Em uma transação de compra e venda, surgem dúvidas preocupantes: E se o vendedor assinar a escritura antes de receber o pagamento e o comprador não pagar? Ou, inversamente, se o comprador pagar, mas o vendedor se recusar a assinar. Seria necessário, então, recorrer ao poder judiciário para resolver tal impasse? Há alguns anos, talvez fosse o caso, mas atualmente, a situação mudou.
A questão é ainda mais complexa em nosso contexto atual, onde muitas pessoas vendem imóveis que estão garantindo algum empréstimo. Estes vendedores contam com o pagamento do comprador para quitar essas pendências financeiras, vendendo, muitas vezes, tudo o que possuem.
A resposta para essa insegurança foi introduzida com a promulgação da chamada “Nova Lei de Garantias”, ou “Novo Marco Legal das Garantias”. Essa legislação incorporou um conceito comum ao sistema jurídico anglo-saxônico – já bem estabelecido na Inglaterra e nos Estados Unidos como um meio de assegurar transparência e confiabilidade em incorporações e transações empresariais – adaptado ao ordenamento jurídico brasileiro. Seu objetivo é fornecer um maior grau de segurança jurídica às transações imobiliárias.
Tal conceito é o da “escrow account”ou conta de depósito, que visa garantir efetividade e segurança jurídica para ambas as partes envolvidas na transação.
Com o advento da Lei n. 14.711/2023, conhecida como o marco legal das garantias, foi adicionado o Art. 7A à Lei 8.935/1994. Este artigo permite ao Tabelião de Notas, encarregado da formalização da vontade das partes, receber dos indivíduos envolvidos na transação tanto o preço do negócio quanto valores conexos e, então, repassar o montante à parte merecedora assim que forem constatadas a ocorrência ou a frustração das condições negociais aplicáveis. Ou seja, o valor pode ser transferido à parte vendedora, em caso de cumprimento de suas obrigações, ou ser estornado ao pagador em caso de descumprimento, tudo intermediado por um terceiro imparcial e dotado de fé pública — o cartório.
Mas, e quando o imóvel estiver pendente de ônus reais? Ou, ainda, se estiver sob penhora ou averbação de execução? É possível, a pedido das partes, reservar um valor específico para a quitação de dívidas, inclusive se houver terceiros interessados no negócio, como um credor externo à negociação, eliminando o risco de o comprador precisar pagar primeiramente ao vendedor e, depois, confiar que este pagará os passivos que oneram o bem.
Essa dinâmica traz mais confiabilidade ao negócio e estimula o mercado imobiliário, especialmente diante do contexto atual de instabilidade. E se sobrevier contra o pagador, após o depósito, mas durante o implemento das condições negociais alguma execução?
Nesse caso, esses valores serão depositados em uma conta específica, criada por um convênio entre os cartórios e uma instituição financeira nacional, sendo considerados alheios ao patrimônio do depositante. Assim, não estarão sujeitos a qualquer penhora judicial, exceto se, desfeito o negócio, não restarem questões pendentes de perdas e danos a resolver.
Trata-se de uma questão relativamente simples, que há muito fazia falta no cenário jurídico brasileiro. Espera-se que o excesso de burocracia não impeça a implementação desse instituto, e que ele traga os benefícios esperados.
ANTÔNIO RIBEIRO COSTA NETO
É consultor jurídico, professor universitário e escritor; advogado com escritório especializado em Regularização Fundiária, Direito Agrário e de Direito de Propriedade; membro da Comissão Nacional de Direito Agrário e Agronegócio da OAB; membro Consultor da Comissão Estadual de Direito Agrário e Agronegócio da OAB/TO (2020-2021); membro da Comissão Nacional de Direito Ambiental da Associação Brasileira dos Advogados-ABA (2021-2022); membro da Comissão Nacional de Direito do Agronegócio da Associação Brasileira dos Advogados-ABA (2020-2021); especialista em Direito Imobiliário-UNIP/DF.
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