A médica infectologista Carina Amaral Feriani, de Araguaína, afirmou à Coluna do CT, no quadro Entrevista a Distância, que, embora a população não esteja acreditando muito nos estragos que a Covid-19, o novo coronavírus, pode causar no Estado, os profissionais de saúde estão apreensivos. Segundo ela, para aqueles que estão envolvidos diretamente no combate e com o avanço da ciência e da doença, a chegada do que chamou de “onda” ao Tocantins “é inevitável”.
Escolher quem morre e quem vive
Por isso, a especialista defendeu que o Tocantins “tem que estar realmente preparado”. “Penso assim: é melhor a gente estar preparado e não acontecer nada do que achar que vai estar tudo muito bem e chegar essa avalanche e termos que escolher quem morre e quem vive”, ponderou Feriani.
Vai ser daqui a pouco
Ela avaliou que a “guerra” que o Estado vai travar, como ocorre no mundo todo, não acontecerá agora. “Acho que vai ser um pouco mais tardia [no Tocantins]”, projetou. Para médica, isso é uma vantagem porque dá condições à sociedade tocantinense de se preparar para “o que vem pela frente”. “Diferente de outros locais que foram pegos de surpresa. Pelo distanciamento do Tocantins, pelo fator clima, o que ainda se estuda se tem ou não vantagem; acho que o nosso grande comprometimento vai ser daqui a pouco e a gente tem que estar preparado para isso”, defendeu.
Dinheiro não faz diferença
Feriani ressaltou que é preciso entender que não é o dinheiro que vai fazer diferença. “A gente vê pessoas morrendo nos maiores países do mundo, os mais ricos. Não tem material, não tem respirador, não tem válvula, não tem os aparatos e os aparelhos necessários no mundo para que haja suporte para todo mundo que for adoecer, se mantida essa curva de ascensão geométrica”, disse.
Isolamento social
Como os demais especialistas ouvidos pela Coluna do CT, a médica defendeu o isolamento social para impedir o avanço da Covid-19. “É melhor recuar agora e poder respirar depois, porque, se chegar essa onda aqui, nós não teremos suporte para atender a população, nem aos médicos, nem a ninguém”, avisou. “Se não tivermos as medidas de contenção, dolorosas mas necessárias, nós não vamos ter suporte para cuidar da população. É inviável.”
Contaminação comunitária
A médica foi citada na manifestação do promotor Leonardo Gouveia Olhê Blanck, no processo da Defensoria Pública do Estado contra a flexibilização da quarentena em Araguaína. Ao promotor, a infectologista disse que Araguaína já tem contaminação comunitária e a sua dimensão somente seria possível aferir com eficiente programa de testagem. Na entrevista à Coluna do CT, Feriani confirmou a informação e disse que a testar toda a população em massa é inviável.
Rapidez de transmissão
Ela explicou que estamos lidando com um vírus de uma rapidez de transmissão muito maior do que os demais com que tínhamos lidado. “Muito mais transmissível do que o H1N1, do que o H1N3, do que muitas doenças sobre as quais nós tínhamos conhecimento prévio”, afirmou.
Quem não tem sintoma contamina
Feriani disse que a grande maioria da população contaminada — 80% — não tem sintoma. “Então, a gente está tentando testar as pessoas que estão doentes ou que estão tendo algum tipo de sintomatologia. Só que as pessoas doentes acabam se recluindo, já as que não estão sentindo nada, elas estão circulando”, explicou.
Alienação
A médica lembrou que o Tocantins “transita”, e que “muitos de nós viajaram para outros lugares, parentes viajaram, pessoas chegaram, pessoas foram”. Ela citou que Estado ainda tem uma importante via de tráfego, a BR-153, que corta o Estado fora a fora; e que o agronegócio regional é um dos mais fortes do País, gerando grande movimentação de pessoas. “Então, não tem nenhum lugar do Brasil em que podemos dizer que não é uma transmissão comunitária. Isso é alienação, falta de conhecimento técnico, falta de entendimento”, definiu.
Diferentes sintomas
Um problema que a médica disse que foi constatado é que os sintomas da Covid-19 não só dificuldades respiratórias, tosse, falta de ar. “Existem hoje vários trabalhos mostrando que há diferentes sintomas. Tem relatos numéricos significativos de pessoas que foram encaminhadas ao hospital com dores abdominais absurdas, sem nenhum tipo de doença respiratória. Tem só dor no peito, só dor abdominal, só dor de cabeça e agora foi lançada no meio científico mais uma das manifestações da Covid-19, a encefalite, que é uma alteração cerebral”, contou.
Não é só o grupo de risco
Mais ainda: já está comprovado que a doença não está matando apenas o grupo de risco — idosos, cardiopatas, hipertensos, diabéticos e pessoas com doenças prévias. A médica explicou que esse grupo tem maior índice de agravamento. “Mas agora a gente está vendo muitos casos de pessoas sem doenças conhecidas ou sem relato de doenças prévias e jovens que estão morrendo”, alertou, citando o caso de crianças de 13 e 14 anos como vítimas fatais da Covid-19.
Morrer afogados
Para a infectologista, “nós estamos vulneráveis, muito mesmo”. “E não podemos acreditar cegamente de que, por estar num Estado interiorano, estamos protegidos. Se agirmos dessa maneira, quando a onda de fato chegar aqui, vamos morrer afogados. Porque não vai ter como sair dessa. As proporções numéricas demonstradas não são reais”, disse sobre o baixo número de casos oficialmente confirmados — 13 até essa sexta-feira, 3. “Todos nós envolvidos na nessa questão científica, de conhecimento técnico, inclusive gestores, nós sabemos que isso não é a verdade.”
Assista a médica infectologista Carina Amaral Feriani, no quadro Entrevista a Distância: