em 2022, com Wanderlei Barbosa (Republicanos).
Em 2024 haverá uma outra diferença em relação a 2020. Teremos segundo turno, mas não um candidato com a máquina do município nas mãos. Pelo menos diretamente, uma vez que Cinthia não poderá disputar outro mandato. Mas haverá duas máquinas públicas concorrendo indiretamente à vaga de prefeito, a da Capital e a do Estado. Ambas muitos fortes. Se estiverem juntas – o que hoje é visto como uma improbabilidade, mas o improvável às vezes se intromete na política –, ganham uma força descomunal.
Se o governador Wanderlei Barbosa (Republicanos) mantiver a boa aceitação popular que exibe neste momento, isso somado ao poder da máquina, fica muito difícil de ser batido, com ou sem aliança com o município. No entanto, o segundo turno tem a beleza de dar uma certa paridade de armas.
E Palmas tem um histórico de oposição ao Palácio, o que é outra variável importante nessa equação. Se os adversários do governo estadual conseguirem estender a disputa para um segundo turno, vão, no mínimo, complicar um pouco mais a vida do governador para quebrar o tabu de 20 anos sem um representante eleito na Capital pela força da máquina estadual.
De toda forma, a possibilidade de termos um segundo turno é, sem dúvida, uma grande conquista democrática.
CT, Palmas, 19 de junho de 2023.