Se o cenário de 2022 estava difícil de interpretar, com o ingresso da prefeita de Palmas, Cinthia Ribeiro (PSDB), na base do Palácio Araguaia, ficou ainda mais enigmático. Semana passada, o governador Mauro Carlesse, em meio à crise da tucana com a Câmara da Capital, a convidou para se filiar com ele no PSL.
O convite, em si, já foi algo muito inusitado, uma vez que a prefeita é presidente regional do PSDB e nunca foi uma aliada do Palácio. Ao contrário. Trombaram-se em diversos momentos e Cinthia reclamava de que pouco nessa crise da Covid-19 havia conseguido conversar com o governador ou ter seus ofícios respondidos. O primeiro encontro dos dois só ocorreu mês passado, um ano depois do início da pandemia.
Assim, o convite pareceu ter sido uma iniciativa infrutífera de Carlesse. Até a manhã desta terça-feira, 13, data da filiação do governador, quando surgiu a grande novidade política do mês, o ingresso no PSL do secretário das Finanças de Palmas, Rogério Ramos, um dos homens fortes de Cinthia e que deixa a presidência regional do Patriota, assumida por ele ano passado.
Três teses circulam na praça para explicar o porquê Cintha se aliou a Carlesse:
1) O Paço teria visto digital do senador Eduardo Gomes (MDB) na suposta manobra para cassar a prefeita Cinthia. Assim, a vaga dela ficaria com o irmão dele, o vice-prefeito André Gomes (Avante).
Gomes chegou a ir para a imprensa semana passada chamar essa conversa de fake news e desmentir qualquer tentativa de manobrar os vereadores para tirar o mandato da prefeita. Bom que se frise que o senador tem sido o maior aliado na gestão, como o foi da reeleição da prefeita. A ponto de poder ser dito que, sem ele, Cinthia não teria conseguido formar a frente da campanha vitoriosa de novembro. Para agora, quatro meses após a posse, sorrateiramente, tomar-lhe o mandato?
Acompanho a carreira de Gomes há quase vinte anos e nunca soube dele chutando porta de partido ou agindo dessa forma traiçoeira – e olha que não lhe faltou oportunidade, como na época em que a velha União do Tocantins estava totalmente fragilizada.
2) Carlesse teria colocado como condição para segurar os vereadores sobre os quais têm influência que Cinthia ingressasse em seu grupo. Assim, não haveria comissão processante e ela continuaria no mandato.
3) Outra tese que circula é que a própria prefeita, sentindo-se traída e fragilizada na Câmara, teria procurado a proteção de Carlesse contra um possível movimento para tirar-lhe o mandato.
As três alternativas acima partem do princípio de que Cinthia tem alguma culpa no cartório. Ela está sendo acusada pela oposição de superfaturar na compra de medicamentos de combate à Covid-19. Foram feitas denúncias no Tribunal de Contas do Estado e na Polícia Federal.
O secretário Rogério Ramos, questionado sobre o assunto no programa Quadrilátero desta semana, mostrou tranquilidade, garantiu que tudo é feito corretamente na Saúde e que a prefeitura tem como justificar todos os gastos. Se é assim, será verdade que a prefeita foi acuada a este ponto – de ser obrigada a se aliar ou de ter corrido atrás de proteção – por nada? Tão somente pela possibilidade de lhe faltar apoio na Câmara?
Apesar das insatisfações com Cinthia – alegam falta de cumprimento de acordos -, os vereadores governistas têm votado firmes com a prefeita e a oposição até vem reclamando do excesso de lealdade em plenário.
Agora, se o ingresso dela na base palaciana foi com o aval de Gomes, isso mostra que o senador caminhará com o grupo de Carlesse em 2022? Se sim, de que forma? Carlesse não renuncia, Wanderlei Barbosa não assume e todo mundo apoia Gomes para governador? Ou o senador não será candidato e apoiará Wanderlei para o Palácio e Carlesse ao Senado?
A despeito de teorias da conspiração, articulações suspeitas, manobras de bastidores, o fato é que a aproximação de Cinthia de Carlesse tornou o cenário do ano que vem ainda mais nebuloso.
Só o tempo vai revelar o que está ocorrendo.
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Post Scriptum
Órfãos da Covid – A Comissão Externa para o Enfrentamento da Pandemia da Câmara dos Deputados fez audiência pública nesta terça-feira sobre o tema “Órfãos da Covid”. São pelo menos 45 mil crianças e adolescentes que, no cálculo do Ipea, perderam pai e mãe na pandemia, muitas delas vivendo em extrema dificuldade e sem contar com nenhuma ajuda do Estado — financeira ou psicológica.
“Doidamares” – O ex-ministro do Meio Ambiente Carlos Minc, em seu perfil no Twitter, deu um apelido à ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves: “Doidamares”. Ele cobrou dela manifestação sobre o assassinato covarde do menino Henry, de 4 anos, cujo suspeito é o vereador carioca Dr. Jairinho, como Damares, bolsonarista e evangélico.
Há fome em Palmas – Excelente a iniciativa da prefeita Cinthia de lançar um pacote social para famílias em situação de vulnerabilidade impactadas pela pandemia, com auxílio emergencial e cestas básicas. Tem muita gente passando fome em Palmas, e isso é inaceitável!
Livros para todos – Tributar livros, como propõe o governo Jair Bolsonaro, sob o argumento (falso, diga-se) de que só rico lê, é totalmente absurdo, própria de gente de mentalidade medieval, que tem horror ao estudo e ao conhecimento. É querer manter a grande massa do País excluída do privilégio que é ler. Precisamos de políticas que incentivem a leitura, não impedir o acesso das pessoas ao livro. Esses são sinais dos tempos obscuros que vivemos.
CT, Palmas, 13 de abril de 2021.