Quem aqui defende a tese de que a Prefeitura de Palmas precisa voltar a investir no carnaval de rua é alguém que não é folião. Esses quatro dias de festa, eu, um ermitão, tiro para me recolher ainda mais. Leio muito, pratico esportes, caminho com meus cachorros e mergulho nesse lago maravilhoso que temos à nossa porta. Não sou religioso, então, fujo também de retiros espirituais. Mas respeito quem goste de um e de outro.
Contudo, reconheço que é simplesmente um absurdo a Capital, com tantas belezas e atrativos, não investir num evento que encheria restaurantes, lanchonetes, hotéis e o comércio em geral, movimentando de forma significativa a economia.
Questões de segurança e os possíveis abusos de álcool e drogas são os principais motivos que sempre trazem a público como justificativa para ignorar as vantagens econômicas do carnaval e também para negar o direito de todos os cidadãos pagadores de impostos de se divertir. Se esse fosse o empecilho real, Rio e São Paulo não realizariam as festas gigantes que atraem multidões de todo o País e do mundo.
O que esses eventos de massa precisam é de muito efetivo policial e de um trabalho de inteligência para se antecipar a possíveis ocorrências. Agora, deixar de realizar o carnaval pelo risco de segurança é um argumento raso, que poderia ser aplicado a jogos de futebol, ao desfile de Sete de Setembro ou a qualquer outro que movimentasse público. Por isso, na verdade, o pano de fundo desse debate não são a violência ou as drogas, mas sim a religião de alguns, que querem impor ao conjunto da sociedade.
O argumento da segurança desliza na esteira do neo-farisaísmo que domina Palmas desde o governo Carlos Amastha (PSB) e ainda campeia na gestão Cinthia Ribeiro (PSDB). Como se vivêssemos numa teocracia talibã em que as diversões permitidas são somente aquelas estabelecidas pelo livro sagrado, que, no caso do Brasil, não é referência para todos, muito menos está acima da Constituição e dos regramentos legais do Estado e do município.
Vivemos num estado laico e, por isso, as políticas públicas não devem jamais ser pautadas pelos dogmas religiosos. Excluir a maioria significativa da população do carnaval por conta da fé de parte dela é, antes de tudo, inconstitucional.
Para além da questão legal, as duas coisas não são excludentes. O município pode investir na realização de eventos cristãos nos quatro dias de festa e também nos bailes populares e desfiles de rua. Cinthia, como também o foi Amastha, não se elegeu rabina, pastora, freira, monja, nem líder talibã. Mas prefeita de um país democrático e, de novo, laico, para administrar para todos, não para membros de uma denominação cristã.
Enquanto Palmas insiste na política do neo-farisaismo (o grupo que Jesus definiu como “sepulcros caiados” – por fora pintadinhos e bonitinhos, mas por dentro tudo quanto é podridão), Gurupi, Porto Nacional, Miracema e Dianópolis enchem seus hotéis, movimentam sua economia, geram empregos e renda.
A Capital ressente dos tradicionais carnavais que haviam nos governos Nilmar Ruiz, Raul Filho e dos outros prefeitos que passaram antes do “estado talibã” se instalar por aqui.
Temo que daqui a pouco as mulheres sejam enfiadas em burcas. Taí um bom tema para um carnaval de rua, assim que a maior festa do ano deixar de ser reprimida pelas atuais “leis” teocráticas do governo de plantão.
Afinal, mandatos — e aí está a grande diferença do sistema brasileiro para as teocracias talibãs — passam. Outros tempos virão.
CT, Palmas, 23 de janeiro de 2023.