Aquilo que chamamos Modernidade é um fenômeno que parece com a urbanidade. Depois do agro é pop, agro é tudo, podemos identificar a modernidade no campo com as super colheitadeiras e escalafobéticas máquinas de plantio e colheita, equipadas por computadores e pilotadas por especialistas. Mas então, chamamos de modernidade o lugar da tecnologia. O lugar onde a tecnologia gradativa e sensivelmente substituiu práticas e saberes tradicionais.
Não podíamos prever como seria a espiritualidade da sociedade de Palmas. Mas não queríamos um lugar de preconceitos e de alienação. Os preconceitos e a alienação são mais adaptados ao clima rural, ao clima do campo, vejam bem: no campo as pessoas mantêm saberes e práticas tradicionais, só isso já as torna mais reativas às mudanças sociais ou à modernidade. Só sua práxis de vida já as determina como conservadoras. Nem sempre o conservadorismo é reacionário.
Estávamos e estamos plantando a modernidade numa antiga fazenda de arroz e pastoreio de gado. Estamos nessa lide. Há trinta e anos e, parece, pelos índices de desenvolvimento, que estamos indo bem, acertamos.
Sim. Acertamos. Mas até que ponto?
Será que acertamos nos costumes e na práxis da modernidade ou estamos apenas maquiados de belas estruturas arquitetônicas monumentais e tecnologia e avenidas estruturais?
Mas era só um bar.
Era a síntese da modernidade da cultura palmense. Quem não teve a oportunidade de frequentar eu lamento profundamente. Conviver com amigos ou desconhecidos no Bar do Colombiano era como dar um mergulho no lago ou visitar um parque de diversões existenciais.
As pessoas mais exóticas e encantadoras e encantadas da cidade baixavam o santo no Bar do Colombiano.
Em que outro lugar público de Palmas era possível conversar sobre filosofia e antropologia entre uma cerveja e um baseado.
No Bar do Colombiano conheci uma índia xerente psicóloga e professora de psicologia na UFT. Pessoa dedicada à pesquisa e ao estudo. Conversamos sobre psiquiatria e antipsiquiatria e não existia outro lugar em Palmas onde poderia ter conhecido e encontrado aquela pessoa rara e singular e mantido aquela conversação científica e filosófica.
Nas mesas do Bar do Colombiano, coabitavam entre mesas, artistas, professores universitários, estudantes, pintores, pedreiros, trabalhadores, escultores, cineastas, intelectuais e amantes da noite. As mesas de bilhar equilibravam os convivas entre populares e gente sofisticada.
Aconteciam performances espontâneas de artistas. Declamações de poesia. Cantorias de músicas. Nunca era possível prever o que aconteceria. Um parque de diversões da existência.
Cadeiras e mesas de plástico. Nenhuma sofisticação na decoração do ambiente. Todavia ali sentavam para molhar a conversa com cerveja, intelectuais artistas e trabalhadores. Um bar sem discriminação de classe social e de ideologias. Um bar libertário.
A verdadeira Palmas e seus mais ilustres habitantes ali sentavam para um encontro premeditado com o inusitado. Todos os dias rolava uma surpresa cômica ou reveladora de um novo saber. Quantos namoros se desenvolveram entre aquelas mesas. Quantas filosóficas discussões.
Aniversários foram festejados. Namoros feitos e desfeitos. Projetos imaginados e elaborados. Descobertas existenciais e grandes e fortes convicções derrubadas.
Quem não conheceu o Bar do Colombiano não conheceu também a face mais criativa, amorosa e libertária da cidade.
Ao fim de sua trajetória várias batidas policiais foram realizadas no ambiente do bar e foi isso mesmo que determinou seu fim. Os frequentadores incomodados com o assédio da repressão abandonaram aquele oceano de vibrações positivas.
Não temos mais aquela praia. Não temos mais aquele mar, aquele rio, aquela ilha encantada onde sempre podíamos colocar nossas vidas em aberto.
Luto para que Palmas não se defina como uma cidade conservadora, reacionária, preconceituosa. E mais. Acredito que essa luta é de todos nós.
ALEXANDRE ACAMPORA
É escritor, documentarista e fotógrafo.
alexandreacampora@gmail.com