Após a Prefeitura de Palmas apontar que algumas entidades foram indicadas, mas não se fizeram presentes nas reuniões da Comissão de Revisão da Planta de Valores Genéricos de Palmas, o Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Tocantins (CAU-TO) e o Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB-TO) encaminharam ao CT uma carta aberta que mostra que, desde 2013, elas questionavam a legitimidade do documento elaborado e alertavam para possíveis distorções nos valores do tributo. A intenção das instituições é rebater a “falácia” do Paço de que elas não se envolveram na discussão do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU).
A raiz do problema do imposto, que em 2018 apresentou aumentos bem acima da inflação, estaria nessa Planta de Valores Genéricos de 2013, uma vez que, segundo as instituições, “não houve uma metodologia técnica clara para a elaboração do documento”.
A comissão que revisou os valores venais dos imóveis da Capital em 2013 teria utilizado um parecer de mercado fornecido pela Câmara de Valores Imobiliários de Palmas (CVI), contratado pela concessionária de água e esgoto Foz Saneatins, que hoje é a BRK Ambiental. A revisão feita em 2016, utilizou como base o documento de 2013, por isso, conforme informou ao CT o especialista em Direito Urbanístico e professor da Universidade Federal do Tocantins, João Bazzoli, algumas distorções permaneceram.
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Círculo vicioso
A carta do CAU-TO e IAB-TO foi divulgada um dia antes da sessão extraordinária de votação do Projeto de Lei nº 49, de 19 de dezembro de 2013, que instituiu a Planta de Valores Genéricos de Palmas para o ano de 2014, base de cálculo do IPTU. As instituições alertaram: “Se aprovada uma nova planta genérica sem legitimidade estaríamos alimentando um círculo vicioso, chancelado pelo interesse antagônico e menor, qual seja, o de engordar a arrecadação municipal”.
Contudo, a Câmara Municipal aprovou a matéria, o imposto aumentou e a arrecadação saltou de R$ 24.431.902,83 em 2013, para R$ 49.151.990,39, no ano seguinte. O incremento foi de 101%. Isso sem incluir as receitas de juros, multas e demais encargos. Na época houve muita polêmica e foram propostas duas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADINs) e uma ação popular.
Conforme Bazzoli, as ações discutem o processo licitatório, a contratação da Câmara de Valores Imobiliários para elaboração da Planta de Valores, o aproveitamento de levantamento de valores realizados pela Saneatins na época, o pagamento à Câmara de Valores Imobiliários pela Saneatins (lembrando que a própria prefeitura desabilitou a CVI por incapacidade técnica), a falta de apresentação da metodologia e de como foi realizado pelas responsáveis técnicas, além de questionarem outros temas. Para o professor, essas ações precisam ser “resgatadas”.
Problemas na Planta de 2013
Na carta aberta de 2013, o CAU e o IAB questionavam ainda o tempo para realização do trabalho de Revisão da Planta Genérica de Valores e Tabelas de Preços de Construção, que foi de apenas três meses, bem como, a ausência de um corpo técnico com qualificação adequada.
“Um trabalho de avaliação em massa, objetivando a avaliação de 120 mil imóveis cadastrados, jamais teria condições de ser realizado pela comissão constituída, em razão do tempo atribuído e, principalmente, pela ausência de um corpo técnico à altura”, destaca o texto, acrescentando que a comissão teria apenas homologado o parecer da Câmara de Valores Imobiliários.
Outro ponto que também já preocupava as entidades era o redutor. Para eles, a criação dos indicadores confirmavam que os cálculos dos valores venais dos imóveis estavam “distorcidos” e “elevados”.
“Não se encontram referenciais para defender os indicadores redutores criados para de certa maneira tentar amenizar os elevados reajustes. Pode-se afirmar inclusive que os indicadores são a confirmação de que os cálculos excederam, haja vista desnecessários se observada à razoabilidade na formação dos valores determinados na nova planta genérica”, escreveram.
Segundo as instituições, isso comprova a preocupação que elas tinham, desde aquela época, em relação ao tributo. O documento é finalizado com a solicitação de retorno da matéria para o próximo ano, em circunstância do entendimento de que a questão em pauta mereceria melhor conhecimento e um amplo debate popular. A recomendação, contudo, não foi acatada pelos parlamentares.
Revisão 2016
A elaboração da Planta Genérica de Valores (proposta em 2013) e a revisão (ocorrida em 2016), segundo as entidades, eram necessárias, mas elas deveriam ter sido feitas com um estudo amplo, para que então se chegasse aos valores justos.
“Os valores estavam defasados. Deveria ser feito um trabalho técnico, mas não foi. Seria necessário levantamento de dados primários (comportamento dos preços e oferta) e tratamento de dados secundários de imóveis (Cadastro Imobiliário Fiscal). Além destas coletas, seria necessário o tratamento de dados e a necessidade de sua organização, a tabulação destes dados (escolhida qualquer das metodologias indicadas pela ABNT) e finalmente ser procedida uma análise conclusiva”, aponta estudo do professor Bazzoli.
A prefeitura não fez o trabalho de avaliação necessária para atualizar a Planta de Valores, conforme explicou o docente. Por outro lado, quando algum contribuinte questiona o valor venal atribuído ao imóvel, ela afirma que é preciso apresentar um Laudo de Avaliação que contemple os conceitos, métodos e procedimentos da NBR 14653 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), que trata da avaliação de bens. Uma incoerência que Bazzoli também questiona.
Polêmica
Com todo esse debate em torno do IPTU, na semana passada, os ânimos se acirraram entre a Prefeitura de Palmas e entidades da sociedade civil da Capital. Após manifestações de contribuintes insatisfeitos com a alta do IPTU 2018, 12 entidades publicaram nota solicitando que os valores do imposto voltassem ao patamar de 2017.
O município respondeu afirmando que algumas entidades, apesar de terem sido indicadas para compor a comissão que revisou a Planta de Valores Genéricos, não participaram da reuniões técnicas. Indiretamente, o Paço tentou jogar a culpa do reajuste nas entidades.
Na nota, o município cita o Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Crea), o Conselho Regional de Arquitetura e Urbanismo, o Instituto de Arquitetos do Brasil; o Conselho de Desenvolvimento Urbano e Habitação de Palmas (CMDHU); a Unitins, a Câmara de Palmas e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Porém, as entidades reagiram duramente contra a prefeitura, dizendo que ela estava tentando “mudar o foco do debate, desviando sua culpa por aumentar impostos e a atribuindo para as classes que mais serão prejudicadas pelo aumento inconstitucional e estratosféricos”.
A nota falou em “acusação sem cabimento” sobre a ausência de algumas delas nas reuniões. “Diversas entidades indicadas jamais receberam o suposto convite da forma que a prefeitura alega ter realizado”, contestaram.
Conforme as 17 entidades que assinaram o documento, “outras instituições perceberam a manobra praticada pela prefeitura e se recusaram a participar”. Isto porque, explicam, “a comissão era composta por maioria de membros do município, sempre com as mesmas posições e em apoio da intenção da prefeitura, no intuito de que todos os seus interesses fossem aprovados”.
“Para completar, abriria a possibilidade de a prefeitura alegar que tiveram as mudanças aprovadas com a presença das instituições minoritárias agora atacadas pelo município”, argumentaram as instituições. As entidades convocaram ainda “todos os contribuintes palmenses para se insurgirem contra o indevido e super elevado aumento de IPTU que prejudica a economia de toda a Capital”.
Após o desgaste, a prefeitura anunciou uma força-tarefa com servidores técnicos para atender todos os contribuintes que estiverem com dúvidas em relação aos valores do tributo. Na nota, o Executivo voltou a ressaltar que entidades, críticas do polêmico aumento, participaram da elaboração da nova planta de valores, mas pela primeira vez, não negou que houve aumento do IPTU, o que foi recorrente nas manifestações anteriores do município.