Durante esta Semana Nacional de Combate ao Trabalho Escravo, a Secretaria de Estado da Cidadania e Justiça (Seciju) vem chamando a atenção para o entendimento básico do que é trabalho escravo contemporâneo, suas características e formas de denunciar, bem como, o esclarecimento da atuação dos órgãos e entidades que atuam com o tema, como a Comissão de Erradicação do Trabalho Escravo do Tocantins (Coetrae-TO).
Nesta terceira matéria especial da série de reportagens sobre a temática, vamos entender qual o caminho percorrido para chegar até a libertação de um trabalhador em condições degradantes de trabalho, servidão por dívida, jornadas exaustivas ou trabalhos forçados e como todo cidadão deve contribuir para a efetiva erradicação do trabalho escravo.
De 1995 a 2020, o Tocantins contabilizou 2.997 casos de pessoas vítimas de trabalho escravo contemporâneo. Neste início de 2021, com a libertação de 12 trabalhadores na Operação Resgate, o Estado atingiu a marca de 3.009 trabalhadores resgatados em situações análogas à de escravo. A Operação Resgate foi resultado de uma grande força-tarefa envolvendo diversos órgãos que combatem o trabalho escravo. O número referente a janeiro deste ano é maior do que a soma dos resgates feitos em 2019 e 2020.
No ano passado, apesar das restrições impostas pela pandemia da Covid-19, foram realizadas 266 fiscalizações no Distrito Federal e mais 20 estados, incluindo o Tocantins. De todas as fiscalizações, 100 delas culminaram no resgate de trabalhadores, sendo cinco deles libertados só no Tocantins, conforme dados da Inspeção do Trabalho. Confira no final do texto, em anexo, todos os dados atualizados de 2020 com perfil e atividade econômica dos trabalhadores, atividade urbana ou rural, além do valor em verbas salariais e rescisórias.
Dados e fiscalização
De 1995 (ano em que o Brasil reconheceu como crime o trabalho análogo ao escravo) a 2020, o Tocantins contabilizava 2.997 trabalhadores em condições análogas à de escravos encontrados pela Inspeção do Trabalho e libertados. Os anos com maior registro de trabalhadores em condições análogas à de escravos encontrados e libertados pela Inspeção do Trabalho, foram em 2004, com 529 casos; 2006, com 455; 2009, com 353; e 2012, com 323.
Cabe destacar que de 2014 a 2019, os números de libertações foram caindo consideravelmente: em 2014 foram 96; em 2015, 33; em 2016, 19; em 2017, 19; em 2018, 9; em 2019, 4; e em 2020, 5. Nos demais anos com registros disponíveis pelo Radar da Inspeção do Trabalho, os números ficavam entre 80 e 110 casos.
Para a procuradora do Trabalho Gisela Nabuco Majela, que é membro da Coetrae-TO e atua como coordenadora regional da Coordenadoria Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas do Tocantins, esta queda não reflete a diminuição de trabalhadores em condições análogas à de escravo. “Há uma demanda reprimida e uma invisibilidade muito grande sobre o tema. Por isso é uma preocupação muito grande da Coetrae-TO e do MPT para que haja denúncias e que cheguem aos órgãos competentes. Existe uma dificuldade no meio rural de fiscalizar, por conta da distância, locais isolados distantes, que está associada a ausência de sinal de celular ou o chamado analfabetismo digital que não tem acesso aos meios tecnológicos ou não sabe lidar”, destaca.
No entanto, Gisela comenta que desde os últimos meses de 2020, há uma mudança neste cenário. “Estamos percebendo que as denúncias voltaram a aumentar, trabalhadores com acesso à internet e celular conseguem ligar e fazer a própria denúncia. As pessoas estão entendendo que ali pode ter uma situação de trabalho escravo e também denunciam. O objetivo principal do MPT agora é não perder o ‘timing’, com mais autonomia dos órgãos regionais para viabilizar essas operações com a maior brevidade possível para flagrar o crime”, completa, lembrando que houve dificuldades no último ano em decorrência da Pandemia, mas explica que aconteceram operações em outubro e dezembro.
A procuradora também conta o caminho da denúncia até chegar à libertação de um trabalhador. “O Ministério Público do Trabalho recebe a denúncia feita no próprio órgão ou na Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos. A partir daí é gerada uma autuação de notícia de fato e, se houver elementos mínimos que justifiquem a ação, é aberta uma investigação que gera a operação de resgate para confirmar se há ou não condições análogas à de escravo, libertar os trabalhadores e punir os responsáveis pela exploração, sendo um trabalho conjunto com vários órgãos responsáveis como Auditoria Fiscal do Trabalho e Grupo Especial de Fiscalização Móvel ligado ao Ministério da Economia”, esclarece.
A procuradora conta que posteriormente ao resgate, o MPT pode atuar firmando o Termo de Ajuste de Conduta com o responsável pela exploração, no qual são previstas obrigações que vão desde o pagamento das verbas até se abster de submeter trabalhadores a essas condições e o dano moral coletivo pela lesão causada à sociedade. Outra via é o ajuizamento de Ação Civil Pública que o MPT dirige à Justiça do Trabalho, sendo que o empregador pode sofrer uma condenação.
Papel da população na erradicação do trabalho escravo
Outra forma de combater o trabalho escravo é estar atenta ao Cadastro de Empregadores que Exploram Trabalhadores, conhecida como “Lista Suja”, a qual serve para inviabilizar o acesso ao crédito em bancos para os empregadores e para que a sociedade civil tenha acesso e possa tomar uma postura de não consumir produtos dos empregadores que exploram o trabalhador. Na última lista divulgada pela Inspeção do Trabalho, atualizada pela última vez em 29 de dezembro de 2020, há 115 nomes, sendo três deles no Tocantins, todos responsáveis por fazendas em Sandolândia, Santa Rita do Tocantins e Bernardo Sayão.
A primeira e mais importante ação que qualquer pessoa pode fazer é denunciar. A denúncia pode ser feita pelo site do MPT, ou por meio dos canais de denúncias de violações de direitos humanos: Disque 100, Ligue 180, aplicativo Direitos Humanos Brasil e o site da Ouvidoria/ONDH. Além disso, a população também pode fazer denúncias de forma remota e anônima pelo Sistema Ipê, lançado em 2020 pela Subsecretaria de Inspeção do Trabalho, em parceria com a Organização Internacional do Trabalho (OIT). (Da assessoria de imprensa)