A antiga narrativa de Pandora, diferentemente de uma fábula, é um mito – uma história de caráter simbólico e universal, transmitida ao longo do tempo para explicar a origem de fenômenos, valores ou aspectos da condição humana. Tais narrativas não se prendem à verdade literal, mas revelam verdades profundas sobre a existência. O mito de Pandora, especificamente, originário da mitologia grega, conta a história da primeira mulher criada pelos deuses. Dotada de curiosidade inata, Pandora recebeu de Zeus um presente: uma caixa, com a expressa advertência de jamais abri-la.
No entanto, a curiosidade de Pandora (igual a de todo ser humanos) foi mais forte que a obediência. Ao abrir a caixa, um número alto de males, doenças, pragas, sofrimento, guerras e vícios – escapou e se espalhou pelo mundo, afligindo a humanidade. O ato de Pandora trouxe consigo um cenário de infelicidade, onde as aflições se tornaram parte intrínseca da experiência humana, justificando a presença do mal e da dor.
Tomada pelo desespero ao ver o que havia feito, Pandora fechou a caixa rapidamente. No fundo, solitária e última a permanecer, restava apenas a Esperança. Assim, mesmo em meio a todo o caos e desgraça liberados, a esperança permaneceu contida, como um bálsamo essencial para os males que assolam a existência, um lembrete de que a capacidade de vislumbrar um futuro melhor persiste.
Essa narrativa mitológica oferece uma poderosa metáfora para o complexo universo da Administração Pública. Muitas vezes, a gestão dos assuntos coletivos pode se assemelhar à abertura da caixa de Pandora. Desafios como as melhorias para os cidadãos, diminuição da burocracia excessiva, a falta de recursos, a desigualdade e demora dos processos podem emergir, espalhando desconfiança, frustração e desesperança entre os cidadãos.
Quando os males da má gestão se manifestam, a percepção pública pode ser de um cenário desolador, onde a promessa de um serviço público eficaz e justo parece distante. A confiança diminui, e o engajamento cívico pode ser substituído pela apatia ou pelo cinismo, uma realidade que, infelizmente, se faz presente em diversos cantos.
A esperança na Administração Pública se manifesta na fé de que servidores públicos dedicados podem fazer a diferença, que políticas públicas bem-sucedidas podem ser implementadas, que a justiça prevalecerá e que a coletividade será priorizada. É a crença de que a caixa dos problemas pode ser fechada e que as soluções, por mais difíceis que sejam, podem ser encontradas e aplicadas.
Portanto, assim como a esperança ficou no fundo da caixa de Pandora para consolar a humanidade, na Administração Pública ela é o elo que sustenta a relação entre o Estado e o cidadão. É o que motiva a persistência na busca por melhorias, o engajamento na fiscalização e a crença de que o bem comum é, sim, alcançável. Uma Administração Pública que compreende e valoriza o papel da esperança em sua atuação é aquela que se move proativamente. Ela não se limita a gerenciar problemas, mas se dedica a construir ativamente futuros melhores.
Isso implica em total transparência, abrindo as caixas da gestão para o escrutínio público, e na promoção da eficiência e inovação, eliminando a burocracia desnecessária
Em resumo, a capacidade de construir futuros melhores em Palmas, no Tocantins, e em todo o país, depende intrinsecamente dessa simbiose entre uma Administração Pública dedicada e a esperança renovada de seus cidadãos. Quando essa esperança é alimentada por ações concretas e resultados tangíveis, ela se torna o alicerce para o desenvolvimento sustentável, a inclusão social e a prosperidade para todos. É a esperança que nos impele a acreditar que, mesmo após a abertura da caixa dos males, um futuro mais promissor é sempre possível e, acima de tudo, factível.
JÚLIO EDSTRON SECUNDINO SANTOS
É Controlador-Geral do Município de Palmas. Advogado, graduado em Direito pela Universidade Presidente Antônio Carlos (2008), Mestre em Direito pela Universidade Católica de Brasília (2014). Doutor em Direito pelo UniCEUB, Ex-Secretário de Fazenda do Estado do Tocantins, Ex-membro da comissão de ensino jurídico da OAB/MG. Ex-assessor Especial no Tribunal de Contas do Estado do Tocantins. Professor do Curso de Direito da Fbr. Pesquisador Convidado do Centro Universitário de Brasília Membro dos grupos de pesquisa Núcleo de Estudos e Pesquisas Avançadas do Terceiro Setor (NEPATS) da UCB/DF, Políticas Públicas e Juspositivismo, Jusmoralismo e Justiça Política do UniCEUB. Editor Executivo da REPATS. E-mail: edstron@yahoo.com.br.