O reordenamento da rede estadual de ensino responsável por fechar 21 escolas não agradou entidades de defesa de direitos da criança e do adolescentes, de direitos humanos e da Igreja Católica. Em nota enviada à imprensa, seis organizações repudiaram a medida do Executivo que consideraram “autoritária”.
“Toda e qualquer decisão no campo da política educacional a ser adotada no Estado, deveria ser precedida pela apresentação pública da proposta e, transparentemente, seu detalhamento e justificativas; consultaria e, portanto, dialogaria com a comunidade envolvida, que é diretamente afetada pela decisão”, argumentam.
A nota ainda repudia a argumentação da Secretaria da Educação, Juventude e Esportes (Seduc) para a medida: redução do número de alunos e na capacidade ociosa das escolas. Para as entidades, caso o dado alegado seja verdadeiro, significa que o Estado não tem uma ação “clara e eficiente” de busca ativa e de combate à evasão escolar.
O grupo de entidades ainda reforçam que a medida grava ainda o problema da distância da moradia dos estudantes em relação às unidades de ensino, critica o fato da reforma sequer ter tocado em conceitos pedagógicos e disparou contra a falta de clareza do Estado quanto à estrutura das escolas que foram fechadas.
“Evidencia ainda mais o imediatismo e, portanto, a falta de planejamento, que é inadmissível aos gestores públicos, uma vez que se vislumbra a perspectiva de vultosas perdas de recursos públicos com o abandono dos prédios públicos desocupados e com os investimentos necessários à sua readaptação a outros usos públicos”
Assinam a nota a Associação Nacional dos Centros de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente (Anced), a Ação Social Arquidiocesana de Palmas (Asap), a Comunidade de Saúde, Desenvolvimento e Educação (Comsaúde), o Centro de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente (Cedeca Glória de Ivone), o Movimento Estadual de Direitos Humanos (MEDH) e os Caritas.
Entenda
Como parte das medidas da reforma administrativa promovida pelo governo do Tocantins, a Seduc realizou o reordenamento das matrículas nas escolas da rede estadual. A pasta argumentou que a decisão otimizará os serviços, recursos e espaços educacionais
A Seduc afirma que ter identificado após estudos diversas situações que inviabilizavam a continuidade do atendimento em 21 escolas, que passaram por reordenamento, garantindo o atendimento dos 4.858 alunos em outras unidades escolares, assim como a lotação dos 1.508 profissionais em atuação nestas escolas, com exceção dos casos de contratos suspensos pela administração estadual.
Leia abaixo a íntegra nota das organizações:
“NOTA DE REPÚDIO CONTRA FECHAMENTO DE ESCOLAS PÚBLICAS NO ESTADO DO TOCANTINS
Manifestamos veemente repúdio à forma autoritária pela qual o governo do estado do Tocantins, através da Secretaria Estadual de Educação, Juventude e Esportes, vem conduzindo o processo de reordenamento de matrículas e do sistema de ensino da sua rede, cujo desdobramento tem se dado com o fechamento de mais de 20 unidades escolares da rede pública estadual, cerceando o legítimo direito de participação e de manifestação de estudantes e da população que luta pela manutenção de suas escolas frente à unilateral e, por consequência, arbitrária decisão que desrespeita a Constituição Federal, a LDB (Lei 9394/96), o ECA (Lei 8069/99), o PNE ( Lei 13.005/14), o PEE (Lei 2.977/15).
No contexto de um Estado Democrático de Direito, o Gestor Público, não pode se eximir de atuar dentro e no limite da legislação que regula a administração pública, a qual apresenta como princípios básicos, previstos no art. 37 da Constituição Federal e noutras normativas: a legalidade de seus atos; a impessoalidade; a razoabilidade e proporcionalidade; a publicidade; a eficiência e o interesse público. Nesse sentido, toda e qualquer decisão no campo da política educacional a ser adotada no Estado, deveria ser precedida pela apresentação pública da proposta e, transparentemente, seu detalhamento e justificativas; consultaria e, portanto, dialogaria com a comunidade envolvida, que é diretamente afetada pela decisão – estudantes, pais e mães, responsáveis pelas crianças e adolescentes, professores e professoras, servidores e servidoras técnico administrativos, diretores e diretoras.
Refutamos a justificativa da Secretaria Estadual de Educação, Esportes e Juventude, pautada na redução do número de alunos e na capacidade ociosa das escolas. A redução do número de alunos, se verdadeira, assenta-se sobremaneira na ausência de uma ação clara e eficiente de busca ativa e de combate à evasão escolar, ao desmonte e sucateamento dos equipamentos públicos escolares ocorridos nos últimos anos, à ultrajante desvalorização dos profissionais da educação e ao fechamento de salas e turmas anualmente, considerados entraves graves para a realização de um trabalho de qualidade, bem como ao processo de municipalização controverso e sem planejamento que vem ocorrendo.
O fechamento das escolas agrava ainda o problema da distância da moradia dos estudantes em relação às novas escolas em que seriam atendidos, num contexto de transporte escolar precário e de insegurança pública, evidenciando o despreparo e o posicionamento de que a educação deve ser tratada como mercadoria e não como direito. Claramente, os argumentos apresentados para as pretendidas “reformas visando a garantia do equilíbrio fiscal e financeiro, estabilidade administrativa e eficiência dos serviços públicos do Estado do Tocantins”, desconsideram aquilo que deveria ser o objetivo finalístico da educação, qual seja o direito à aprendizagem, com qualidade, de todos os estudantes. As reformas em questão, se quer mencionam os aspectos pedagógicos, a serem alcançados a partir de tais reformas. Num planejamento sério e não acelerado, que envolvesse o aporte de mais recursos à educação pública, e a sua transparente e honesta aplicação poderia resolver os problemas diagnosticados no Plano Estadual de Educação, recentemente aprovado, com ampla participação social, e, totalmente negligenciado no contexto da proposta de reordenamento de matrícula e do sistema de ensino do Tocantins, com o fechamento de 21 escolas.
Outro aspecto que repudiamos, refere-se à explicação superficial e genérica sobre a destinação posterior dos prédios escolares desocupados a outros usos públicos, porque evidencia ainda mais o imediatismo e, portanto, a falta de planejamento, que é inadmissível aos gestores públicos, uma vez que se vislumbra a perspectiva de vultosas perdas de recursos públicos com o abandono dos prédios públicos desocupados e com os investimentos necessários à sua readaptação a outros usos públicos. Essa falta de planejamento e de cuidado com o dinheiro público se evidencia, por exemplo, no fechamento da Escola Estadual Girassol de Tempo Integral Augusto dos Anjos, cuja quadra encontrava-se em processo de reforma, tendo sido destinada para a mesma, segundo placa instalada ao lado da obra, o valor de mais de R$ 245 mil, sendo que parte do material que seria usado para a construção encontrava-se jogado na quadra.
Manifestamos, assim, nosso absoluto repúdio a forma de condução da política educacional pelo Estado do Tocantins, através de suas secretarias, frente a violação dos princípios e normas constitucionais, do Estatuto da Criança e do Adolescente, do Estatuto da Juventude e da legislação educacional, e em especial, o desrespeito à população em geral e às comunidades afetadas pela decisão de fechamento das escolas.
Vale dizer que a nossa Carta Magna e as demais legislações infraconstitucionais não admitem improvisos ou mudanças abruptas e repentinas na educação pública, que não pode se submeter exclusivamente a interesses, ideias ou estratégias de gestores que exercem temporariamente cargos públicos, notadamente quando assumidas sem qualquer debate público junto às instâncias participativas existentes, como grêmios estudantes, conselhos de apoio à escola, conselho de educação, fórum estadual de educação e casas legislativas, entre outras.
Isto posto, ao passo que repudiamos o fechamento das escolas estaduais no Tocantins, reafirmamos nosso compromisso e solidariedade com os estudantes, suas famílias e profissionais da educação que lutam pelo legítimo direito a uma escola pública de qualidade.
Assinaram a nota:
- Associação Nacional dos Centros de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente – Anced
- Ação Social Arquidiocesana de Palmas – Asap
- Caritas
- Centro de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente – Cedeca Glória de Ivone
- Comsaúde
- Movimento Estadual de Direitos Humanos – MEDH
Palmas – TO
11 de fevereiro de 2019″