Há uma expectativa funesta para o país e o mundo com essa onda do coronavírus. As projeções de crescimento do PIB despencam e, se o futuro é algo sempre incerto, a nebulosidade aumenta agora com a incógnita que esse novo vírus representa. É um fantasma que ronda o planeta e ninguém sabe quem, quantos e onde ele vai atacar. No entanto, no Tocantins, nós assistimos embasbacados nesta semana uma disputa quase infantil sobre onde serão estacionados os 428 ônibus escolares que o Estado está comprando com recursos federais destinados pelos nossos congressistas.
Ainda vimos a uma virada, totalmente inesperada, na definição do novo coordenador da bancada do Estado no Congresso Nacional. Há poucas semanas, a maioria dos parlamentares virava a cara quando este colunista perguntava sobre a possibilidade de a senadora Kátia Abreu (Progressistas) ficar com a função. Contudo, para contrariar o Palácio Araguaia, resolveram indicá-la como coordenadora. Kátia é uma senadora inteligente, articulada, destemida para os debates, mesmo aqueles que todos evitam, e extremamente influente na política nacional.
[bs-quote quote=”Evitar destinar recursos para o Palácio para encaminhá-los somente aos municípios, como apregoam os descontentes com o governador Mauro Carlesse, é ignorar essa dependência que a população tem dos serviços do Estado ” style=”default” align=”right” author_name=”CLEBER TOLEDO” author_job=”É jornalista e editor da Coluna do CT” author_avatar=”https://clebertoledo.com.br/wp-content/uploads/2019/09/CT-trabalhado-180.jpeg”][/bs-quote]
No entanto, considerando que a função mais importante do coordenador de bancada é articular a liberação de recursos federais para o Estado nos ministérios, será que ela era o melhor nome neste momento em que é crítica contumaz ao presidente Jair Bolsonaro? — e considero que todas as críticas que a vi fazendo até agora são altamente pertinentes e assino embaixo cada uma delas. Mas, vinda de uma coordenadora de bancada, elas não poderão prejudicar o desempenho dessas funções?
O Tocantins vive de mesada do governo federal. Isso poderia ser dito de modo eufemístico, claro. Mas a realidade dura e crua é essa. Vejam só: quase 60% (!) do custeio do Estado é pago com recursos de transferências da União. Apesar do esforço fiscal que foi feito, o governo ainda está estrangulado por uma folha de pessoal totalmente destoante de sua arrecadação e com despesas ainda altíssimas. Ou seja, pouco ou quase nada sobra para investimentos — melhorias de serviços, aquisição de tecnologia, veículos, maquinário, etc. Assim, a administração estadual tem duas saídas: recorrer a operações de crédito, cujo pedido de liberação repousa sobre a mesa do Tesouro Nacional, aguardando a avaliação do desempenho fiscal do governo tocantinense; e emendas parlamentares.
Nesse último caso, evitar destinar recursos para o Palácio para encaminhá-los somente aos municípios, como apregoam os descontentes com o governador Mauro Carlesse (DEM), é ignorar essa dependência que a população tem dos serviços do Estado — segurança, educação, saúde e infraestrutura. Sim, porque essas emendas não beneficiam o governador, mas o povo tocantinense.
E aqui não se está fazendo uma defesa da forma como o governo se relaciona com a bancada. Nada disso. Foram várias as vezes que esta coluna afirmou que a gestão Mauro Carlesse sofre de excesso de testosterona, pelo acúmulo de macho alfa por metro quadrado, que me parecem mais herdeiros dos neandertais do que dos sapiens. É preciso baixar esse nível de testosterona e se aproveitar do cérebro maior que herdamos da genética sapiens. Na política, as coisas não devem se resolver no grito, na “porrada” e na força. Para isso, existe a guerra, e dela queremos distância. A política é arte do diálogo, da diplomacia, do bom, franco, claro e transparente relacionamento humano.
Se de um lado o governo fez bem em não atender o apelo de congressistas e deputados estaduais para nomear cabos eleitorais “a perder de vista” no Estado — razão de grande parte dessa contrariedade com o Palácio Araguaia —, de outro precisa valorizar as ações da bancada federal. Digo não só no discurso, mas na prática. Exemplo claro disso trazido pela Coluna do CT durante a semana foi essa inauguração de rodovias no sudeste durante a semana, quando os congressistas estão em Brasília e não podem participar.
Quem conhece minimamente a agitação de Brasília, sabe do esforço de deputados e senadores para conseguir recursos para o Estado — articulação entre os colegas de Casa, chá e mais chá de espera em salas de tecnocratas e ministros, burocracia sem fim, etc. Assim, nada mais justo do que, ao colocar as mãos nos recursos, o governo do Estado dê o crédito a quem trabalhou. Não por vias indiretas e de forma ampassã, mas ostensivamente. Nessa hora deve pecar pelo excesso, não pela omissão. Afinal, o grande e justo prêmio dos parlamentares é o reconhecimento de seu esforço.
Não sabemos o que nos espera com esse fantasma que ronda o mundo e pode derrubar pessoas e mercados. Mas uma coisa é certa: o momento é de muito juízo, responsabilidade e união.
CT, Palmas, 13 de março de 2020.