Caro prefeito em exercício Carlos Velozo,
Como alguém que milita há mais de três décadas no jornalismo político, entendo perfeitamente que não existe vácuo de poder. Quando ele se abre, logo alguém ocupa, a quem são dadas as condições políticas ou jurídicas. Essas últimas foram seu caso. Imagino a pressão que deve estar sendo exercida para que desfrute plenamente deste seu momento. E você pode fazê-lo, mas precisa medir as consequências. Sobretudo, porque é um neófito nessa seara.
Assim, digo-lhe que sua maior e verdadeira oportunidade, prefeito em exercício, não é usufruir ao bel-prazer de toda a máquina poderosa que colocaram em suas mãos inexperientes, mas, sim, definir a extensão de sua carreira no campo político-partidário. Por isso, se permite uma mera opinião, cuidado para não ser usado de massa de manobra e de ventríloquo daqueles que já foram escorraçados da vida pública porque se conduziram mal, ou de oportunistas endinheirados que têm os olhos fixos no erário — dizem que há até quem comprou partido para esse fim.
Estão colocadas à sua frente, Carlos, duas situações legítimas que podem lhe dar grandeza pública, permitir que cresça e tenha vida longa e produtiva no Executivo e no Legislativo tocantinenses. A primeira é um afastamento definitivo do titular do cargo de prefeito, Eduardo Siqueira Campos. Se isso ocorrer, naturalmente, você assume, faz o seu mandato, com sua equipe, com as pessoas de sua confiança. O segundo cenário colocado é amanhã ou depois a Justiça devolver o comando de Palmas a quem a população realmente elegeu e queria, o prefeito Eduardo, e você, tendo sido fiel — mantido-se no seu devido lugar atual, de apenas um suplente que cumpre as funções do titular no caso de ausência –, será reconhecido pelo caráter, retidão e fidelidade. Ou seja, consolidará uma imagem de homem de confiança. E isso vai lhe assegurar uma sólida e longeva carreira.
Agora, se tentar se apossar do que não é seu, ou seja, de um mandato que ainda está por se definir a continuidade, tirando todos os homens e mulheres da confiança de Eduardo, você deixará de ser “prefeito em exercício” para se tornar “prefeito biônico”, porque estará se apossando indevidamente de algo a que, moralmente, não tem direito neste momento.
Por fim, deixo três histórias para a sua reflexão. Como pastor, sei do valor que dá para essas alegorias que nos trazem lições importantes. A primeira é de Inês de Castro, uma nobre galega que se tornou amante do príncipe Pedro, futuro rei de Portugal. O rei Afonso IV, preocupado com a influência da família de Inês e com a possibilidade de um herdeiro ilegítimo, ordenou a morte dela. Com a falecimento do pai, Pedro ascendeu ao trono e, em retaliação, mandou executar os assassinos de Inês. Alegando ter casado secretamente com a mulher, o novo rei impôs a coroação dela como rainha, e seu cadáver foi exposto. O rei, então, obrigou toda a corte a beijar a mão da rainha morta.
A outra alegoria são as manchetes reais do jornal francês Le Moniteur Universal desde a fuga de Napoleão de seu exílio na Ilha de Elba, em março de 1815. Seguem as manchetes:
9 de março — O Monstro escapou de seu banimento.
10 de março — O Ogro Corso desembarcou no Cabo Juan.
11 de março — O Tigre mostrou-se em Gap. As tropas avançam por todos os lados para deter o seu progresso. Ele findará sua miserável aventura tornando-se um andarilho entre as montanhas.
12 de março — O Monstro realmente avançou até Grenoble.
13 março — O Tirano está agora em Lyon. Medo e Terror tomam a todos pela sua aparição.
18 de março — O Usurpador aventurou a aproximar-se da capital dentro de 60 horas de marcha.
19 de março — Bonaparte está avançando em marcha forçada, mas é impossível que possa chegar a Paris.
20 de março — Napoleão vai estar dentro dos limites de Paris amanhã.
21 de março — O Imperador Napoleão está em Fontainebleau.
22 de março — Ontem à noite, Sua Majestade o Imperador fez sua entrada pública e chegou às Tulherias. Nada pode deter o General.
Por último, deixo a mais importante reflexão, de um texto que você conhece muito bem, e que está lá em Mateus 26:48-49: “O traidor havia combinado com eles um sinal: ‘Vocês saberão a quem devem prender quando eu o cumprimentar com um beijo’. Então Judas veio diretamente a Jesus. ‘Saudações, Rabi!’, exclamou ele, e o beijou”.
Beijar, não sei se beijou Eduardo, mas me disseram que orou com ele.
Saudações democráticas,
CT