Como previsto, a senadora Kátia Abreu (PDT) votou contra o decreto do presidente Jair Bolsonaro que flexibiliza a posse e o porte de arma e Eduardo Gomes (MDB) favorável à medida. O senador Irajá Abreu (PSD) não votou.
Kátia disse que 61% da população brasileira é contra a flexibilização do porte de armas. Segundo ela, mais de 120 mil vidas foram poupadas no país desde a sanção do Estatuto do Desarmamento, há 16 anos. “É um escárnio com a população brasileira. Esse decreto não vai proteger nenhum de nós. Arme os policiais, treine os policiais, presidente”, afirmou a senadora.
O Senado rejeitou nessa terça-feira, 18, por 47 votos a 28, o decreto de maio. O Plenário aprovou o projeto de decreto legislativo (PDL 233/2019), de autoria do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), que torna sem efeito o regulamento. O Decreto 9.785, de 2019, autoriza a concessão de porte a 20 categorias profissionais e aumenta de 50 para 5 mil o número de munições disponíveis anualmente a cada proprietário de arma de fogo. O PDL segue agora para votação na Câmara dos Deputados.
O texto chegou ao Plenário em regime de urgência, depois de passar pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) no dia 12. O colegiado rejeitou o parecer original do senador Marcos do Val (Cidadania-ES), que era contrário ao PDL 233/2019 e favorável ao decreto de Jair Bolsonaro. Com a rejeição, a CCJ adotou como parecer um voto em separado do senador Veneziano Vital do Rêgo (PSB-PB). Para o parlamentar, o presidente da República “extrapolou o poder regulamentar”.
Outros seis projetos de decreto legislativo estavam apensados a PDL 233/2019 e foram arquivados, todos contrários ao decreto que regulamentava o Estatuto do Desarmamento (Lei 10.826, de 2003). As proposições foram apresentadas pelos senadores Eliziane Gama (Cidadania-MA), Fabiano Contarato (Rede-ES), Humberto Costa (PT-PE), Jaques Wagner (PT-BA), Jean Paul Prates (PT-RN), Paulo Paim (PT-RS), Paulo Rocha (PT-PA), Rogério Carvalho (PT-SE) e Zenaide Maia (Pros-RN).
Debate
Mais de 20 senadores revezaram-se na tribuna do Plenário do Senado, metade defendendo a validade do decreto de Bolsonaro e outro tanto defendendo a derrubada do decreto das armas. A maioria dos senadores favoráveis à sustação do decreto argumentou que tais mudanças devem ser enviadas pelo Executivo ao Congresso por meio de projeto de lei, para que as alterações sejam debatidas democraticamente.
Já os senadores favoráveis à manutenção do decreto do Executivo defenderam que o presidente não extrapolou nenhuma de suas atribuições nem invadiu competências do Poder Legislativo, já que o próprio Estatuto do Desarmamento previu que vários de seus dispositivos necessitariam de regulamentação posterior.
Marcos do Val argumentou que o decreto de Bolsonaro é constitucional. Ele disse que o documento não muda os rigorosos pré-requisitos já existentes para quem quer ter uma arma, como ter mais de 25 anos, ter emprego e residência fixa, passar por aulas de tiro e exame psicológico, não ter antecedentes criminais e comprovar a efetiva necessidade da arma. Para o senador, é uma “falácia” o argumento de que o decreto “liberou geral” a posse e porte de armas.
“O Estatuto do Desarmamento foi um fracasso. O cidadão de bem tem o direito de se proteger. Armas ilegais sempre estarão nas mãos dos criminosos, nenhuma lei consegue desarmar os criminosos. Chega de ver só criminosos matando cidadão honesto. O cidadão tem o direito de proteger a própria família. Arma para nós representa a vida, não a morte. Arma é proteção da vida”, disse Marcos do Val.
Vários senadores favoráveis à derrubada do decreto presidencial relataram que sofreram ameaças e agressões nas últimas semanas— principalmente por meio de redes sociais ou aplicativos de mensagens — por serem contra o decreto. Os relatos fizeram o presidente do Senado, senador Davi Alcolumbre, se solidarizar com os demais 80 senadores e dizer que o Senado mostrou sua grandeza ao votar o PDL sem ser pressionado por essas ameaças. Uma das que relatou ameaças recebidas foi a senadora Eliziane Gama. “Não podemos liberar o porte de armas do jeito que o governo quer”, disse.
Para Eliziane, a população precisa de emprego, não de armas. Ela disse ainda que o Estado não pode se omitir de sua responsabilidade de garantir a segurança da população brasileira.
O senador Otto Alencar (PSD-BA) votou pela derrubada do decreto, o qual considera inconstitucional, e disse que a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) defende a sustação da medida.
Já o senador Telmário Mota (Pros-AP) afirmou que o Estado não é onipresente e que o cidadão tem o direito à legítima defesa. Para ele, enquanto as famílias estão desarmadas, “os bandidos estão bem armados”, pois compram armamentos ilegalmente.
“As pessoas precisam de meios próprios para defender sua família e sua propriedade. A arma gera segurança, gera proteção da vida. O Brasil precisa se proteger”, opinou Telmário.
O senador Jaques Wagner (PT-RJ) defendeu a anulação do decreto presidencial pelo Congresso. Para ele, não é verdade que armar a população comum vai diminuir a violência ou aumentar a segurança. “Vende-se uma ilusão à população. Estimula-se e faz-se a pregação do ódio, não é disso que o Brasil precisa. As armas vão cair nas mãos de bandidos e milicianos, que vão matar pobre e gente do bem”, avaliou Jaques Wagner.
Por sua vez, o senador Flávio Bolsonaro (PSL-SP) afirmou que inconstitucional era o PDL, não o decreto do presidente da República. Segundo ele, o Estatuto do Desarmamento delega a regulamentação de diversos pontos. Para o senador, o decreto dá mais segurança jurídica para que produtores rurais defendam suas propriedades.
Em seguida, o senador Rogério Carvalho afirmou que a Organização Mundial da Saúde (OMS) aponta que a restrição a armas de fogo diminui a mortalidade, a violência doméstica e os homicídios por motivos banais.
Para o líder do governo no Congresso, senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), o decreto do presidente é constitucional, tem critérios objetivos, dá maior segurança jurídica ao país e “garante a possibilidade da legítima defesa”.
A senadora Daniella Ribeiro (PP-PB) argumentou que o governo federal deveria melhorar as condições de trabalho das polícias do país. Para ela, cuidar da segurança pública é dever do Estado, não do cidadão comum.
Randolfe Rodrigues defendeu que o decreto é inconstitucional e que essa inconstitucionalidade foi apontada inclusive pela Consultoria do Senado.
“É a institucionalização do bangue-bangue no país. Vai ser um ‘liberou geral’. Não tem precedente na ordem jurídica mundial”, afirmou.
Já o líder do governo no Senado, senador Major Olimpio (PSL-SP), afirmou que a primeira medida de ditadores ao longo da história é sempre desarmar a população. Ele disse que há dez milhões de armas ilegais no país e cinco milhões legais.
Mais opiniões
Embora favorável à flexibilização da posse e do porte de armas no Brasil, o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) votou favoravelmente à derrubada do decreto, por entendê-lo inconstitucional.
“As Consultorias da Câmara e do Senado apontaram inconstitucionalidades na matéria”, acrescentou.
O senador Lasier Martins (Podemos-RS) afirmou que os pré-requisitos para se ter posse de arma continuam os mesmos e que o decreto apenas regulamenta partes do Estatuto do Desarmamento, dando mais objetividade às regras. A regulamentação é extremamente rigorosa para o porte de armas, disse.
Os senadores Eduardo Braga (MDB-AM), Rose de Freitas (Podemos-ES), Humberto Costa, Fabiano Contarato, Esperidião Amin (PP-SC), Eduardo Girão (Podemos-CE) e Veneziano Vital do Rêgo também defenderam a aprovação do PDL que susta o decreto de Bolsonaro.
Os senadores Luiz do Carmo (MDB-GO), Marcos Rogério (DEM-RO), Roberto Rocha (PSDB-MA), Márcio Bittar (MDB-AC) e Luis Carlos Heinze (PP-RS) argumentaram pela manutenção do decreto presidencial. (Com informações do site do Senado)