O Brasil precisa discutir a liberação pontual da posse e do porte de armas. Um dos casos que devem ser considerados no debate é o das propriedades rurais. Famílias que vivem em lugares ermos, à mercê de qualquer imprevisto, não podem prescindir de ter a posse de armas para garantir sua segurança. No entanto, é totalmente irresponsável o “liberou geral” que estava sendo proposto pelo decreto do presidente Jair Bolsonaro. Por isso, não há dúvidas de que o Senado mostrou independência e maturidade ao impedir essa absurda insensatez.
[bs-quote quote=”Não há um estudo e uma estatística que comprovem que com armas nas mãos os cidadãos estarão mais seguros e que a violência não vai crescer” style=”default” align=”right” author_name=”CLEBER TOLEDO” author_job=”É jornalista e editor do CT” author_avatar=”https://clebertoledo.com.br/wp-content/uploads/2018/02/CTAdemir60.jpg”][/bs-quote]
Assisti boa parte dos debates entre os senadores e a conclusão é que os argumentos dos governistas para defender o decreto presidencial eram unicamente com base na ideologia bolsonarista de que com uma arma em punho o cidadão não seria mais vítima da bandidagem. É uma defesa rasa, conversa de boteco, instintiva, sem qualquer reflexão ou dados objetivos. Ou seja, características próprias de todas as defesas do bolsonarismo para qualquer matéria. Não há um estudo e uma estatística que comprovem que com armas nas mãos os cidadãos estarão mais seguros e que a violência não vai crescer.
A maior epidemia de violência no Brasil é a doméstica, que tem na mulher a sua principal vítima. Com a flexibilização da posse e porte de armas, ela seria uma vítima ainda mais exposta. Mas não só a mulher. O que teríamos de discussão em boteco e trânsito resolvida à bala não seria brincadeira. Além disso, se mostraria o caminho mais fácil para abastecer a bandidagem com armas.
Um dos argumentos mais rasos é o de que quem mata não é a arma, mas o homem. Justamente aí está o problema. Se juntar um equipamento com capacidade letal com um indivíduo que passará se sentir imortal e o mais valente da Terra com uma arma nas mãos, teremos o efeito nitroglicerina necessário para dizimar vidas e famílias sem precedentes. Encheríamos as cadeias de pessoas boas, mas de cabeça quente.
As dificuldades burocráticas que alegam que haveriam para se conseguir acesso às armas são outra bobagem. Quando falamos de uma pessoa sem ficha policial e com aprovação num exame psicológico estamos nos referindo à grande maioria da população brasileira, formada por gente de bem. Mas isso não significa que uma pessoa com esse histórico irretocável não seria capaz de dar um tiro noutra em situações que não envolveriam necessariamente sua defesa, de sua família ou propriedade.
O que precisamos cobrar dos governos é mais investimentos em segurança pública, melhor preparo dos nossos policiais, combate duro à criminalidade e que se equipe decentemente as forças de segurança. Precisamos de uma legislação mais rigorosa com o crime, redução da maioridade penal para assassinatos e estupros e inibir qualquer possibilidade de impunidade. Praticou crime será duramente punido, sem passar a mão na cabeça. Em casos específicos e gravíssimos, precisamos discutir a prisão perpétua.
Pontualmente, sim, devemos flexibilizar a posse e o porte de armas, mas com base num estudo sério, com dados concretos, por uma lei profundamente debatida no Congresso. Não sou favorável a impedir que a população tenha acesso a armas, mas com regras muito claras e rígidas. Agora, um “liberou geral” para transformar o Brasil num faroeste do século 21 é coisa desses lunáticos que chegaram a Brasília.
Por isso, a vitória no Senado nessa terça-feira, 18, foi do bom senso, uma virtude muito rara em tempos de bolsonarismo e de redes antissociais.
CT, Palmas, 19 de junho de 2019.