O Estado entrou no último capítulo de sua Reforma da Previdência com o envio à Assembleia do Projeto de Lei Complementar (PLC 03 de 2023) e da Proposta de Emenda à Constituição (PEC 3 de 2023). Era para ter sido aprovada no final do ano passado, mas o governador Wanderlei Barbosa (Republicanos) atendeu pedido de deputados estaduais e sindicatos para debater mais profundamente a proposta. Decisão de bom senso. Todos os segmentos foram ouvidos, ajustado aquilo que podia, flexibilizado o que era possível, mas fato é que nunca uma reforma dessa magnitude, que mexe com tantas categorias diferentes, interesses diversos, necessidades peculiares a uma imensidão de atividades, atingirá o consenso. Ninguém quer ceder. Todo mundo só preocupado com o seu pirão.
Claro que o Estado sempre que possível deve aliviar ao máximo o sacrifício exigido dos servidores, facilitando no que for possível as regras de tempo de contribuição e aposentadoria. Contudo, não pode perder de vista a realidade crua e cruel dos números, sob o risco de ver as contas fora do controle, o que criará dificuldades para si e para aquele que mais precisará da Previdência, o próprio funcionalismo. Esse é o termômetro mais exato para se avaliar a medida certa de qualquer proposta de Reforma da Previdência em qualquer lugar.
No que diz respeito ao Instituto de Previdência do Estado (Igeprev), seu fundo foi covardemente dilapidado por malandros do mercado financeiro por volta de 2013. O escândalo dos investimentos de risco feitos na época tirou-lhe mais de R$ 1 bilhão, um total desleixo administrativo de quem comandava o Tocantins no período.
Além disso, a massa de servidores, como ocorre com a população em geral, está envelhecendo. Isso somado à dificuldade do Estado de realizar concursos contribui para promover um desequilíbrio financeiro. Muita gente se aposentando e muito menos ingressando no serviço público significa menos contribuições para o fundo que saques em forma de aposentadorias e pensões. Como se vê, a conta não fecha.
Para se ter uma ideia disso, em maio de 2021, o pleno do Tribunal de Contas do Estado (TCE-TO) determinou uma auditoria operacional no Igeprev, a pedido da conselheira Doris de Miranda Coutinho, da 5ª Relatoria. Ela questionou o sistema implantado também no trágico ano de 2013, chamado de segregação de massas, que é a divisão dos segurados vinculados ao Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) em dois grupos distintos nos planos: financeiro e previdenciário. Acontece que a conselheira apontou que houve um desequilíbrio no instituto após esta mudança. Segundo ela, o Igeprev registrou uma redução de 75% da receita do plano previdenciário entre 2016 e 2020, enquanto a despesa cresceu 688,81%. O mesmo cenário, observou Doris, ocorreu no plano financeiro. “Observa-se que a partir do 2018 as despesas [previdenciárias] ultrapassaram as receitas arrecadadas, demonstrando um regime deficitário com reflexo no plano financeiro que já era deficitário desde o exercício de 2016”, anotou a conselheira.
Assim, um instituto de Previdência novo em relação aos demais do País, mas muito mal administrado ao longo do tempo obriga o Estado a já ter que fazer aportes no órgão para cobrir o déficit da folha de servidores aposentados e pensionistas. Isso foi confirmado pelo próprio presidente Sharlles Fernando Bezerra Lima à Coluna do CT em julho de 2021.
E o que o servidor tem a ver com isso? Nada e tudo ao mesmo tempo. Nada porque a culpa da má gestão do instituto no passado é de quem passou por sua administração. O responsável pelos desfalques no Igeprev é de quem estava à frente do governo e da entidade na época, direta ou indiretamente, por ação ou omissão. Porém, as consequências da má gestão recaem diretamente sobre o servidor agora e também no futuro, quando a fila andar e sua hora de se aposentar chegar. Neste momento porque exige o aumento da contribuição individual, que já passou de 11% para 14%. Mais à frente pela necessidade de ter que trabalhar por mais tempo para garantir uma contribuição adicional.
A questão da Reforma da Previdência, a despeito dos gritos histéricos, hipócritas e demagogos que se ouve, é justamente assegurar que o servidor não tenha uma surpresa desagradável. Ou seja, que quando chegar seu momento de descansar, haja recursos para ele gozar da merecida aposentadoria. E essa segurança precisa ser consolidada hoje, não quando ele completar o tempo necessário. Lá na frente será tarde.
De outro lado, também é um absurdo passar a conta das aposentadorias e pensões para a sociedade. É o que ocorre quando o sistema é deficitário. O governo tira dinheiro dos impostos para cobrir a conta – é um recurso que sai do investimento no cidadão (seja em saúde, educação, infraestrutura ou qualquer outra área) para garantir um direito, sim, mas que deveria vir da própria folha, que o contribuinte já paga todo mês aos servidores. É a sociedade pagando duas vezes para a mesma finalidade. Não é justo, nem aceitável. É um completo absurdo.
Por isso, o servidor precisa estar atento neste momento aos discursos fáceis, dos que gostam de jogar para plateia, a despeito das consequências, pensando tão somente nas próximas eleições sindicais, municipais e estaduais. Quem não pensa com números a curto, a médio e longo prazos, não está preocupado com os servidores, mas apenas em fazer média com um discurso fácil, demagogo e absurdamente irresponsável com o funcionalismo e com o Estado.
Depois, quando a aposentadoria chegar e não houver recursos para pagamento, nenhum desses será encontrado para se responsabilizar. Aliás, como os malandros que desfalcaram o Igeprev em 2013.
CT, Palmas, 6 de dezembro de 2023.