Suas Excelências os Contribuintes,
Os senhores e as senhoras devem ter visto nas páginas da CCT que há municípios tocantinenses entre aqueles com os indícios de crimes de desvio de recursos de emendas parlamentares e convênios por meio de licitações e contratos fraudulentos na área de limpeza urbana. Resultado da Operação Overclean, da Polícia Federal, que tem como alvo principal o empresário José Marcos Moura, o Rei do Lixo. A corrupção, Vossas Excelências, verdadeiros pagadores das emendas — não o Executivo –, é apenas um dos efeitos deletérios dessa excrescência.
Todos sabem como, quixotescamente — admito –, há muitos anos empunho a lança e disparo meu Rocinante contra esses nefastos recursos disponibilizados a vereadores, deputados e senadores. São um câncer para a política brasileira e o grande motivo de a relação entre Executivos e Legislativos hoje beirar as raias da promiscuidade. Presidente, governadores e prefeitos vivem um permanente “ou dá, ou desce”. Se o governo — municipal, estadual e federal — não pagar as emendas, nada anda. Travam tramitações de matérias, a despeito de sua importância para o desenvolvimento do município, do Estado ou do País. Pouco importa. Sem o dinheiro na conta, não se vota.
E qual o sentido disso? Fazer grandes obras estruturantes nos municípios? Garantir a inclusão social de nossa gente sofrida e excluída das benesses usufruídas pelo topo da pirâmide? A desculpa é essa, mas não é a finalidade dessa excrescência.
São dois os motores que impulsionam as emendas: o principal é amarrar prefeitos para a próxima eleição; e o segundo, fazer caixa. Todos, sem exceção, visam o primeiro; quanto ao segundo, dou o benefício da dúvida à maioria, mas essas operações mostram que a corrupção é, sim, parte importante da engrenagem. Há denúncia até de venda de lote de emendas, compradas com gordas comissões para o parlamentar, que passa a atuar como “distribuidor” de seu “cliente”. Esse vai ao prefeito, negocia o valor e, então, manda o deputado despachar o total “vendido” àquele município. A mais absoluta avacalhação dos recursos de Vossas Excelências os Contribuintes.
Para além dos desvios, há muitos outros problemas que tornam as emendas um instrumento antirrepublicano e antidemocrático. Primeiro é preciso dizer que as obras que essa excrescência financia deveriam ser resultado de um planejamento municipal, regional, estadual e nacional, conforme critérios muito técnicos. Não o bel-prazer de prefeitos e parlamentares. Por isso que temos tantas escolas, postos de saúde e hospitais pelo País parados, porque não se tem recursos para a manutenção. Construir é a parte mais fácil, mas é preciso contratar professores, médicos e uma infinidade de profissionais para essas unidades funcionarem. Se fossem erguidas dentro um projeto macro, que considerasse os interesses nacionais, tudo seria planejado, da construção ao operacionalização. Mas o objetivo é único e exclusivamente eleitoreiro.
As emendas asfixiam a necessidade de oxigenação da política brasileira. Isso vale para Congresso, assembleias e câmaras municipais. Vejam, Vossas Excelências, os senhores e as senhoras, destituídos das benesses dos mandatários, como vão concorrer em paridade de armas com quem faz campanha quatro anos com recursos públicos e amarram prefeitos com emendas? Parlamentar tem carro, combustível, hospedagem e alimentação pagos por nós, contribuintes. Cinco ou seis dezenas de assessores e escritórios. Ainda garantem obras a prefeitos com recursos de todos nós como se fossem dinheiro da conta pessoal deles. Como vocês, sem toda essa estrutura, vão conquistar vaga de vereador, deputado ou senador?
É preciso criar mecanismos republicanos e democráticos para que esses recursos cheguem às prefeituras sem passar pelas mãos dos parlamentares. Ou revemos isso, ou nossa política se prostituirá mais e mais, as possibilidades de renovação serão sempre mínimas e o País vai uma hora se dar num beco sem saída. Qual das duas possibilidades acho mais real? Mesmo no meu quixotismo, acredito na segunda. Vamos cair num abismo e só então iniciaremos a mudança, em meio a um sofrimento nacional sem precedentes.
Não vejo espírito público nos Parlamentos para repensar essa situação por iniciativa deles. Como se diz, no Legislativo é só o venha a nós, ao vosso reino, nada. Vivemos o momento mais baixo da República.
Que Deus tenha misericórdia de nós!
Saudações democráticas,
CT