A flexibilização do discurso moralizador dos candidatos da oposição é baseada na necessidade de conseguir capilaridade, maior tempo de TV e mais recursos para a campanha, via fundo eleitoral. O mais importante é alcançar os líderes do interior profundo do Tocantins, que são quem consegue movimentar os votos de um lado a outro, como a coluna mostrou logo após o segundo turno da eleição suplementar.
A televisão faz mais diferença nas principais cidades do Estado, onde a oposição já tem mais força, e todos os candidatos, até mesmo o oficial, conseguem excelentes votações. Assim, quem define o resultado das eleições é mesmo o interior do Estado, local em que os programas de TV têm um peso bem menor e em boa parte das cidades sequer chega o sinal das emissoras tocantinenses. Além disso, a audiência dos programas eleitorais vem caindo abruptamente na mesma medida que a aumenta a desmoralização da política. Ou seja, a população não acredita mais em palavra de políticos e não suporta mais sequer ouvi-los.
É neste contexto que os caciques interioranos se tornam fundamentais nas eleições. Percebendo isso, a oposição abriu mão de seu discurso moralizador, de que não se mistura “com essa gentalha”, como diria a mãe do Quico, no programa do Chaves, e resolveu cantar à la Lindomar Castilho: “Nós somos dois sem vergonhas”.
[bs-quote quote=”O eleitor de Amastha e Márlon acreditou num novo projeto político, sem a mácula da velha política, sem oligarquias e familiocracia. Pois é tudo isso que os dois passaram a representar neste momento” style=”default” align=”right” author_name=”CLEBER TOLEDO” author_job=”É jornalista e editor do CT” author_avatar=”https://clebertoledo.com.br/wp-content/uploads/2018/02/CTAdemir60.jpg”][/bs-quote]
O problema é que este colunista não vê como isso vai funcionar. Pelo que parece, continuando na linha das frases do populacho, a “velha política” está “vendendo a mãe” para Carlos Amastha (PSB) e Márlon Reis (Rede) e não vai dar conta de entregá-la. No caso do pessebista, importantes lideranças do PSDB, PR e MDB já têm dito que não seguirão os caciques. O candidato do PSB conseguiu cristalizar uma ojeriza tal diante desses prefeitos, vereadores e outros, que, mesmo sendo eles fieis a Ataídes Oliveira (PSDB), Vicentinho Alves (PR) e Marcelo Miranda (MDB), não os acompanharão nesta decisão. Além da antipatia pessoal por Amastha, enxergam uma parceria com o governador Mauro Carlesse (PHS) como muito mais interessante, seja pela contribuição com as suas administrações ou até mesmo pela “força de atração” da máquina do Estado.
Como a coluna afirmou nessa quarta-feira, 8, a atitude intempestiva de Amastha de desistir da candidatura e refluir, só aumentou a indisposição desses líderes em apoiá-lo, como ainda dificultou até que Ataídes, Vicentinho e Marcelo — que anda quietinho sobre esse apoio — peçam algo em favor do ex-prefeito de Palmas.
No caso de Márlon, a situação também é difícil. Buscou no grupo da senadora Kátia Abreu (PDT) e no PT a capilaridade que acredita que eles têm para lhe dar musculatura eleitoral. Mas não é bem assim. Os votos dos petistas estão cada vez mais minguados. Além da crise moral no plano nacional, o diretório do Tocantins cometeu erros estratégicos crassos ao longo do tempo que só fizeram a votação da legenda encolher. Para se ter ideia, nas eleições municipais, o PT chegou a fazer 96.532 votos em 2004, elegendo 16 prefeitos, mas, com os erros a partir daí, obteve em 2016 míseros 3.185 votos, fazendo somente dois prefeitos, de cidades sem qualquer expressão estadual — Couto Magalhães e São Sebastião do Tocantins. Dos novos aliados do candidato da Rede, o que mais pode lhe ajudar é o PV, que tem um perfil político parecido e obteve excelente resultado nas eleições de 2016. Ainda, claro, que Márlon tenha que explicar a inelegibilidade do ex-deputado estadual Marcelo Lelis, com base justamente na Ficha Limpa, da qual o candidato da Rede é um dos idealizadores.
Se Kátia tivesse condições dar votação expressiva a alguém daria a ela mesma na suplementar, que, com certeza, foi seu maior fiasco eleitoral. Em cidades em que já até fez prefeito no passado, como Guaraí, ficou em quinto lugar com invisíveis 397 votos. No município que foi seu berço político, Gurupi, foi a quarta colocada, com apenas 2.108 votos. O total fracasso foi repetido em Palmas (4ª colocada), Araguaína (5ª colocada), Porto Nacional (4ª colocada), Paraíso (5ª colocada), e por aí vai. Onde foi bem, no Bico do Papagaio, a base no segundo turno se deslocou quase toda para o palanque de Carlesse. Com ela fora da disputa, deve se repetir com Márlon o que vai ser comum na campanha de Amastha: esses líderes vão apoiar os senadores deles, mas, para governador, devem ficar com o atual inquilino do Palácio Araguaia. Isto é, ficam com o candidato a senador e filho de Kátia, Irajá Abreu, mas não pedem voto para Márlon Reis.
Aí vem outro ponto interessante, o da matemática ilógica. Funciona assim: pega-se as votações da suplementar e soma-se, concluindo, num simplismo tosco, que o resultado representará o que obterá o candidato de hoje em outubro. Dessa forma, o candidato do PSB adicionaria os votos de Vicentinho no primeiro turno da suplementar aos seus, o que daria 43,63% dos válidos. Márlon soma seus votos com o da Kátia, obtendo 25,57%. Então, a eleição já está decidida: Amastha já pode pôr a faixa de governador, com Carlesse em segundo (30,31%) e Márlon em terceiro. Não tem qualquer sentido.
O contexto em que as duas eleições ocorrem é totalmente diferente. Carlesse, por exemplo, vem de um resultado surpreendente do segundo turno com votos de todos os candidatos derrotados no primeiro turno da suplementar, como os números deixaram claro. Essa votação voltará para Márlon e Amastha? Agora haverá o engajamento dos candidatos a senador, deputado federal e estadual. Isso por si só embaralha totalmente as cartas. Por fim, a margem de transferência de votos é mínima. Não é porque alguém que votou em Kátia na suplementar que agora, automaticamente, votará em Márlon. Ou que o eleitor do Vicentinho cegamente dará seu voto em Amastha.
Além de não conseguirem a capilaridade no grau que esperam ter, os candidatos de oposição perderão eleitores para o “não voto”— abstenções, branco e nulo. O eleitor de Amastha e Márlon acreditou num novo projeto político, sem a mácula da “velha política”, sem oligarquias e familiocracia. Pois é tudo isso que os dois passaram a representar neste momento. Por que esses eleitores indignados com a política manterão seu apoio a eles, se agora são vistos como mais do mesmo?
Os dois não deveriam ter dado as costas para o seu eleitorado. Ao invés de buscar capilaridade naqueles que sempre representaram o que seus eleitores rejeitavam, teriam que investir em atrair o “não voto”, que no primeiro turno da suplementar representou 443.414 pessoas. Amastha e Márlon deveriam ter estudado esse grupo para saber o que queria e como deveriam se apresentar a ele para convencê-lo de que valia a pena ir às urnas e confiar.
Contudo, ao invés disso, preferiram copiar os de sempre, seguindo o conselho da frase atribuída ao presidente americano George Washington: “Se não pode com o inimigo, junte-se a ele”.
CT, Palmas, 9 de agosto de 2018