O Primeiro semestre de 2019 foi marcado pela evolução jurisprudencial do Tribunal Superior Eleitoral em um assunto sensível e recorrente, qual seja: (i)licitude da gravação ambiental como meio de prova para configuração de ilícitos eleitorais.
A frequência desse tema nos pleitos eleitorais, deve-se, na maiorias dos casos, pela conduta de adversários, no sentido de provocar situações que configuram ilícitos eleitorais, em desfavor de seus opositores, sendo a mais comum o ato de escalonamento do eleitor, isso com a finalidade de induzir candidatos na captação ilícita de sufrágio, tendo como sustentação probatória a gravação ambiental por um dos interlocutores com o desconhecimento do outro.
[bs-quote quote=”O debate travado na justiça eleitoral, em torno da análise da licitude da gravação ambiental, sempre foi tema controvertido, inclusive com reconhecimento de sua repercussão geral pelo Supremo Tribunal Federal” style=”default” align=”right” author_name=”LEANDRO MANZANO SORROCHE” author_job=”É advogado” author_avatar=”https://clebertoledo.com.br/wp-content/uploads/2019/08/leandro-manzano-60.jpg”][/bs-quote]
Assim, o debate travado na justiça eleitoral, em torno da análise da licitude da gravação ambiental, sempre foi tema controvertido, inclusive com reconhecimento de sua repercussão geral pelo Supremo Tribunal Federal no bojo dos autos do RE nº 1.40.515.
A controvérsia sobre a matéria pode ser demonstrada pela alternância da jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral ao longo dos anos, uma vez que, para as eleições de 2010 e anteriores, seguia-se o entendimento da licitude da gravação ambiental por um dos interlocutores.
Esse entendimento inicial alinhava-se com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, em que já havia analisada a licitude de gravação ambiental, mas, em matéria estritamente penal, reafirmada no RE nº 583.937, julgado no dia 19/11/2009, em sede de repercussão geral.
Após as eleições de 2010, o TSE iniciou novo debate sobre o tema, já que nos feitos eleitorais sempre foi patente o risco de manipulação das gravações ambientais, porquanto na grande maioria eram produzidas de forma ardilosa, através de induzimento à prática do ilícito eleitoral, um verdadeiro flagrante premeditado.
Sendo assim, a partir do julgamento do RO nº 1904-61, em 28/06/2012, relator Arnaldo Versiani, alterou-se completamente o entendimento, até então sedimentado, fixando novel linha jurisprudencial, em que se reconheceu a licitude da interceptação ou gravação ambiental, entretanto, condicionada à prévia autorização judicial.
Não obstante isso, a partir do julgamento do Resp nº 637-61, em 16/04/2015, de relatoria do Ministro Henrique Neves, flexibilizou-se o entendimento, de modo que o Tribunal Superior Eleitoral passou a admitir a utilização de gravação ambiental sem a necessidade de autorização judicial, porém, somente nas hipóteses em que a gravação ocorresse em ambientes públicos e desprovidos de controle de acesso, dado que nessa situação não incidiria ofensa à intimidade ou privacidade.
Todavia, esse derradeiro entendimento seguiu aos pleitos anteriores a 2016, pois em recentíssima diretriz jurisprudencial, a mais alta Corte Eleitoral, a partir do julgamento do Resp nº 408-98, relator Ministro Edson Fachin, com julgamento em 09/05/2019, ratificado pelo Resp nº 298-73, julgado em 06/08/2019, tendo como relator o Ministro Jorge Mussi, doravante, passou a considerar, para os feitos referentes às eleições de 2016 e seguintes, a licitude da gravação ambiental realizada por um dos interlocutores sem o consentimento dos demais, desnecessária de autorização judicial, em ambiente público ou privado.
No entanto, ficou consignado no acórdão que a referida validade necessita ser analisada a cada caso concreto, porque ao julgador caberá distinguir as situações em que a gravação foi captada de forma ardilosa, através de induzimento à prática de condutas ilícitas, daquelas em que a gravação é realizada para captar condutas ilegais praticadas de forma espontânea.
Destarte, o recentíssimo entendimento do Tribunal Superior Eleitoral não significa que seja conferido um “cheque em branco” àqueles que possuem nítido escopo sagaz no escalonamento de eleitor, a fim de induzir e constranger candidatos na prática ilícitos eleitorais, visto que nessa hipótese a gravação ambiental será considerada imprestável para sustentar uma eventual condenação, já que entendimento contrário haveria um evidente estímulo estatal para a prática de conduta ilícita e o fomento à judicialização do processo eleitoral.
LEANDRO MANZANO SORROCHE
É advogado, pós-graduado em Direito Eleitoral, Público e Tributário e pós-graduando em Estado de Direito e combate à corrupção
leandromanzano@gmail.com