O Senado coloca em pauta nesta terça-feira, 23, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que poderá religar as pré-campanhas municipais, que hoje se desenrolam em marcha lentíssima por todo o Brasil, e no Tocantins não é diferente. Como eu já afirmei no início da quarentena, os prazos políticos já estão prejudicados, mas os da Justiça Eleitoral seguem como se nada tivesse ocorrendo. Não dá para a banda tocar desse jeito por um motivo simples: não há eleições sem candidatos e não se constrói candidaturas sem muitas conversas, alianças e mobilização de pessoas, tudo o que a Covid-19 impede neste momento.
A fase mais prejudicada foi a da troca de partido, cuja janela que a permitia se fechou no dia 4 de abril. Cada um teve que ignorar muitas das variáveis que podem definir um projeto bem ou mal-sucedido e se agarrar como dava à melhor proposta partidária, diante das circunstâncias. Alguns partidos, ao decidirem assim a toque de caixa, sem muito tempo e até condições sanitárias para reuniões, saíram do período permitido ou inchados, ou com poucas conquistas. Claro que sempre há a incapacidade de articulação, mas também houve casos de falta de condições plenas para ela.
Desde o início estava evidente que não haveria a menor condição de realizar o primeiro turno das eleições em 4 de outubro. Afinal, já era muito possível, como agora se confirma, que em junho e julho o Brasil estivesse no pico da Covid-19, sem a menor possibilidade de realizar qualquer tipo de mobilização de público. Como fazer convenções? Como se reunir com a comunidade? Como fazer comícios, caminhadas, carreatas, distribuição de santinhos? Enfim, não há clima sanitário e até psicológico para um momento festivo no Brasil, como é um processo eleitoral, diante de mais de 50 mil brasileiros mortos pelo vírus e todo o País — com exceção do presidente da República — sob forte comoção com essa matança absurda.
A proposta de jogar o primeiro turno para 15 de novembro é a mais razoável. Mesmo com as feridas abertas pelas dores que nos aguarda nestes próximos meses, ainda que abatidos pelo que nos reserva toda a irresponsabilidade com que lidamos com esta pandemia, pelo menos, conforme os especialistas ouvidos pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), há grande possibilidade de a situação sanitária estar sob controle. Nunca será um dia festivo como as eleições costumam ser, por tudo que estamos vendo ao nosso redor e por muitos estarem em sofrimento em suas famílias, mas a expectativa é de que o pior tenha passado e possamos, então, começar a olhar para a frente.
Concordo com o presidente do TSE, ministro Luis Roberto Barroso, quando ele se coloca contra a prorrogação dos mandatos até 2022, como defendem alguns parlamentares e sonham prefeitos e vereadores. Primeiro porque tenho dúvidas de que haverá a economia que alardeiam seus escudeiros. Do ponto de vista da estrutura necessária à campanha, sim, mas no que diz respeito ao financiamento das candidaturas, pouco mudaria. Temo que se ache nessa coincidência de eleições até um motivo para se elevar o volume de recursos públicos dragados por esse ralo.
Agora não tenho a menor dúvida de que se perderia demais em termos democráticos, com o empobrecimento ainda mais considerável do debate eleitoral, da agenda da sociedade que precisa ser discutida profundamente. Com as eleições de presidente, governadores e prefeitos num mesmo momento, não há como as três se sobressaírem.
No formato atual, a eleição presidencial fica relegada a um plano de fundo no primeiro turno, engolido pela disputa de governadores. Apenas no segundo turno se destaca, principalmente nos Estados que já decidiram sua refrega regional.
Acrescentando a eleição de prefeito nesse processo, como ficará? É pouco provável que o debate dos três cargos tenha o mesmo peso no espaço público. É fundamental entender que o objetivo das eleições é fazer com que as demandas sociais sejam exaustivamente debatidas, que a atenção das pessoas estejam focadas nessa discussão para que avaliem quem tem as melhores propostas e perfil para a gestão. Esse debate hoje já é muito pobre e, com a concentração de três instâncias num só momento eleitoral, se tornaria ainda mais raso, com a ascensão de políticos mais desconectados dos desejos da sociedade. Ou seja, as decepções tendem a ser maior do que já são hoje.
Para não falar também das disputas de senador, deputado federal, deputado estadual e vereador.
Tem um adágio popular que diz que o barato pode sair caro. É o caso. Tenho outro: barato é ditadura, fecha Parlamento e Judiciário, e pronto, governa-se sem olhar para a sociedade, mas passando-se sobre ela. Democracia é cara mesmo, mas não inventaram uma melhor forma para o Poder se relacionar com a população.
CT, Palmas, 22 de junho de 2020.