É o efeito bumerangue. Marcelo Miranda (MDB) jogou-o ao criar as malfadadas emendas parlamentares no final de 2005, na insana luta contra o siqueirismo, que tinha ao seu lado na época a maioria da bancada federal. Como estava perdendo muitos prefeitos, o então governador inventou esse Frankenstein para estancar a sangria.
O bumerangue passou longe de Carlos Gaguim (DEM), resvalou em Siqueira Campos (DEM), quando houve a infeliz ideia de tornar impositivas as emendas, e, por fim, caiu na cabeça do próprio Marcelo a partir de 2015, quando ele voltou ao governo. O não pagamento das emendas parlamentares — a grande maioria na última gestão do MDB para shows e eventos e agora vemos aí a Operação ONGs de Papel mostrando o custo para o contribuinte — fez o inferno astral do ex-governador durante todo o seu mandato.
[bs-quote quote=”Algum órgão tinha que se movimentar e acabar com esse custeio antecipado de campanha eleitoral, o que, trocando em miúdos, são as emendas parlamentares” style=”default” align=”right” author_name=”CLEBER TOLEDO” author_job=”É jornalista e editor da Coluna do CT” author_avatar=”https://clebertoledo.com.br/wp-content/uploads/2019/07/ct-oficial-60.jpg”][/bs-quote]
Com o Estado no ápice da mais profunda crise fiscal de sua história, cobradores à porta, servidores querendo data-base e progressões, não havia dinheiro suficiente para o boom do custeio. No entanto, lá estavam os deputados fazendo birra, condicionando votos de matérias importantes ao pagamento das emendas — chegaram a deixar vencer a Medida Provisória que dava isenção de ICMS ao diesel do transporte coletivo, o que garantia um custo menor da passagem ao usuário. Mas, afinal, quem são, na fila do pão, os pobres coitados que usam o transporte coletivo perto dos cabos eleitorais mais importantes deles, os prefeitos?
O governador Mauro Carlesse (DEM) assumiu em 2018 e desde então experimenta do próprio veneno, com uma enorme pressão para que pague as emendas. Agora veio essa infeliz ideia do deputado José Roberto (PT) de — pasmem! — considerar o não pagamento das emendas na avaliação das contas do ex-governador Marcelo Miranda.
Se esse verdadeiro legislar em causa própria fincar raízes, chegaremos ao ponto de uma hora termos um governador que garanta o equilíbrio financeiro do Estado, invista em muito em educação, saúde, segurança e infraestrutura, pague corretamente fornecedores e servidores, e ainda assim ter as contas reprovadas simplesmente porque não pagou as emendas eleitoreiras dos deputados. É uma completa e absurda indecência esse condicionamento, que atenta de todas as formas contra o espírito republicano.
Na verdade, alguma instituição deveria ir à Justiça para questionar a impositividade desse lixo legislativo, que são as emendas parlamentares — o que vale para a Câmara de Palmas, onde esse absurdo também ocorreu. O governo não pode porque será triturado em plenário. Então, algum órgão tinha que se movimentar e acabar com esse custeio antecipado de campanha eleitoral, o que, trocando em miúdos, são as emendas parlamentares.
A movimentação de parte dos deputados para condicionar a aprovação das contas de governador ao pagamento dessas malditas emendas é, na verdade, um recado claro a Carlesse e seus sucessores. Do tipo “ou dá, ou desce”.
Os deputados, contudo, precisam entender que estão jogando o bumerangue novamente, como fez Marcelo em 2005, e, lá na frente, esse objeto pode voltar para a cabeça deles. Só para ilustrar: os últimos três presidentes da Assembleia se sentaram à cadeira principal do Palácio Araguaia.
CT, Maringá (PR), 29 de agosto de 2019.