Grande parte dos problemas que o Brasil enfrenta hoje para manter sua malha viária se deve à opção errada que fez de modal prioritário no início da segunda metade do século 20. Para favorecer, a indústria automobilística, sobretudo a produção de caminhões, ignoramos os transportes fluvial e ferroviário, que, além de reduzir o custo do País com a conservação de sua infraestrutura asfáltica, garantiriam mais competitividade à produção nacional, porque são mais baratos e desperdiçam menos. Ainda têm a vantagem de serem muito menos poluentes e de oferecerem menor risco à vida humana, com pequena ocorrência de acidentes.
Temos atualmente iniciativas tímidas e lentas de retomada do transporte ferroviário, mas o fluvial, com todo o seu potencial, é impedido por barragens que trancam os rios, porque também não pensamos em eclusas. Enfim, como sempre, a falta de um projeto de nação nos condena a viver em voos de galinhas e causa problemas crônicos, difíceis de serem resolvidos, como o caso do transporte.
No Tocantins, o discurso do deputado estadual José Roberto (PT) em que cogita apresentar uma proposta para aumentar de 0,2% para 1,65% a alíquota do imposto sobre a produção agropecuária dos grandes produtores da soja e outros grãos expõe um gargalo que precisa ser encarado com maturidade pela sociedade, uma vez que a escolha errada de modal prioritário há 60 anos não tem como ser consertado.
Fato é que as rodovias estaduais estavam em situação pra lá de precárias no início do ano, prejudicando a trânsito das pessoas e, sobretudo, o escoamento da produção. O governo do Tocantins está investindo R$ 1 bilhão na recuperação dessa malha viária. Não vai muito tempo para essas mesmas rodovias estarem novamente intransitáveis. Fale-se que o Estado deve controlar o peso dos caminhões, mas, ainda que isso seja feito, esses veículos pesados, mesmo sem abusos, vão continuar deteriorando essas estradas, e muito mais investimento será exigido para a manutenção ou recuperação.
Como fazer?
De um lado, o agronegócio rejeita a proposta de elevar a alíquota; de outro, a população não aceita pagar pedágios – e muitas dessas vias não são sequer interessantes para atrair a iniciativa privada –; e, no meio dessa situação, o Estado não tem condições financeiras para a manutenção dessas rodovias, que consomem imensos volumes de recursos. Outros setores fundamentais para o cidadão também carecem de investimentos – saúde, educação e segurança pública, por exemplo.
É lógico que o Estado não pode desconsiderar a importância de um setor estratégico como agronegócios, e qualquer decisão que seja tomada precisa pensar na competitividade de nossos produtores. No entanto, não é igualmente aceitável jogar a conta, pura e simplesmente para o contribuinte, e se negar a um debate sério, franco, transparente com os números à mesa, para se chegar a um denominador comum, uma solução intermediária, que não inviabilize a produção agropecuária, mas que também não obrigue os cofres estaduais a continuarem sozinhos drenando esse imenso volume de recursos para manter estradas, com tantas demandas que o Tocantins possui.
Dizer que esse debate é meramente eleitoral, também não é verdade. Da mesma forma, poderia ser dito que esse argumento é apenas uma desculpa para não se discutir um assunto que já passou da hora de ir para a mesa, como foi falado acima, de forma séria, franca e transparente.
É com números, planilhas e limites do Estado e da sociedade em mãos que esse tema deve ocupar a agenda pública. Sem revanchismos ideológicos de lado a lado.
Os reais interesses do Tocantins e dos tocantinenses precisam estar acima das rivalidades de grupos e até do mero protecionismo de mercado.
CT, Palmas, 29 de novembro de 2022.