As eleições já estavam definidas na minha cabeça quando vi as convenções. Ali estavam claramente postas as musculaturas de cada campanha, e a do governador Wanderlei Barbosa (Republicanos) impressionou. Não pelo número de pessoas (milhares e milhares) presentes, porque encher evento, para quem governa, é muito fácil. Mas pelo número de prefeitos (91), de vereadores (cerca de mil) e grande parte dos deputados estaduais. Do outro lado, campanhas franzinas.
Para mim, ficou claro desde então que o governo teria uma vitória maiúscula, como se confirmou no domingo, 2. Nunca acreditei num segundo turno. Pelo modelo eleitoral do Estado, baseado na busca pelo apoio de líderes locais “donos dos votos”, era impossível um outro round com aquela configuração de forças que vi nas convenções.
Uma coisa é prefeito ir a solenidade no Palácio. Não existe aí nenhum comprometimento eleitoral, afinal, faz parte da liturgia do cargo comparecer a eventos governistas, seja o chefe municipal de situação ou oposição, para ouvir propostas de políticas públicas ou assinar convênios. Outra coisa bem diferente é prefeito participar de convenção partidária. Sua presença aí não é institucional, demonstra uma clara adesão eleitoral.
Por isso, sempre afirmei neste espaço que o desafio hercúleo da oposição era desidratar essa musculatura governista. Claro que não era nada fácil. A máquina é poderosa, ainda mais quando pilotada por um político habilidoso e carismático como Wanderlei. Concordo em gênero, número e grau com o que disse o candidato a senador Carlos Amastha (PSB), em vídeo de agradecimento após as eleições: “A máquina é bruta”. É, mas precisa saber conduzi-la, e o governador o soube com maestria.
As candidaturas da oposição ficaram amarradas às limitações que a coluna sempre registrou. Houve o tempo todo uma resistência enorme dos líderes a Ronaldo Dimas (PL). Vou revelar um bastidor da campanha sem declinar o nome do “santo”. Coloquei numa edição do “Em Off” que um prefeito anunciou apoio à então candidata a senadora Dorinha Seabra Rezende (UB), mas que ele estava pedindo votos para Dimas.
Essa última informação havia sido passada a mim uns dez dias antes pelo coordenador da campanha do PL, senador Eduardo Gomes. Como esse prefeito e o senador são muito próximos nem me preocupei em confirmar, em meio à correria absurda de uma redação em plena campanha. Não deu cinco minutos da publicação do “Em Off”, esse prefeito me ligou para dizer que estava com Wanderlei e contou: “Falei para o Gomes que se ele fosse o candidato iria para a rua entregar santinho, mas que não entraria numa aventura com o Dimas”.
Quase essas mesmas palavras me foram ditas ao longo da campanha e antes dela por vários prefeitos de todas as regiões do Tocantins. Repito o que afirmei em outras vezes aqui: não tenho dúvida de que Dimas seria um dos maiores governadores da história deste Estado, mas não construiu condições políticas para esta disputa.
Piorou sua situação quando trouxe o presidente Jair Bolsonaro (PL) para seu palanque. Ficou o seguinte cenário: os que tinham antipatia por Bolsonaro retiraram Dimas com opção para governador e os bolsonaristas não reconheciam no ex-prefeito de Araguaína um dos seus. Erro estratégico absurdo, ainda que possa ter sido imposto pelo fato de o candidato pertencer ao partido do presidente.
No caso de Paulo Mourão (PT), o problema foi o mesmo. A campanha toda focada no ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que, como Bolsonaro, desperta amores e ódios. Claro que a candidatura não decolaria, sobretudo porque tinha baixíssima musculatura, quando se avalia o engajamento de líderes.
A candidatura de Irajá (PSD) era sem qualquer nexo e muito amadora. Prometia, por exemplo, “acabar com a pobreza”, algo claramente impossível, irreal e, portanto, vazio. Apesar de pouco mais de 40 prefeitos ao seu lado, eram de cidades muito pequenas em sua maioria e que, por isso, pouco poderiam contribuir para tornar Irajá competitivo, sobretudo pelo fato de que o candidato do PSD é, historicamente, muito pouco votado nos centros maiores.
A votação dele nos cinco maiores colégios mostrou isso. Totalmente pífia. Veja: em Araguaína, um senador da República fez míseros 1.621 votos, ou 1,9%! Em Palmas, com quase 200 mil eleitores, risíveis 3.680, ou ridículos 2,5%! No total, ele teve menos votos (63.084) do que o deputado federal eleito Antônio Andrade (63.813), que concorreu com dezenas de fortes adversários, num contexto de um total de 1.094.003 eleitores.
Em nota, Irajá disse que fará “oposição propositiva e responsável”. O que pode lhe dar respaldo para isso é sua votação de 2018, porque os eleitores simplesmente o desconheceram em 2022. Pelo resultado desse domingo, ele não tem a mínima representatividade do eleitorado tocantinense para liderar a oposição.
No caso do Senado, Kátia Abreu (Progressistas) colheu o que plantou durante 16 anos. Intrigas gratuitas, gritos, xingamentos, etc. É preciso reconhecer que ela vem procurando mudar nos últimos anos, e minha torcida foi sempre por sua evolução, porque, critiquem Kátia como quiserem, mas ninguém pode dizer que não é uma grande líder e uma grande senadora. Um das raros políticos do Tocantins que não se preocupam em ser tão somente um “vereadorzão” em Brasília, que só pensa em emendas para amarrar prefeitos. Ela está presente nos grandes debates do País, é trabalhadeira, articulada, estudiosa e carismática. Não é à toa que se tornou referência nacional.
Porém, nestas eleições retomou os arroubos e ataques desnecessários a adversários, que trouxeram de volta a Kátia que eu mesmo pensava que não existia mais. Por isso, ficar na “geladeira” por uns anos fará muito bem à senadora, um retiro para se repensar e conseguir enxergar o quanto uma “Katinha paz e amor” poderá, com os atributos gigantes que sempre reconheci nela, contribuir para o desenvolvimento do Tocantins.
Enquanto isso, teremos uma substituta à altura. No início da campanha, eu já havia feito uma reflexão sobre a grandeza de Kátia e da professora Dorinha Seabra Rezende. E disse que, com qualquer uma delas no Senado, o Tocantins teria uma grande representante. Dorinha dispõe dos atributos de Kátia, mas com a sensibilidade para o relacionamento humano cordial que falta à sua adversária.
No geral, o Tocantins teve nessas eleições talvez os candidatos mais qualificados da história em busca das vagas de senador e governador. Parabéns, aos que venceram e também aos que não conseguiram chegar lá, pelo alto nível das campanhas.
Nesta quarta-feira, 5, comemoramos 34 anos como Estado, com as contas públicas, enfim, reenquadradas à Lei de Responsabilidade Fiscal, depois de uns 15 anos de abusos e irresponsabilidade. Que estas eleições de elevado nível e esta conquista fiscal sejam o prenúncio de dias melhores para nosso Tocantins, que amamos, queremos grande e desenvolvido.
CT, Palmas, 4 de outubro de 2022.