O Palácio Araguaia perde sucessivamente as eleições de Palmas desde 2000. A última vitória do governo do Estado na Capital foi naquelas disputas com Nilmar Ruiz (PL). Depois disso, levou uma taca atrás da outra: três sob o comando de Marcelo Miranda (2004, 2008 e 2016) e uma sob a gestão Siqueira Campos (2012). Pelo interior afora pediram educadamente para o governador não ir às cidades porque atrapalhariam seus candidatos.
Os que ousaram receber o chefe do Executivo tomaram uma derrota. Os aliados palacianos que venceram foram os que conseguiram com muito custo, driblando seus opositores, se desvencilhar do rótulo de “candidato oficial”.
[bs-quote quote=”O governo Mauro Carlesse conseguiu, ainda que não tanto como precisava, dar uma aliviada nas contas públicas e com os dois empréstimos junto à Caixa Econômica, com um total de R$ 538 milhões, poderá produzir um cenário eleitoral muito favorável para si e seus candidatos” style=”default” align=”right” author_name=”CLEBER TOLEDO” author_job=”É jornalista e editor da Coluna do CT” author_avatar=”https://clebertoledo.com.br/wp-content/uploads/2019/09/CT-trabalhado-180.jpeg”][/bs-quote]
É o que sempre ironizei chamando de “maldição do Palácio Araguaia”. Mas não tem nada de maldição, mas de “má gestão”. Porque, na verdade, a possibilidade de o governador ser bem recebido pelos candidatos e de elegê-los é proporcional à capacidade da administração estadual de levar obras e melhorar a qualidade de vida dos munícipes.
Em 2004, a causa da derrota do candidato governista em Palmas, onde as questões estaduais se irradiam mais fortemente, se deveu pelo ápice da crise utista. Siqueira Campos e Marcelo Miranda já haviam saído das eleições estaduais de 2002 em situação de afastamento. Nas eleições municipais, dois anos depois, o então petista Raul Filho, que bateu na trave em 2000, ainda chegou fortalecido pelo bom momento do governo Luiz Inácio Lula da Silva, que assumiu em 2003.
Assim, juntou a fome com a vontade de comer: a União do Tocantins se esfarelava de um lado e, de outro, Raul, que simbolizava a superação do siqueirismo, representava a promessa de prosperidade do petismo.
A candidata Nilmar foi deixada por seus criadores, o ex-governador Siqueira Campos e o então senador Eduardo Siqueira Campos, e tentou se segurar como pôde na disputa com o apoio de Marcelo Miranda e seu pai, Brito Miranda, que viviam no limbo. Não tinham ainda formado o próprio grupo com a robustez que apresentariam a partir de meados de 2005 e eram vistos como intrusos pelo siqueirismo. Claro, o resultado foi a vitória acachapante de Raul.
As eleições de 2006 foram marcadas pela explosão do custeio do Estado: Planos de Cargos, Carreiras e Salários (PCCSs) totalmente fora da realidade, benefícios diversos ao funcionalismo sem qualquer lastro orçamentário e gastança pública absurdamente fora de controle. Tudo para enfrentar o mito Siqueira Campos, que até as vésperas das eleições era visto como imbatível. Marcelo venceu, mas herdou de si mesmo uma gestão com enormes fragilidades.
A partir daí o Estado perdeu a capacidade de investimento, a folha se tornou um monstro voraz que abocanhava todos os recursos canalizados ao erário pelo contribuinte e os fornecedores passaram a ser relegados a um quinto plano.
Os reflexos eleitorais da crise fiscal foram imediatos. Nas eleições municipais de 2008, a oposição liderada pelo senador João Ribeiro fez barba, cabelo e bigode. O parlamentar tocantinense se tornou uma das figuras das mais importantes da República pela proximidade com o então presidente Lula, e, aliado ao então deputado federal Eduardo Gomes, carreou milhões e milhões de reais para os seus municípios. Na época, este colunista ouviu o seguinte desabafo de um prefeito marcelista: “Hoje é melhor ser prefeito do João do que do Palácio. Eles não têm do que reclamar e nós chegamos a assinar três vezes o mesmo convênio e não recebemos um centavo”.
Nas eleições de 2012 não foi diferente. A crise fiscal vinha ganhando mais corpo e atolando ainda mais o Estado. Siqueira era um Tio Patinhas às avessas: ao invés de uma banheira de dinheiro, mergulhava numa piscina de boletos vencidos e benefícios aos servidores não pagos. Foi o que fez com que se declarasse um “gerentão de folha de pagamento”. Como resultado, outra surra nas urnas no Palácio Araguaia, com exceção das localidades em que o candidato oficial conseguiu, a muito custo, esconder o apoio do governo — porque se tornou trunfo dos adversários dizer que o outro era apoiado pelo chefe do Executivo estadual. Foi nessa crise da gestão de Siqueira e nos desgastes de todos os líderes tradicionais que se criou o vácuo que gerou o fenômeno Carlos Amastha (PSB) na Capital.
Em 2014, Marcelo Miranda voltou ao comando de um Palácio numa situação ainda pior do que a que deixara em 2009, ao ser cassado pela primeira vez pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). E, de novo, sem condições de gestão — quase nenhuma margem para investir e arrecadação, ainda que crescente, insuficiente para suprir todo o custo do Estado —, em 2016, o governo do Estado foi duramente derrotado em Palmas e algumas das principais cidades — como sempre, menos naquelas em que acabou sendo esquecido pelos aliados.
Dessa forma, pela primeira vez, desde 2000, o Palácio Araguaia pode chegar às eleições municipais em condições de contribuir com seus aliados. O governo Mauro Carlesse (DEM) conseguiu, ainda que não tanto como precisava, dar uma aliviada nas contas públicas e com os dois empréstimos junto à Caixa Econômica, com um total de R$ 538 milhões, poderá produzir um cenário eleitoral muito favorável para si e seus candidatos. Cada município receberá pouco mais de R$ 1 milhão, que não serão aplicados pelos prefeitos. Eles apresentaram os projetos, mas a execução e, por óbvio, consecutivamente, a paternidade ficarão para o Palácio. Assim, se o prefeito é da base será beneficiado diretamente, se não for, a oposição na cidade é quem acabará com os louros dessas obras.
Com investimentos por todo o Estado, depois de quase duas décadas, o governador poderá, de novo, ser bem-vindo nas cidades e protagonista numa eleição municipal. É só ter habilidade para vencer a burocracia e o atoleiro das licitações, e competência para executar e faturar politicamente.
CT, Palmas, 26 de novembro de 2019.