Os principais focos de preocupação do Estado com a pandemia da Covid-19 são Araguaína e o Bico do Papagaio. Ambos estão fora de controle. Os números não deixam a menor dúvida quanto a isso. As duas localidades dão pequenos lapsos de respiro, mas os novos casos voltam sempre a fustigar com força. Num dia Araguaína sente um alívio com queda brusca de confirmações, mas 24 horas depois retorna aos três dígitos. Um paciente que inspira muitos cuidados.
No Bico não é diferente. Vinha nos últimos dias crescendo com uma variação baixa e, de repente, deu um pico nessas últimas 24 horas, com 31 casos em Xambioá, 22 em Sítio Novo e 15 em Aguiarnópolis. Para se ter uma ideia da dimensão da pandemia por lá, um paralelo, meio grosso modo com Palmas: essas três cidades do extremo norte, juntas, confirmaram 68 casos do novo coronavírus nesta terça-feira, 9, conforme o Boletim Epidemiológico da Secretaria Estadual da Saúde. A população delas, somadas, dá 26.034 habitantes. Palmas, com 300 mil moradores, ou seja, uma quantidade de pessoas 11,5 vezes maior, registrou no mesmo período de tempo 29 positivações para a Covid-19.
Bico do Papagaio (1.405) e Araguaína (2.512) acumulam 3.917 casos da doença nesta última edição do boletim, o que equivale a 64,7% dos 6.052 casos registrados em todos os 100 municípios tocantinenses já alcançados pelo novo coronavírus. A proporção dessas duas localidades sobre o número total vem crescendo ao longo do tempo: em 10 de maio representava 54,2%; em 20 de maio, 58,9%; no dia 1º de junho, 63,3%; e agora está nesses 64,7%.
No número de mortes, Araguaína tem 26 vítimas e o Bico, 37, somando 63 vidas perdidas, o que equivale a 55,3% dos 114 óbitos já confirmados no Estado. O centro do Tocantins, encabeçado pela Capital, tem 26 (22,8%); e o sul, 10 (8,8%). Em Araguatins, a doença matou 14 pessoas, a segunda cidade com mais baixas nessa guerra contra o vírus, o que dá uma taxa de letalidade de 12,4%, enquanto a de Palmas é de 1,1% e do Estado, 1,9%.
Algo está muito errado, portanto, em Araguaína e no Bico, e passa longe da justificativa de falta de testagem nas demais regiões e da necessidade de mais leitos clínicos e de UTIs, ainda que sejam importantíssimos e o Estado precisa urgentemente acelerar esse processo de aumento da estrutura de atendimento por lá. Mas os mortos e a ocupação de UTIs não dependem de exames. A doença evolui e o paciente precisa ser entubado e falece, com teste ou sem testes.
O fato é que esses dois epicentros tocantinenses da pandemia devem mesmo é fazer um rígido isolamento social. Se os prefeitos não agirem duramente nesse sentido e se a população local não contribuir, não haverá estrutura hospitalar para dar conta do crescimento da demanda. Visto sob esse prisma é ainda mais totalmente sem qualquer lógica a flexibilização na economia de Araguaína, como também a revogação do lockdown lá e em todo o Bico pelo governo do Tocantins.
Os prefeitos e o Palácio Araguaia têm que elaborar, com urgência, um plano de contenção, absolutamente rigoroso, para fechar o norte do Estado a partir, pelo menos, de Colinas, com ações policiais — se necessário, com apoio da Força Nacional de Segurança —, assistência social ainda mais extensa a famílias carentes, para que possam ficar em quarentena total, e interrupção do fluxo de pessoas com Pará e Maranhão.
Sempre é importante repetir: o vírus não se movimenta. São as pessoas que o levam e o trazem e, assim, provocam a disseminação da Covid-19. Dessa forma, se aumentar a estrutura hospitalar, mas não se promover rígido isolamento social, não será possível controlar a pandemia tanto em Araguaína quanto no Bico. Podem levar quantos hospitais de campanha quiserem para as duas localidades.
Paralelamente, a preocupação do Estado também se volta para Palmas, onde a evolução é estável, mas a flexibilização das atividades econômicas a partir desta semana virou um fantasma que ronda e gera suspense. A cidade vive um clima de normalidade, que pode complicar essa equação já difícil de resolver com a falta de isolamento no norte do Tocantins.
Com a situação sob controle na Capital, a estrutura hospitalar local está sendo usada para dar apoio a outras regiões e até para outros Estados, o que levou o Palácio Araguaia a requisitar administrativamente leitos de UTI da rede particular.
Se Palmas também perder o controle a doença, como Araguaína e o Bico, a situação do Estado pode se complicar absurdamente e o colapso do sistema de saúde será inevitável. Lembro daquele estudo de quatro universidades federais que mostrou que a capital do Tocantins tem uma estrutura muito pequena e, portanto, muito fácil de implodir.
Todas essas reflexões só reforçam o quanto as decisões de Palmas e Araguaína de reabrir o comércio foram totalmente erradas, absurdas e inoportunas.
Que estejamos, todos nós os chatos, errados. É minha torcida. De coração.
Palmas, 9 de junho de 2020.