Acompanho a política brasileira, como profissional, há mais de 30 anos e sou defensor ferrenho da democracia. Ela está sempre acima de ideologias, partidos e qualquer outro interesse. O campo democrático é o que me permite, como jornalista, expressar minha opinião (o que não deve ser confundido com permissão pregar ódio, fazer apologia a torturadores e pedir a volta da ditadura) e dá condições à sociedade de se desenvolver do ponto de vista social, econômico, cultural e na conquista de direitos humanos.
Assim, você pode ser de centro, direita ou de esquerda. Mas o que define os limites da legitimidade de sua atuação é a democracia, consubstanciada no que está determinado pela Constituição. Por isso que o gigantesco brasileiro Ulysses Guimarães definiu que “traidor da Constituição é traidor da Pátria”.
Significa que não se pode dizer que é patriota e afrontar o Estado Democrático de Direito. Quem o faz é um falso patriota ou um completo idiota que não sabe do que está falando. No caso do bolsonarismo, não tenho dúvida que a imensa maioria é do segundo tipo. Tenho a maior admiração, mesmo que com discordâncias, por personalidades importantes da esquerda e da direita brasileira, como um Roberto Campos, um Ulysses Guimarães, um Cristovam Buarque, um Roberto Freire, um Eduardo Suplicy, um Pedro Simon, etc. Porque eles têm, intelectualmente falando, o que me oferecer. E não vejo um bolsonarista sequer que tenha o que me oferecer intelectualmente. Na verdade, de todos os movimentos políticos que já estudei ou acompanhei, é o mais burro, o mais desqualificado, o mais raso, o mais impatriota e o mais antidemocrático.
O que assistimos em prantos em Brasília nesse domingo, 8, foi uma materialização disso: um gado acéfalo solto num pasto que foi invadindo prédios, pisoteando e destruindo tudo que encontrava pela frente. Um crime contra o patrimônio público, contra a cultura nacional, contra a memória do País, mas, sobretudo, um crime de lesa-pátria.
Os atos terroristas desse domingo devem ser vistos dessa forma, como atos terroristas. Não são mero vandalismo. Não é o moleque que pichou um obra pública, ou virou uma lata de lixo. Não! Foi o uso de práticas do terrorismo para tentar dar um golpe de estado, e fracassaram.
Fundamental agora é identificar os idealizadores e patrocinadores. Os presos nesse domingo foram o gado acéfalo usado para operacionalizar o golpe. Uma gente de pouco cérebro, desqualificada para o debate público, que, claro, precisa ser rigorosamente punida com prisão, multa e tratamento psiquiátrico. Agora, mais que isso, temos que chegar a quem bancou (vários prints semana passada mostravam a convocação de “patriotários” para irem a Brasília com tudo pago: pago por quem?), os idealizadores e os agentes públicos que contribuíram por ação ou omissão.
Aí é preciso mais uma vez cumprimentar o homem que tem sido o grande sustentáculo da nossa democracia, o ministro do STF Alexandre de Moraes, que afastou o governador sócio desses atos terroristas, Ibaneis Rocha; e também parabenizar o presidente Lula, que decretou a intervenção federal na segurança do Distrito Federal.
Não me venham falar em anistia. Me colocarei contra qualquer tentativa de discurso nesse sentido, contra qualquer indício de que querem suavizar as penas. Se não tivéssemos anistiado os torturadores e assassinos da ditadura militar, não estaríamos passando por isso agora. Anistiar significa dizer que os atos terroristas podem se repetir porque a impunidade campeia.
Em outra frente é buscar a extradição do foragido, o ex-presidente Jair Bolsonaro, esse covarde, que deixou tudo armado e correu para os Estados Unidos para criar um álibi. Esse genocida, corajoso só no discurso, é um dos homens públicos mais covardes que já conheci nessas três décadas de profissão. Em 7 de setembro de 2021 chamou de canalha o ministro Alexandre de Moraes. No dia seguinte, correu atrás do ex-presidente Michel Temer, padrinho político do ministro, ligou para Moraes, pediu desculpas e ainda fez uma cartinha de homem indigno que Bolsonaro é.
Jogou os abestados que o seguem a tomar cloroquina e ivermectina, a não usar máscaras e furar qualquer tentativa de isolamento social, mas colocou sua carteira de vacinação em 100 anos de segredo. Por quê? Porque enquanto falava de “vachina”, dizia que a vacina transformaria alguém em jacaré ou transmitiria aids, esse canalha, ele próprio, se vacinou. Não tenho a menor dúvida disso.
Agora, ao perder a eleição, poderia ter tido a dignidade de exercer a liderança e pacificar o país, mas não o fez. Ficou apostando, em silêncio para não ser preso (mais uma vez: um covarde!), num autogolpe de fora para dentro. Ao mesmo tempo que chamava ministro do STF para jantar e desabava em choro como uma menininha que perdeu a boneca, com medo de ser preso.
As digitais desse canalha covarde estão nos atentados terroristas desse domingo. Enquanto eu tiver vida, combaterei esse genocida, responsável direto pela morte de 700 mil pessoas. No dia em que ele for preso (e estou na torcida por isso), vou estourar um champanhe. Bolsonaro precisa ir para o nosso Tribunal de Nuremberg. Esse fascista miserável tem que pagar por seus crimes.
O Brasil ainda deve reconstruir suas instituições, sobretudo as militares. As forças de segurança são as maiores responsáveis por tudo que vem sendo feito pelos fascistas bozolóides que estão nas ruas desde o fim das eleições. São sócias dos atentados terroristas desse domingo, cúmplices do bolsonarismo, dando sempre guarida e se colocando como ameaça maior à democracia.
Uma parte significativa de praças e oficiais das Forças Armadas e Polícias Militares não se considera mais parte de instituições de Estado, mas de governo. São cabos eleitorais fardados da gestão desumana e fracassada de Jair Bolsonaro, ainda que grande parte dessas tropas se mantém no seu papel constitucional, não tenho dúvida disso, e aqui, portanto, não há qualquer generalização, mas a constatação de que os desviados são um número muito significativo.
Se houvesse seriedade e coragem do nosso sistema democrático, não aceitaríamos que homens de segurança ficassem em redes sociais defendendo esse canalha ex-presidente e os atos golpistas dos “patriotários”, como é comum ocorrer. Quantas manifestações de cunho político de policiais são encontrados diariamente por aí? Eles não têm direito de se manifestar politicamente? Não! São homens armados, a serviço do Estado, não de governo. Quer fazer política, deixe a farda. Simples assim.
Sou defensor do fim das policiais militares em todo o Brasil. Precisamos da tropa a serviço da segurança, e sua militarização não é fundamental para isso. A desmilitarização criaria uma outra cultura de relação dessa força de segurança com as instituições e a sociedade, de forma mais democrática e humanista.
As Forças Armadas precisam enquadradas. É um absurdo que as instituições brasileiras aceitem que elas se comportem como quarto poder, colocando a todo instante uma faca no seu pescoço da nossa democracia. Passam a seguinte mensagem subliminar: “Ou atendem nossos desejos, ou acabamos com a democracia”. Isso fica claro nestes momentos de tensão com os bolsofascistas e nas discussões legislativas, como caso da Reforma da Previdência – que eles deveriam pagar mais sim.
Inaceitável que um general diga que não bate continência para o presidente da República. Se houvesse seriedade, teria que ser preso imediatamente. Tem rever o currículo da academia dessa gente, os critérios de promoção (um Pazuello da vida não tem condições de ser general; quando muito cabo, esse incapaz).
Enfim, passou da hora do Brasil fazer esses debates, encarar de frente esses desafios, para que suas instituições democráticas – que nesse período de fascismo bolsonarista mostraram sua força – amadureçam a ponto de nunca mais sequer permitir que ousem ameaçá-las novamente.
Democracia sempre, anistia nunca! Cadeia para o genocida Bolsonaro, para seus terroristas e reforma imediata das Polícias Militares e Forças Armadas!
CT, Palmas, 9 de janeiro de 2022.